O mercado de créditos de carbono pode ser um excelente negócio para as empresas brasileiras que promoverem ações ambientalmente sustentáveis. Se comprovarem que seus projetos ambientais seqüestram CO2 da atmosfera ou promovem tecnologias limpas, são candidatas a conquistar créditos equivalentes de carbono. Este bilionário negócio foi aberto pelo Protocolo de Kyoto, assinado em 1997 na cidade japonesa de Kyoto e patrocinado pela Organização das Nações Unidas com o objetivo de reduzir, nos próximos anos, as emissões dos gases de efeito estufa em 5,2% sobre os níveis registrados em 1990. As nações desenvolvidas têm o compromisso de redução, enquanto que as nações em desenvolvimento, como o Brasil, precisam realizar projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que incluem tecnologias mais eficientes, substituição de fontes de energia fósseis por renováveis, florestamento e reflorestamento, entre outras.
Para fomentar o debate sobre as possibilidades brasileiras, a Uniplac – Universidade do Planalto Catarinense, em parceria com o Governo do Estado, através da Fapesc (Fundação de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica de Santa Catarina), promoveu na primeira quinzena de março o 2. Seminário Catarinense de Créditos de Carbono, no município de Lages. A idéia foi reunir universidades, associações de classe e outras entidades que tivessem relação direta com o meio ambiente, segundo informou o diretor de Pesquisa Agropecuária da Fundação, Zenório Piana. Durante dois dias, apresentaram-se as bases do Protocolo de Kyoto para aqueles que ainda não estavam inteirados do tema, as perspectivas abertas pelos projetos de suinocultura, biodiesel, as experiências em reflorestamento, eficiência energética e o passo a passo para a obtenção da certificação junto aos órgãos competentes.
A Petrobras, a estatal brasileira de petróleo, já começa a investir na imagem de empresa de energia, para assumir sua parte no compromisso de produzir tecnologias sustentáveis. Segundo Ricardo Mascarenhas, coordenador de Energias Renováveis da estatal, estão em fase de implantação usinas eólicas, painéis solares e a produção de biogás proveniente de aterros sanitários em diversas regiões brasileiras. Também encontram-se em estágio avançado os estudos para a construção de quatro pequenas centrais hidrelétricas. O álcool, que andou esquecido das autoridades e dos gestores governamentais, voltará a ganhar força, com novos volumes de produção principalmente a partir do interior de São Paulo e foco no mercado interno e na exportação. Os novos projetos deverão exigir recursos de 330 milhões de dólares.
Uma das estrelas dessa nova fase da Petrobras é o biodiesel. Para cumprir a nova legislação, a empresa será obrigada a injetar, a partir de 2008, um percentual de 2% do novo combustível sobre a gasolina levada aos postos e, a partir de 2013, a mistura de 5% será obrigatória. Essa nova realidade será permeada por um compromisso: as indústrias deverão comprar a produção de pequenos agricultores, incentivando assim o cultivo de oleoginosas compatíveis com a produção do óleo. “O setor agrícola precisará fazer um esforço significativo”, apontou Mascarenhas. Estão aí boas oportunidades aos produtos de mamona, pinhão manso, algodão, dendê, babaçu ou soja, dependendo da compatibilidade com o clima de cada região. Vários protocolos de intenções têm sido assinados entre a Petrobras, governos estaduais e bancos financiadores para desenvolver a produção agrícola voltada para o setor.
A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) também está investindo pesado nas pesquisas de oleoginosas mais adaptáveis à geração de biodiesel. Em sua palestra no evento, o pesquisador e ex-diretor da instituição, Décio Luiz Gazzoni, afirmou que o Brasil é o único país do mundo com grande capacidade de expansão de sua produção neste setor. A estimativa é de que existam ainda 90 milhões de hectares disponíveis, concentrados principalmente na região central do País. Diante da escassez iminente de combustíveis fósseis, o biodiesel é a grande alternativa do futuro.
Os países desenvolvidos já estão de olho nesta nova demanda. Enquanto os americanos estão se programando para aumentar em 10 vezes a produção de soja nos próximos anos, os países europeus preparam-se para reduzir os impostos e com isso incentivar o uso do novo combustível.
