Em pesquisa realizada na cidade de São Paulo, em 1996, o autor verificou que a maior parte dos distribuidores de madeira e construtoras afirma que trabalha com medidas padronizadas.
Em ambos os casos, nenhum entrevistado citou a utilização de uma norma ou especificação de entidades de classe e de instituições normatizadoras. Quando solicitados a dizer qual é a padronização adotada, os distribuidores de madeira disseram adotar as dimensões comerciais e que também atendem pedidos especiais.
Diversos entrevistados apontaram vários nomes para peças de madeira serrada/beneficiada, de acordo com suas dimensões nominais (espessura x largura), conforme é apresentado a seguir:
Foram feitas também diversas citações de bitolas (largura x espessura) sem nenhum nome específico (cm): 1,0 x 2,0; 1,0 x 4,0; 1,0 x 5,0; 1,0 x 6,0; 1,0 x 8,0; 1,0 x 9,0; 1,0 x 12,0; 1,5 x 12,0; 2,0 x 2,0; 2,0 x 10,0; 2,0 x 12,0; 3,0 x 3,0; 5,0 x 12,0; 20,0 x 20,0; 20,0 x 30,0 e 30,0 x 30,0.
A análise dessas informações revela uma grande quantidade de dimensões disponíveis, uma confusão com relação aos nomes das peças (caibros com pontaletes, tábuas estreitas e sarrafos etc.) e o uso do sistema imperial de medidas (polegada), notadamente nas espessuras das peças. Também foi mencionado nas visitas realizadas, que as dimensões inadequadas das peças que acabam provocando desperdícios.
É interessante constar que embora existam textos da ABNT especificando dimensões e nomes das peças, esses são ignorados pelo setores de produção e comércio de madeira serrada beneficiada.
As normas disponíveis são:
NBR 7203 - Madeira serrada e beneficiada;
NBR 9480 - Classificação de madeira serrada de folhosas;
NBR 12498 - Madeira serrada de coníferas provenientes de reflorestamento, para usos geral: dimensões e lotes.
No âmbito da ABNT, no momento (julho de 2001), está sendo desenvolvida a norma para madeira serrada de eucalipto e está sendo revisada a NBR 7203.
Considerando as normas disponíveis e para evitar conflitos na inspeção de recebimento, recomenda-se especificar em projetos/pedidos de compra o seguinte:
nome da peça (viga, caibro, ripa etc.) e respectiva bitola (em mm). Ao especificar dimensões para peças aparelhadas, o usuário deve considerar que a prática comercial é a de se referir aos valores nominais da madeira serrada em bruto;
mencionar as tolerâncias positivas e negativas admitidas (variável em função do grau de processamento das peças); e
citar o teor de umidade de referência.
Teor de umidade
Várias propriedades da madeira são afetadas pelo teor de umidade presente nas peças. As propriedades mecânicas são superiores e a movimentação dimensional é menor em madeiras secas (teor de umidade em equilíbrio com a umidade relativa do ambiente em que a madeira será utilizada) quando comparada com a madeira verde (teor de umidade acima do ponto de saturação das fibras, ao redor de 30%).
A despeito disso, o comércio de madeira serrada para fins estruturais não leva em consideração essa característica e a as peças de madeira acabam secando no depósito do comprador ou, o que é mais freqüente, em uso. Tal prática, pode resultar em empenamentos e rachamentos das peças após a realização da inspeção de recebimento.
Devido aos custos envolvidos na secagem de peças de madeira de bitolas avantajadas (vigas e pranchas) e a prática comercial arraigada, prevê-se que no médio prazo esse tipo de material não estará disponível no mercado.
Já o mesmo não acontece com a madeira destinada aos usos em que a estabilidade dimensional é um requisito muito importante. Já não é difícil adquirir madeira para pisos, esquadrias e revestimentos, com teor de umidade adequado. No comércio, esse material é referido como madeira seca em estufa ou "madeira estufada".
A despeito disso, não se especifica o teor de umidade médio e os respectivos valores máximo e mínimo recomendados para o local de aplicação das peças o que pode resultar em mau desempenho das mesmas.
A título de exemplo, na tabela 3 são apresentados valores de teor de umidade recomendados para algumas cidades brasileiras.
Outro cuidado a ser tomado refere-se à verificação do teor de umidade das peças do lote na inspeção de recebimento. É freqüente a má utilização dos medidores elétricos, em geral, relacionada ao uso de aparelhos não calibrados, posicionamento dos eletrodos em partes não representativas da peça e erro de leitura em função da escala empregada (varia com a espécie de madeira).
No tocante ao teor de umidade, recomenda-se:
especificar o teor de umidade médio e os valores mínimo e máximo, considerando o local de uso da madeira;
verificar o teor de umidade das peças do lote, por amostragem, empregando medidores elétricos (ensaio não destrutivo) de acordo com as instruções do fabricante, ou pelo método de perda de massa em estufa (ensaio destrutivo). Este último, apesar de ser mais preciso, requer equipamentos de laboratório e é bem mais demorado.
Defeitos naturais e de processamento
A presença de defeitos naturais (nós e bolsas de resina, p. ex.) ou de processamento (empenamentos e rachas de secagem, p. ex.) afeta a qualidade e desempenho das peças de madeira serrada.
