Ao longo dos anos 80 e 90 ocorreu uma forte expansão da indústria de produtos de madeira sólida no Brasil, alavancada basicamente pela maturação dos reflorestamentos de Pinus implantados durante a vigência dos incentivos fiscais, aliada ao processo de globalização que permitiu diversos produtores identificar oportunidades de negócio vislumbrando o mercado internacional.
A secagem de Pinus foi introduzida no Brasil no final da década de 80, a partir da substituição da Araucária pelo Pinus na indústria de produtos de madeira sólida na região sul. Nessa época não existiam mais de 50 estufas em operação orientadas ao processamento de madeira serrada de Pinus. Atualmente, estima-se que se encontram em operação mais de 1.500 estufas para secagem de Pinus.
A rápida expansão da indústria de produtos de madeira sólida de Pinus exigiu uma ampla adequação do processo de secagem através da incorporação de novas tecnologias, tanto em relação aos equipamentos (estufas) como aos aspectos operacionais.
A incorporação de tecnologia à secagem de Pinus ocorreu de forma bastante desordenada, seja pelo próprio desconhecimento por parte da indústria de produtos de madeira sólida como pelo limitado know-how que os fabricantes nacionais de estufas dispunham na época. Soma-se ainda a atuação pouco expressiva de entidades de capacitação e pesquisa.
A secagem é a etapa intermediária entre o processamento primário (serraria) e o secundário (beneficiamento) da madeira. Trata-se de um processo simples e fácil, mas que requer alguns cuidados especiais.
Entretanto, mesmo com a crescente incorporação de tecnologia, muitas indústrias têm enfrentado inúmeros problemas relacionados com a secagem. Tais problemas podem ser divididos em dois tipos básicos:
Quanto ao equipamento: são problemas decorrentes do inadequado dimensionamento dos equipamentos (estufa) ou causados pela limitada manutenção dada aos mesmos.
Quanto à operação: são problemas ocasionados pela inadequada operação durante o processo de secagem.
De uma forma geral, os problemas quanto ao equipamento ocorrem sistematicamente, ou seja, sempre em um mesmo local da estufa. Um exemplo prático é o maior teor de umidade da madeira verificado sistematicamente nos pacotes posicionados na porção superior da estufa, próximo ao subteto. Trata-se de um problema quase sempre atrelado à reduzida dimensão do plenum.
Por outro lado, os problemas operacionais são, na maioria das vezes, aleatórios, podendo ocorrer em qualquer posição (ou pilha) no interior da estufa. Um caso típico é a colocação errada dos pinos sensores de medição de umidade da madeira que provoca leituras errôneas e, quase sempre, são ocasionados pela falta de treinamento dos operadores.
Os problemas quanto ao equipamento são provenientes do seu inadequado dimensionamento, como também em decorrência de falta de manutenção.
Aqueles referentes ao inadequado dimensionamento do equipamento são de difícil correção. Quase sempre são decorrentes do processo de aquisição. Neste caso, o equipamento já apresenta problemas desde o momento de sua instalação.
Para evitar que eventuais desvios não ocorram durante o processo de aquisição de uma estufa, comprometendo futuramente sua performance, é importante que sejam consideradas 3 etapas:
Etapa 1: Projeto Básico e Especificações
Contempla diferentes atividades, entre elas: análise do material submetido à secagem, definição tecnológica, definição dos aspectos construtivos e dimensionamento da estufa, e determinação do arranjo físico.
Etapa 2: Licitação
Considerando a etapa precursora referenciada anteriormente, é recomendável a elaboração de um conjunto de documentos para apoiar o processo de licitação dos equipamentos. Tal documentação tem como objetivo evitar desvios durante a aquisição do equipamento e facilitar o processo de análise e equalização de propostas de diferentes fabricantes.
O processo de análise e equalização das propostas é um instrumento que permite garantir que o preço ofertado pelos fabricantes contempla os parâmetros e os aspectos técnicos definidos para o equipamento. Além dos aspectos técnicos e do preço ofertado, no processo de equalização não devem ser esquecidos outros aspectos como, por exemplo, condições de pagamento, prazo de garantia, facilidades de manutenção, know-how do fabricante, entre outros.
Na realidade, a licitação permite definir o fabricante com as melhores condições de fornecimento, tanto técnica como financeiramente.
Etapa 3: Negociação e Aquisição
Nesta etapa, os fabricantes selecionados como mais atrativos para o fornecimento são chamados para negociação. Trata-se de uma negociação não somente financeira objetivando a redução de preço, mas também técnica, a qual permitirá a revisão de detalhes técnicos relacionados com o equipamento.
