A madeira é utilizada na construção em diversas funções estruturais ou não, exposta a diferentes ambientes (temperatura e umidade relativa do ar) e situações de risco de degradação biológica. Todas essas condições se traduzem em exigências de resistência mecânica, de durabilidade, de estabilidade dimensional e de natureza estética muito distintas. Deste modo, a especificação e fornecimento de madeira por parte de agentes com pouca informação sobre o material acarreta uma elevada probabilidade de comportamento não satisfatório em serviço, seja por mera questão estética seja por degradação biológica ou mecânica.
A utilização da madeira pela indústria de construção enfrenta ainda uma forte competição por parte de outros materiais de construção (aço, plásticos, pedra, etc.). No caso concreto dos recursos florestais nacionais, a realidade do mercado único acarreta ainda a forte competição de recursos florestais provenientes dos diversos países europeus.
É o caso , por exemplo de Portugal, onde a conjuntura da Floresta Nacional implica que a madeira de Pinho bravo constitua o recurso florestal nacional com uma produção comercial significativa (cerca de 5,6 m³/ha/ano), sendo a única fonte sustentável de fornecimento da madeira à indústria.
No entanto, esta madeira é geralmente considerada uma madeira de fraca qualidade, devido em grande parte à: - sua utilização no passado em condições de aplicação e utilizações finais não sustentáveis (implicando falha em serviço); - incapacidade da indústria nacional em responder de forma adequada às solicitações, fornecendo de modo reiterado material desajustado face aos requisitos constantes no caderno de encargos.
A sua utilização é ainda limitada: - Pela forte competição interna (procura) por parte de indústrias de pasta e papel, de placas de derivados de madeira e outras (por exemplo: pallets). - Pela crescente importação de Resinosas proveniente de outros países europeus, nomeadamente de países Nórdicos. A percepção da fraca qualidade do Pinho bravo, face nomeadamente a outras madeiras de Resinosas européias, é claramente desmentida por estudos já efetuados.
Existem dois níveis de qualidade que os produtos de madeira deverão atender no mercado da construção. O primeiro nível respeita à conformidade dos produtos com a diretiva dos produtos da construção, dando assim origem à marcação CE, utilizada na Europa e nos paises membros, preenchendo a condição essencial para entrar no mercado da construção.
Um segundo nível, mais exigente, refere-se à satisfação dos utilizadores finais. Embora exista, há alguns anos, um aumento do interesse na aplicação de produtos de madeira na construção, por parte de arquitetos e projetistas, estes têm sentido dificuldades na sua especificação devido a desconhecimento acerca do comportamento do material e da normalização aplicável.
Estes problemas são sentidos igualmente pela indústria de construção em geral. As exigências de desempenho dos produtos de madeira devem ser vistos com base na normalização e regulamentação aplicável. Assim é essencial que essa informação seja divulgada entre os parceiros diretamente envolvidos.
A indústria de madeira deverá garantir que os produtos colocados no mercado obedeçam aos requisitos impostos pela normalização e regulamentação aplicável, solicitando apoio a entidades, e a indústria de construção deverá efetuar as especificações do produto pretendido obedecendo a critérios concretos definidos por essa mesma normalização.
Norma européia CE
A Norma CE tem como requisito as seguintes exigências: Resistência mecânica e estabilidade 2 - Segurança contra incêndios 3 - Higiene, saúde e ambiente 4 - Segurança na utilização 5 - Proteção contra o ruído 6 - Economia de energia e retenção de calor.
Deste modo um determinado produto terá de obedecer aos requisitos essenciais que sejam pertinentes para o efeito e demonstrar o seu cumprimento através do sistema de atestação de conformidade aplicável, dando lugar à marcação CE.
Neste momento a norma harmonizada já implementada no campo dos produtos de madeira diz respeito às placas de derivados de madeira (EN13986), estando a ser elaboradas as normas harmonizadas relativas a estruturas de madeira (madeira maciça, lamelados-colados e LVL) e a pavimentos de madeira.
A marcação CE pode ser assim encarada como um fator potenciador da implementação de produtos de madeira, dado implicar a colocação de produtos suportados em documentação normativa (impondo requisitos mínimos de qualidade consoante a sua utilização) e deste modo facilitando a especificação por parte de projetistas e arquitetos.
No caso da madeira serrada igualmente um conjunto de normas permitem que se passe de uma perspectiva de material (madeira serrada colocada à disposição da indústria de construção) para uma perspectiva de produto (madeira serrada classificada de forma a estabelecer um nível de qualidade quer estética quer de resistência).
A utilização sustentada de produtos de madeira na construção coloca desafios relacionados com atividades de formação, de desenvolvimento de produto, de certificação e de divulgação, que se estendem aos diversos agentes envolvidos. Estas atividades são essenciais de forma a eliminar situações freqüentes em que a conjunção de especificações incorretas ou ambíguas e o fornecimento de materiais e produtos de características inadequadas levam a um comporta-mento deficiente dos elementos de madeira em serviço e a sua freqüente troca por outros tipos de materiais não lenhosos.
Assim, considera-se essencial: Melhorar a comunicação entre a oferta (indústria de madeira) e a procura (arquitetos, projetistas e construtores), através da:
- divulgação do panorama normativo e regulamentar aplicáveis a produtos de madeira e da
- formação dos agentes envolvidos (arquitetos, projetistas e construtores em geral) acerca das propriedades do material e do seu comportamento em serviço.
- tornar possível selecionar de entre a industria da madeira aquelas empresas que encaram a industria de construção como um potencial cliente, colocando ao seu dispor produtos de madeira (pavimentos, janelas, elementos para fins estruturais, e outros.) que tenham como suporte a marcação CE (garantia de qualidade mínima).
– a limitação do número de empresas, fornecedoras de produtos de madeira, permitiria eliminar a concorrência desleal de empresas sem capacidade para desenvolver novos produtos ajustados a um nível de qualidade superior. Estas ações permitiriam limitar casos de falha em serviço da madeira devido:
- à generalizada falta de formação (mesmo ao nível de quadros superiores) relativamente à utilização de madeira na construção;
- a uma percepção histórica desajustada da realidade em que assenta grande parte das especificações elaboradas por projetistas e arquitetos.
- uma utilização ambígua de termos e conceitos, que torna difícil conciliar o que de fato é solicitado com o produto ou material entregue. Relativamente ao papel das instituições de pesquisa, torna-se necessário ultrapassar a desconfiança existente entre estas e a indústria, derivada em grande parte pelo seu distanciamento durante muitas décadas. No entanto saliente-se que a atuação dos núcleos de pesquisa, envolvidos em investigação aplicada, deverá estar voltada para projetos inovadores, apoiando as empresas no desenvolvimento e aperfeiçoamento de produtos já comercializados e promovendo investigação própria abordando o desenvolvimento de novos produtos e o desenvolvimento de metodologia de avaliação do comportamento a longo prazo desses produtos.
Autor: José Saporiti Machado - Investigador Auxiliar Laboratório Nacional de Engenharia Civil/ Lisboa, Portugal. |