O cenário mundial tem mostrado que o desenvolvimento tecnológico na área de tecnologia da madeira-processamento químico é fruto de uma parceria eficiente entre o setor privado e o setor público. Representados por empresas produtoras e universidades e centros de pesquisa respectivamente. O fruto desta parceria pode ser sumarizado no desenvolvimento de tecnologias inovadoras que contribuem para competitividade de empresas e países e formação de recursos humanos de elevada competência para acompanhar a velocidade das mudanças tecnológicas.
No Brasil os instrumentos efetivamente disponíveis para propiciar este parceria entre empresas e centros de pesquisa públicos, e que permitam a transferência de recursos entre os parceiros é escassa e ineficiente. Torna-se imperativo que a política brasileira de desenvolvimento tecnológico crie mecanismos simples e ágeis que permitam a real interação entre os segmentos envolvidos na geração de conhecimentos, tecnologia e recursos humanos
Em termos de pesquisa em tecnologia de produtos florestais, e tomando como base o atual ordenamento institucional da pesquisa florestal no Brasil, sugerem-se os seguintes aprimoramentos:
- Estabelecer um programa que pudesse coordenar as pesquisas sobre o assunto em todo o território nacional, oferecendo incentivos para os centros de pesquisa e universidades dispostos a participar;
- Esses incentivos poderiam estar relacionados com o aprimoramento de infra-estrutura e recursos humanos, mas teriam por base um efetivo relacionamento com as indústrias usuárias da pesquisa, as quais também deveriam contribuir com algum recurso financeiro, mesmo que simbólico. A ligação entre quem faz a pesquisa e quem a utiliza é de fundamental importância para manter o foco e a motivação das equipes.
- Programa poderia se estruturar em três níveis: i) compilação e processamento de conhecimento já disponível para torná-lo acessível aos usuários; ii) identificação de linhas de pesquisa com resultados de aplicação imediata pelo setor industrial, e iii) identificação de linhas de pesquisa de longo prazo (pesquisa estratégica) com resultados que levem o País a ocupar o lugar que merece no cenário internacional como fornecedor de produtos florestais de qualidade.
- Revisão dos aspectos institucionais da legislação florestal que desestimulam o manejo de florestas nativas e plantadas para a produção de madeira sólida de qualidade.
Capacitação e treinamento de extensionistas florestais, especializados em silvicultura, manejo, colheita e industrialização primária da madeira.
Tecnologia de produtos florestais
O segmento de Tecnologia da Madeira, pode facilmente ser dividido em dois grandes grupos - processamento químico e processamento mecânico. Na área de processamento químico estão incluídos fundamentalmente: celulose e papel, carvão, resinas, óleos essenciais.
Com relação ao processamento químico da madeira, até os anos 80 observou-se significativas contribuições na área de energia da biomassa florestal e produção de carvão. Estes desenvolvimentos estão relacionados à avaliação de madeiras (nativas e de florestas plantadas) quanto a sua potencialidade para produção de carvão/energia, desenvolvimento de processos de processos de produção de carvão em diferentes escalas, utilização de subprodutos do processo de carvoejamento entre outros.
Ainda no período até os anos 80, são observadas algumas contribuições de pesquisa e desenvolvimento voltadas para o setor de celulose e papel; estas contribuições estão fundamentalmente restritas à área de qualidade da madeira sendo desenvolvidos trabalhos visando a definição de parâmetros de qualidade da madeira que podem ser úteis para área de melhoramento genético florestal e processamento industrial da madeira. Neste período, a área de tecnologia da madeira voltada para o setor de celulose e papel está intimamente relacionada com a área de melhoramento genético florestal e silvicultura. Exemplificando, é neste período que a densidade básica da madeira surge como principal parâmetro de qualidade da madeira destinada à produção de celulose.