Com base nas negociações é definido o fornecedor e o processo de aquisição está praticamente concluído, restando apenas a elaboração de um contrato que garanta o atendimento do escopo previamente acordado.
Os problemas quanto aos equipamentos também estão relacionados com a falta de manutenção. Na maioria das vezes, é aplicada manutenção corretiva às estufas, enquanto as manutenções preventiva e preditiva são desconsideradas. Inúmeros são os problemas comumente verificados quanto a manutenção das estufas, quais sejam:
Vazamento nas portas, paredes e dampers provocando excessivas perdas de calor, o que ocasiona um maior consumo de vapor e eleva o tempo de secagem;
Inexistência de chapas defletoras, proporcionando a passagem de ar fora da pilha de madeira;
Inoperância de dampers, dificultando o alcance da umidade relativa definida pela curva de secagem, o que pode provocar defeitos na madeira como aumento do tempo de secagem;
Entupimento do sistema de umidificação, comprometendo o atingimento da umidade relativa definida pela curva de secagem, podendo ocasionar defeitos na madeira e prolongar o tempo de secagem;
Vazamento nos trocadores de calor, causando aumento da umidade relativa interna, dificultando controle do processo e aumentando o tempo de secagem;
Inundação dos trocadores de calor em função de falta de manutenção em filtros e purgadores do sistema de purga, o que dificulta o atingimento da temperatura requerida e, consequentemente, elevando o tempo de secagem.
Os problemas operacionais estão quase sempre atrelados à falta de capacitação e treinamento do pessoal envolvido na operação do setor de secagem. Diversos são os problemas comumente encontrados relacionados com a operação, entre os quais evidenciam-se:
Inadequada formação das pilhas de madeira, particularmente em relação ao alinhamento dos sarrafos separadores e pontaletes, o que pode ser facilmente corrigido através da incorporação de gabaritos para confecção das pilhas. Isso provoca elevados níveis de empenamentos;
Irregularidade nas dimensões dos sarrafos separadores e pontaletes;
Processamento de diferentes espessuras em uma mesma carga;
Desuniformidade no teor de umidade inicial da madeira em uma mesma carga;
Avanço das pilhas sobre o plenum, o que é freqüentemente observado em estufas carregadas através de empilhadeira;
Falta de água na caixa de bulbo úmido e substituição não regular do pano do sensor do bulbo úmido;
Colocação errada dos sensores do medidor de umidade da madeira;
Fios dos sensores de medição de umidade da madeira deteriorados (quebrados), provocando leituras errôneas;
Programas de secagem inadequados, os quais desconsideram conhecimentos teórico-práticos elementares.
Redução dos defeitos
Tanto os problemas quanto ao equipamento como aqueles relacionados com a operação são responsáveis pelo surgimento de defeitos durante o processo de secagem.
A maioria das empresas não exercem nenhum tipo de controle sobre o nível de perdas decorrentes dos defeitos ocasionados durante o processo de secagem. Geralmente os defeitos são identificados somente no produto final, quando já se agregou valor a madeira serrada seca. Isso provoca sensíveis aumentos no custo de produção.
Para se evitar tais inconvenientes, é importante que seja monitorado constantemente o nível de defeitos decorrentes do processo de secagem, a fim de que se possam tomar ações corretivas, diminuindo, conseqüentemente, o custo de secagem como o custo de processamento. Em processos de secagem conduzidos adequadamente o nível de defeitos não supera entre 1 a 2% do volume total processado.
Os defeitos mais freqüentes que ocorrem na secagem de Pinus e os procedimentos necessários à minimização dos mesmos são apresentados a seguir.
RACHADURA
É o defeito de secagem mais comum na madeira de Pinus e ocorre quando são formados gradientes (diferenças) de umidade acentuados numa mesma tábua ou peça. As rachaduras são mais freqüentes em peças com maior espessura, uma vez que a tendência é secar mais na parte externa que na interna, ocasionando uma maior contração na superfície. Por esse motivo, a peça fica tensionada (esticada) na superfície. Caso o esforço de tensão na superfície supere a resistência à tração perpendicular do material, ocorre o rompimento, ocasionando rachaduras.
As rachaduras e as trincas superficiais são formadas no início do processo e acentuadas no transcorrer da secagem. No caso das rachaduras e trincas internas, a formação ocorre somente na fase final da secagem, em função da reversão das tensões (tensão no interior e compressão na superfície), fenômeno conhecido como tension set.
Para evitar rachaduras e trincas superficiais é recomendada a adoção de baixas temperaturas com altas umidades relativas no início do processo de secagem. O surgimento de rachaduras e trincas internas pode ser evitado considerando maiores umidades relativas no final do processo de secagem aliado ao acondicionamento.