Para adequar a qualidade das peças às necessidades dos consumidores, existem normas de classificação que distribuem as peças produzidas em classes de qualidade. Essa distribuição pode ser realizada de acordo com três sistemas básicos de classificação, conforme segue:
Classificação por defeitos
Este sistema, que também é conhecido como classificação por aparência, é empregado largamente em madeiras de coníferas e em madeiras de folhosas (angiospermas dicotiledôneas) classificadas para mercados especiais.
A classificação por defeitos pressupõe que a peça de madeira será utilizada nas dimensões originais, portanto não sujeita a ser recortada em outras dimensões correspondentes àquelas requeridas pelo uso final. Nesse sistema é considerado o número, a importância e a distribuição dos defeitos que apareçam em ou ambas as faces da peça serrada.
No Brasil, esse sistema é empregado na norma de classificação para a madeira serrada de pinho (Manual prático de normas reguladoras de qualidade das madeiras de pinho no mercado nacional, da ABPM), na NBR 11700 "Madeira serrada de coníferas provenientes de reflorestamento para uso geral" e na norma que está sendo elaborada pela ABNT para classificação de madeira serrada de eucalipto.
Classificação por rendimentos de cortes limpos
O sistema de rendimento de cortes limpos é empregado largamente nas principais regras de classificação de madeira serrada de folhosas, como por exemplo, na Regra de Medição e Classificação de Madeira Serrada de Folhosas da National Hardwood Lumber Association - NHLA, que é originária dos EUA e é utilizada por diversos países importadores e exportadores de madeira de folhosas tropicais. No Brasil, embora esteja disponível a NBR 9487 "Classificação de madeira serrada de folhosas", a regra da NHLA ainda é empregada para classificar a madeira destinada a exportação.
O uso desse sistema para classificar tábuas e pranchas, pressupõe que as mesmas serão recortadas em peças menores. Basicamente consiste em obter porções retangulares livres de defeitos (cortes limpos) em uma face da peça (geralmente a pior face) e relacionar a área total dessas porções limpas com a área total da peça, obtendo, dessa forma, o rendimento.
As classes são estabelecidas de acordo com: dimensões da peça; dimensões dos cortes; número de cortes; e rendimento de cortes limpos.
Classificação por uso final proposto
Este sistema engloba dois sub-grupos de classificação de acordo com o uso final da madeira: Classificação para uso em estruturas, onde as propriedades mecânicas são decisivas e Classificações específicas, onde as peças são fornecidas em dimensões exatas para usos bem definidos.
A classificação para uso em estrutura pode ser feita pelo método visual ou pelo método mecânico. No primeiro caso, a classificação está baseada no fato que os defeitos afetam a resistência e a rigidez das peças de madeira. As regras de classificação especificam tolerâncias para os tipos de defeitos, seu tamanho, quantidade e posição, que devem ser comparados visualmente pelo classificador, peça por peça. Já na classificação mecânica, realizada automaticamente em máquinas informatizadas, o princípio de classificação baseia-se na estreita correlação entre o módulo de ruptura na flexão e o módulo de elasticidade.
Situação no Brasil
Apesar da série de vantagens de caráter industrial e comercial da padronização de medidas e de qualidade da madeira serrada, que beneficiam tanto os produtores quanto os consumidores, no Brasil as peças de madeira empregadas na construção civil são especificadas/comercializadas em dois extremos:
madeira não selecionada (bica corrida) que compreende todo o produto da tora exceto as peças inaproveitáveis. Esse sistema prejudica o produtor, pois peças sem defeito e que as vezes são utilizadas num uso que poderia aceitar alguns defeitos, são comercializadas sob um mesmo preço de uma peça com defeitos;
madeira de primeira qualidade em que as peças praticamente são isentas de defeitos. Neste caso, pedaços significativos de madeira são desprezados na serraria constituindo um sério problema de descarte e um evidente desperdício do recurso florestal. Por outro lado, o consumidor fica desprotegido pois não há uma definição do que seja madeira de primeira o que gera dúvidas no momento da inspeção de recebimento.
Evidentemente que a situação descrita acima tem exceções, por exemplo, há empresas produtoras de madeira serrada que ofertam seus produtos classificados em diversas classes de qualidade, como também há construtoras que especificam as madeiras em pelo menos duas classes de qualidade.
Mas por que as normas disponíveis para classificação e outras padronizações existentes são empregadas quase que exclusivamente para o material que se destina à exportação ?
A (s) resposta (s) para essa questão passa (m) pelo preconceito ao material (já tratado no início deste artigo), pelas sucessivas crises econômicas, políticas etc. Mas pode-se indicar algumas ações para minimizar os efeitos dessa situação:
envolver os produtores, comerciantes e consumidores finais (construção civil e indústria de móveis, principalmente), com apoio de instituições tecnológicas, na elaboração e revisão periódica de textos normativos;
divulgar intensamente as normas de classificação, as características da madeira e os cuidados técnicos necessários para sua boa utilização; e
criar cursos de classificadores de madeira.
Fevereiro/2003 |