A partir da década de 80, observa-se uma redução gradativa das atividades de pesquisa e desenvolvimento na área de biomassa florestal e produção de carvão. Neste mesmo período, com relação ao setor de celulose e papel, observa-se uma consolidação a importância da área de qualidade da madeira, com a absorção de conhecimentos e tecnologias geradas pelo setor produtivo. Uma das possíveis explicações para este fato diz respeito à carência de informações tecnológicas sobre a madeira de eucalipto, principal matéria-prima utilizada pela indústria brasileira de celulose e papel.
No início da década de 90 são observados desenvolvimentos na área de processos de polpação e branqueamento, sendo trabalhos totalmente direcionados para a madeira de eucalipto, uma vez que os conhecimentos disponíveis relacionados à polpação e branqueamento destas matérias-primas são escassos na literatura mundial. São desenvolvidos trabalhos que buscam o aumento do rendimento de processos de polpação e a eliminação de compostos clorados de seqüências de branqueamento.
Nas áreas de resinagem e óleos essenciais as contribuições de pesquisa e desenvolvimento são escassas e concentradas na avaliação de espécies e materiais genéticos destinados a produção de óleos essenciais e resinas.
Com relação ao processamento químico da madeira, a avaliação da atual estrutura de investigação científica e tecnológica deve considerar as grandes áreas mencionadas: celulose e papel, carvão e energia da biomassa, óleos essenciais e resinagem, pois são contextos bastante distintos.
No setor de celulose e papel, observa-se que a estrutura de investigação científica e tecnológica está divida entre o setor privado e o setor público. Esta divisão, no entanto, deve ser avaliada de forma criteriosa. Pois, as atividades desenvolvidas pelas empresas do setor de celulose e papel estão voltadas, quase que exclusivamente, para a solução de problemas intrínsecos de cada empresa. Não podem ser classificados como investigação científica e tecnológica.
Na área de celulose e papel as atividades efetivas de investigação científica e tecnológica estão ligadas ao setor público, neste caso, representados pelas universidades. Deve-se destacar que no Brasil existem atualmente dois centros de pesquisa e ensino atuantes na área de celulose e papel, sendo o principal, localizado na Universidade Federal de Viçosa - MG e o outro na Universidade de São Paulo - SP.
Principais demandas públicas e privadas
Em termos de processamento químico da madeira e produtos florestais, as principais demandas públicas e privadas em termos de pesquisa podem ser divididas em sub-áreas.
Tecnologia de celulose e papel
- Novas ferramentas analíticas para avaliação de parâmetros de qualidade da madeira, de forma a permitir a avaliação de uma maior número de materiais em reduzido espaço de tempo;
- Desenvolvimento de sistemas de simulação de processos modificados de polpação e branqueamento - modelagem matemática;
- Processos de polpação e branqueamento para fibras longas oriundas de florestas plantadas no Brasil;
- Desenvolvimento/modificação de processos visando a superação da barreira do rendimento;
- Utilização da biotecnologia em processos de polpação e branqueamento de polpa celulósica, tais como o desenvolvimento e utilização de enzimas;
- Morfologia de fibras e sua relação com a silvicultura e características de polpa e papel;
- Genômica funcional aplicada à celulose e papel;
- Desenvolvimento de tecnologias de polpação e branqueamento para recursos fibrosos não-convencionais
- Fechamento de circuitos - redução/eliminação de emissões ambientais
Produção de carvão e energia da biomassa florestal
- Caracterização de materiais genéticos destinados à produção de carvão vegetal e biomassa florestal
- Caracterização química e tecnológica de espécies florestais nativas
- Desenvolvimento tecnologia e processos de termo-retificação de madeiras
Resinas e óleos essenciais
- Caracterização de materiais genéticos destinados à produção de carvão vegetal e biomassa florestal
Processamento mecânico
- As demandas públicas, sob o prisma do IBAMA, estão relacionadas fundamentalmente com a utilização das espécies nativas, principalmente aquelas encontradas nas Florestas Nacionais - FLONAS. Na realidade, grande parte das atividades do Laboratório de Produtos Florestais do IBAMA em Brasília têm se orientado ao atendimento dessas demandas. Em contraste, a demanda dos institutos estaduais de florestas tendem a se concentrar na utilização de madeira de plantações, sobretudo devido à ênfase conservacionista dada aos remanescentes de florestas nativas nos estados.