EMPENAMENTO
Enquadram-se neste tipo de defeito todas aquelas distorções que ocorrem no comprimento da tábua. O empenamento pode ser causado por diferentes fatores: formação irregular das pilhas de madeira, tensões internas da madeira e grã irregular.
Na prática, o principal fator que causa o empenamento está quase sempre relacionado com a formação irregular das pilhas de madeira. Sarrafos separadores e pontaletes não alinhados e desuniformes e tábuas sem apoio na extremidade ocasionam grande incidência de empenamentos. Pilhas adequadamente preparadas reduzem sensivelmente o nível de empenamentos.
As tensões internas e grã irregular são problemas mais difíceis de serem contornados, pois trata-se de uma característica intrínseca a madeira de Pinus. O problema é causado pela alta inclinação microfibrilar da camada S2 da parede celular, característica da madeira juvenil de Pinus, o que condiciona quase sempre o surgimento de empenamentos nas peças que contêm medula. Nesse caso, existem duas alternativas que podem ser trabalhadas. Programas de secagem que considerem elevadas umidades relativas e altas temperaturas podem minimizar o problema. Caso não se consiga reduzir o nível de empenamento com a readequação do programa de secagem, recomenda-se a adoção de restrição de pilha. Tratam-se de blocos de concreto que são colocados sobre a pilha e mantidos durante o processo de secagem. Os blocos de concreto são mantidos até o resfriamento completo da carga.
O empenamento aumenta sensivelmente com a redução da umidade abaixo de 8%. Dessa forma, a sobre-secagem deve ser evitada.
MANCHA MARROM
A mancha marrom é bastante comum no Pinus e é resultado da oxidação do conteúdo celular. A oxidação é catalisada através da temperatura. Em temperaturas baixas, geralmente inferiores a 60oC, a mancha marrom é bem menos intensa, assumindo coloração amarelada. A medida em que se consideram temperaturas mais elevadas, a mancha marrom fica mais evidenciada. Temperaturas superiores a 75oC, principalmente no início do processo de secagem, provocam mancha marrom escura, limitando, na maioria das vezes, o uso da madeira para produtos de madeira de maior valor agregado.
A mancha marrom não é visível sem que a madeira seja aplainada, pois é formada na linha de vaporização, logo abaixo da superfície (2 a 3 mm), onde se concentra o conteúdo celular não vaporizável. Devido a mancha marrom ser evidenciada somente após o aplainamento da madeira, a sua remoção implica em perda acentuada de material, sendo necessária a retirada de 3 a 4 mm de cada lado da peça ou tábua.
Para evitar ou minimizar a presença da mancha marrom devem ser empregados programas de secagem considerando baixas temperaturas. Temperaturas elevadas podem ser utilizadas somente após a madeira atingir o PSF (Ponto de Saturação das Fibras), o qual ocorre ao redor de 30% de umidade da madeira.
RACHADURA EM ANEL (RING CHECK)
É bastante freqüente em coníferas, principalmente no Pinus. Tal defeito está relacionado com a diferença de contração entre o lenho tardio e o lenho inicial, o que pode provocar o cisalhamento entre os anéis de crescimento.
Sua ocorrência é agravada pela adoção de baixas umidades relativas durante o processo de secagem. Quando o problema ocorre, é recomendável que sejam empregadas umidades relativas mais elevadas durante o início do processo de secagem.
Ainda é importante mencionar que o esforço da madeira pelo ajuste inadequado das facas da plaina e a excessiva pressão dos rolos também podem causar a separação da grã.
Uma das soluções para contornar os problemas enfrentados pelas indústrias quanto à secagem de madeira serrada passa pela reestruturação do setor de secagem.
A STCP tem apoiado inúmeras indústrias de produtos de madeira sólida na condução do processo de reestruturação do setor de secagem. As experiências indicam que a reestruturação deve considerar primeiramente os aspectos relacionados com equipamento, a fim de que possíveis problemas operacionais não sejam atribuídos erroneamente ao equipamento . Somente a partir de então, é recomendada a readequação dos procedimentos operacionais, tomando como base treinamento e capacitação dos operadores envolvidos no setor de secagem.
processo de reestruturação do setor de secagem
Contornados tanto os problemas de equipamento como aqueles operacionais, reveste-se como de fundamental importância o estabelecimento de um programa de desenvolvimento, objetivando a redução do tempo de secagem e minimização dos níveis de defeitos.
A experiência indica que é possível obter ganhos de produtividade de 30% ou mais a partir da adoção de procedimentos orientados a reestruturação do setor de secagem, trazendo melhoras sensíveis na qualidade do produto final e diminuindo substancialmente os custos de produção.
Maio/2003 |