A vez da biomassa
A experiência da usina de co-geração sediada em Lages é um dos destaques. O analista de Desenvolvimento de Negócios da multinacional Tractebel, Gabriel Mann dos Santos, apresentou a experiência da planta catarinense, que utiliza com ineditismo resídios de madeira (biomassa) para a produção de energia elétrica e vapor. A multinacional inscreveu a unidade serrana como projeto visando os créditos de carbono junto a Kyoto. A expectativa é de obtenção de 220 mil toneladas de C02 equivalentes por ano. Embora esteja há quase dois anos nos trâmites para validação do projeto junto ao Protocolo, a empresa está otimista quanto ao sucesso da certificação. “Projetos avançados podem remunerar os proponentes em até 10 euros por tonelada de carbono”, entusiasma-se o executivo.
E quem ainda tinha dúvidas sobre o passo a passo para a certificação, teve a oportunidade de obter todos os esclarecimentos ao assistir a palestra de Samuel Barbosa, diretor executivo da DNV, maior validadora de projetos no País. Os últimos números oficiais apontam para a vice-liderança brasileira no ranking mundial, com a existência de 170 projetos em andamento, ultrapassado apenas pela Índia. A grande curiosidade da platéia foi satisfeita ao final da explanação: quanto custaria um projeto para buscar a certificação? De R$ 35 mil a R$ 300 mil, dependendo do porte da solicitação, anunciou Barbosa.
Dada a complexidade do tema e a necessidade de investimentos maciços para que o Brasil alcance os níveis de certificação projetados, os organizadores lançaram moções, a serem encaminhadas às autoridades competentes, ou seja: que as próximas Conferências das Partes das Nações Unidas (COPs) ouçam os especialistas brasileiros na área de MDL e considerem os interesses nacionais; que o governo brasileiro melhore a infra-estrutura para o recebimento e tramitação dos projetos de MDL e destine mais recursos para a pesquisa e o desenvolvimento das metodologias. À Petrobras, é solicitada a disponibilização de recursos financeiros às universidades e instituições de pesquisa, que por sua vez, deveriam desenvolver trabalhos na área de biodiesel e estimular a formação de recursos humanos no setor.
Reflorestamentos em alta
Uma boa notícia aos reflorestadores: as espécies florestais plantadas em forma de monocultura são candidatas potenciais aos créditos de carbono. A única restrição diz respeito ao tamanho das áreas comercialmente viáveis para a entrada de projetos: em torno de 10 mil hectares. Isso é pouco quando se pensa nas vastas extensões territoriais e nos grandes plantios existentes no centro do País. No Sul, porém, onde as áreas são menores, se exigiria a formação de parcerias entre diversos produtores para encaminhar um projeto. A avaliação é de Marcos Iroshi Nishi, engenheiro florestal e doutor pela Universidade de Viçosa na área de Economia Ambiental. Ele palestrou no evento sobre Seqüestro de Carbono e Monoculturas e seus comentários serviram de incentivo para os empresários do ramo que foram até Lages para conferir as possibilidades deste mercado.
Conforme explicou Nishi, é mais fácil montar uma metodologia sobre plantios uniformes do que tentar certificar florestas nativas, que em princípio não estariam acrescentando resgate de carbono na atmosfera além daquele naturalmente existente. Aos mais afoitos, lembrou: o critério de adicionalidade é uma das bases do Protocolo de Kyoto, isto é, o projeto deve acrescentar inovação, além de obedecer a uma série de critérios sociais e ambientais. Trata-se de um bom negócio, porque os recursos vêm a fundo perdido. “Servirão, por exemplo, para auxiliar no replantio de florestas de monocultura.”, anunciou. Mas aí vem um alerta: “É bom que fique bem claro que estes recursos não vão mudar a vida de ninguém”. Para quem deseja ingressar neste mercado, recomenda negociações junto à Bolsa de Chicago (Chicago Climatize Exchange), que funciona em paralelo ao Tratado. Além disso, é mais ágil na concessão dos créditos e tem linhas especiais no que diz respeito à área florestal, embora os valores finais sigam uma cotação mais baixa em relação àqueles passíveis de obtenção no Protocolo de Kyoto.
Para saber mais
www.mct.gov.br – Portal do Ministério da Ciência e Tecnologia que contém os projetos encaminhados e em andamento.
www.bvrj.com.br – Site da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, que permite a divulgaçãode propostas ao mercado.
www.fapesc.rct-sc.br- Site da Fundação de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do Estado de Santa Catarina.
Pesquisa e redação: Marta Bertelli, jornalista. |