- As demandas do setor privado podem também ser consideradas em duas vertentes: aquelas relativas às empresas que se utilizam de matéria prima oriunda de matas nativas, principalmente nas regiões Norte e Centro-Oeste, e aquelas que processam madeira de plantações, localizadas das regiões Sul e Sudeste. Essas demandas e respectivas linhas de pesquisa são explicitamente citadas mais adiante.
Fontes de recursos públicos e privados para a pesquisa
Os recursos destinados à pesquisa em tecnologia de madeiras - processamento químico, no Brasil são oriundos quase que exclusivamente do setor público. Deve-se no entanto destacar o conceito de pesquisa como algo que busca um avanço consistente nos conhecimentos disponíveis. Os recursos do setor público são disponibilizados por agências de fomento à pesquisa tais como Cnpq, FINEP, MCT, FAPESP, FAPEMIG entre outras.
Com relação à iniciativa privada, observa-se que as atuações definidas como pesquisa, são na realidade atividades visando a solução de problemas pontuais e particulares de cada empresa - "trouble-shooting".
Os recursos públicos destinados ao financiamento de pesquisa em processamento mecânico da madeira no Brasil, certamente não têm sido muito significativos, e provêm sobretudo de entidades federais como CNPq, IBAMA, EMBRAPA, SUDAM, e de entidades estaduais como as agências de fomento de pesquisa do tipo FAPESP, as secretarias estaduais de indústria, ciência e tecnologia ou afins, e os órgãos estaduais específicos ligados a florestas ou produtos florestais.
Em anos recentes algumas universidades estaduais e federais têm também desenvolvido pesquisas sobre o processamento mecânico da madeira com recursos orçamentários ou obtidos de agências oficiais de financiamento.
Os recursos privados, com certeza também pouco significativos, provêm de empresas interessadas em aproveitar espécies não tradicionais, principalmente oriundos de plantações, para produção de madeira serrada ou painéis reconstituídos. Normalmente esses recursos são usados para financiar projetos de pesquisa e desenvolvimento executados em parceria com instituições de pesquisa do Brasil e do Exterior. A atuação do SENAI mantém dois centros voltados ao desenvolvimento de estudos de utilização da madeira: CETMAN (Pr) e CETEMO (RS).
Obstáculos para o desenvolvimento da pesquisa
O principal obstáculo que poderá afetar o pleno desenvolvimento da pesquisa na área de processamento química de madeira e produtos florestais é a falta de linhas de recursos financeiros disponíveis de forma contínua para pesquisa, viabilizando desta forma o surgimento de novos centros e a consolidação dos centros atuais.
Uma questão que se apresenta como fator decisivo no sucesso, não da pesquisa propriamente dita, mas da aplicação de seus resultados é a atual estrutura dos três setores industriais responsáveis pelo processamento mecânico da madeira: as serrarias, as fábricas de compensado e as fábricas de painéis reconstituídos.
Enquanto de um lado, as serrarias e os fabricantes de compensados são em sua grande maioria pequenas empresas, operando com escasso capital de giro e equipamentos antigos e de baixa produtividade, as fábricas de chapas duras, MDF/HDF e aglomerados são, via de regra, modernas ou em fase de modernização, bem capitalizadas e com amplo acesso à tecnologia de processo e de produto ofertada pelos fornecedores de seus equipamentos e insumos no Exterior.
Para as serrarias e fábricas de compensados os obstáculos se configuram mais como barreiras à transferência da tecnologia gerada pelas universidades e centros de pesquisa do que propriamente obstáculos ao desenvolvimento da pesquisa em processamento mecânico da madeira. Tais obstáculos se referem principalmente ao nível tecnológico dos recursos humanos e equipamentos dessas unidades industriais. Por outro lado no setor de painéis reconstituídos, que dispõe de maior acesso ao capital e à tecnologia, a dificuldade estaria na identificação de áreas onde a pesquisa pudesse beneficiar o setor como um todo e não apenas uma empresa (pesquisa pré-competitiva).
Linhas de pesquisa e necessidades
Entre as linhas de pesquisa na área de tecnologia de madeiras - processamento químico que prioritariamente atenderiam os desafios:
- Novas ferramentas analíticas para avaliação de parâmetros de qualidade da madeira, de forma a permitir a avaliação de uma maior número de materiais em reduzido espaço de tempo;
- Desenvolvimento de sistemas de simulação de processos modificados de polpação e branqueamento - modelagem matemática;
- Processos de polpação e branqueamento para fibras longas oriundas de florestas plantadas no Brasil;
- Genômica funcional aplicada à celulose e papel;
- Caracterização de materiais genéticos destinados à produção de carvão vegetal e biomassa florestal
- Desenvolvimento tecnologia e processos de termo-retificação de madeiras
Os centros de pesquisa em tecnologia da madeira-processamento químico dispõe de infraestrutura precária que não permitirá a plena realização de pesquisas nas linhas consideradas como prioritáras. A mudança neste contexto requer investimento em infra-estrutura física, ou seja aquisição de equipamentos e construção/ampliação de laboratórios e em recursos humanos.
Em termos de processamento mecânico da madeira, as linhas de pesquisa devem se orientar de forma diferenciada para as empresas que se utilizam de matéria prima oriunda de matas nativas, localizadas nas regiões Norte e Centro-Oeste, e para empresas baseadas em reflorestamento, situadas principalmente nas regiões Sul e Sudeste.
No caso de espécies nativas, as linhas de pesquisa deveriam abordar a utilização de espécies não tradicionais de forma a permitir uma melhor distribuição dos custos de exploração florestal decorrentes do manejo sustentado. Tais pesquisas deveriam cobrir todas as fases do processamento das novas espécies, desde sua colheita até seu processamento final: tratamentos preservativos, técnicas de desdobro e secagem, beneficiamento, colagem e acabamento.
Essas mesmas linhas de pesquisa são válidas para madeiras de reflorestamento que até há pouco tempo eram utilizadas apenas para a produção de fibras mas que atualmente estão sendo empregadas na construção civil e fabricação de móveis. A identificação e produção em larga escala de clones com características tecnológicas para a produção de madeira serrada têm dado impulso considerável nessas novas aplicações de madeira oriunda de plantações.
A questão da transferência da tecnologia mencionada no item anterior poderia ser resolvida por meio de uma aproximação mais estreita entre quem gera (universidades e centros de pesquisa)e quem usa (indústria) a tecnologia. Possivelmente, no caso das serrarias e fábricas de compensado, muitos problemas de processamento industrial podem ser resolvidos pela utilização do conhecimento já disponível nas universidades e centros de pesquisa.
Dessa forma, o caminho é encontrar o canal adequado para levar esse conhecimento à indústria. O sucesso na solução dos problemas inicialmente trazidos pela indústria fatalmente será um estímulo para a identificação de áreas prioritárias para novas pesquisas e desenvolvimentos.
Quanto às indústrias de painéis reconstituídos, o ideal seria utilizar o modelo de projetos cooperativos como já ocorre na área florestal, com um grupo de indústrias se associando a um centro de pesquisas ou universidade para discutir prioridades e identificar áreas de interesse comum para estudo.
Deve-se considerar que em qualquer processo industrial as características do produto final dependem da matéria prima consumida. Assim, é fácil se compreender que as indústrias brasileiras, embora trabalhando com equipamentos sofisticados necessitam de ajustes e adaptações em função da madeira utilizada.
Fonte: IPEF |