Os projetos de reflorestamento, independente da espécie florestal plantada, caracterizam-se pelo elevado risco, técnico e econômico, a que estão sujeitos. Na maioria das vezes, estes riscos estão associados ao horizonte de planejamento devido à natureza de longo prazo destes, onde no tempo tudo se torna possível de ocorrer, como incêndios, ataques de pragas, ocorrências de doenças, sinistros, ameaças de mercado, prejudicando a viabilidade do projeto e a atratividade pelo mesmo.
Outra característica negativa deste tipo de projeto era o baixo preço do produto florestal (madeira), em razão da existência de uma condição de mercado onde a competição se fazia de forma imperfeita, prejudicial no curto prazo aos produtores rurais e, no médio e longo prazo, às empresas e consumidores.
No entanto, começa a se observar mudanças significativas na conduta deste mercado, onde o aumento elevado na demanda por madeira, sem o correspondente aumento na oferta, tem provocado elevações nos preços dela. O diferencial deste tipo de projeto comparado com os demais, principalmente, o agrícola, é que o aumento nos preços não reflete imediatamente no aumento da oferta, pois no mínimo teria o prazo de maturação dele, em que do plantio à colheita leva-se pelo menos de seis a sete anos. Daí se acreditar que estes preços continuarão a subir ao longo deste período de tempo.
Com isso, este colapso na oferta, popularmente conhecido como “apagão florestal”, está colaborando com mudanças profundas e positivas no mercado, valorização da madeira e aumento na atratividade deste projeto, e que certamente no futuro próximo será benéfico para todos os agentes econômicos envolvidos como empresa, produtor e consumidor.
Apesar que para as empresas esta situação no curto prazo possa, aparentemente, ser desfavorável, certamente no longo prazo não o será, pois com o aumento da área reflorestada pelos produtores rurais o abastecimento voltará a ser normalizado, porém num patamar de preço maior, forçando as empresas a rearranjarem seus processos produtivos e gerenciais a fim de continuarem competitiva.
Para melhor discutir esta situação de mercado, segue uma reflexão onde se aborda todo um conteúdo histórico da formação da atividade florestal, passando pelos atuais acontecimentos e finalizando com as perspectivas que possam vir a ocorrer, que na verdade em algumas regiões do país, já estão ocorrendo.
Mercado
A economia do setor florestal brasileiro, até o ano de 1965, era pouco expressiva, tanto que as atividades de manejo das florestas plantadas e nativas eram insignificantes e realizadas, na sua grande maioria, em pequena escala e em condições de baixo emprego de tecnologia e gestão. A produção de carvão vegetal tinha como fonte de matéria-prima as florestas nativas. Nesta época, poucos empregos eram gerados e o país importava quase todo o produto florestal industrial. Além disso, não havia interesse por parte dos produtores rurais e empresários florestais, investirem em projetos de reflorestamento devido, entre outras coisas, a baixa rentabilidade, ao longo prazo de maturação e aos riscos elevados.
Com a política de incentivos fiscais ao reflorestamento, que vigorou de 1965 a 1988, ocorreu um crescimento significativo da área reflorestada no país. Os gêneros florestais que mais se destacaram foram Pinus e Eucalyptus, devido ao rápido crescimento, a boa qualidade da madeira, a adaptabilidade ao clima e ao solo das regiões sul e sudeste, etc.
Mesmo assim, os reflorestamentos implantados neste período apresentavam produtividades baixas e eram antieconômicos, decorrência da insuficiência de conhecimentos e pesquisas sobre a cultura, inadequação no planejamento do uso da terra, na escolha das espécies e nas técnicas de implantação, além de falhas na política, na legislação, na fiscalização, etc.
Esta política de subsídio à produção florestal surgiu como uma contrapartida legal para apoiar as empresas consumidoras de produtos e subprodutos florestais que, pela lei nº 4.771/65 (segundo código florestal), eram obrigadas ao auto-suprimento.
A madeira de reflorestamento como matéria-prima para as principais indústrias de base florestal apresentava baixo coeficiente preço sobre peso específico em razão de ser um produto pesado e de baixo valor comercial. Esta condição, muito peso para pouco preço, fazia com que o valor de uma carga de caminhão dessa madeira fosse relativamente baixo, próximo ao seu custo de transporte. Isto forçaria a localização dos reflorestamentos próximos da indústria consumidora para que viabilizasse o projeto.
Por outro lado, a instalação de uma unidade industrial mínima (exemplo da indústria de celulose) exige altos investimentos iniciais, isto requer um nível elevado de produção, para que sejam diluídos seus custos por unidade produzida, o que levaria a formação de grandes empreendimentos florestais, operando em economia de escala.
Desta forma, considerando que os projetos florestais se caracterizavam pelo longo prazo, baixa rentabilidade, pouca atratividade, baixo coeficiente preço sobre peso específico, exigência de elevado investimento inicial, produção em escala e obrigação legal ao auto-suprimento, forçou as empresas florestais a adquirirem grandes quantidades de terras (latifúndios) e formarem, inexoravelmente, extensas áreas com plantações florestais (monoculturas) destes dois gêneros.
Neste sentido, o latifúndio, a monocultura e os grandes maciços florestais localizados no entorno das empresas dificultavam a existência de outros produtores e consumidores de madeira próximos, eliminando as possibilidades de concorrência, de aumento nos preços da madeira e levando a constituição de monopólios naturais, mais precisamente de mercados monopsônicos da madeira.
Sendo assim, naturalmente, os preços da madeira de reflorestamento eram controlados e formados pelas grandes empresas florestais nas suas regiões de atuação, isto tornava a atividade menos valorizada, reduzindo a sua atratividade e eliminava o interesse dos produtores rurais em investir nos projetos de reflorestamento.
Para contornar estes desinteresses, muitas empresas constituíram os programas de fomento florestal visando apoiar os produtores a reflorestarem suas propriedades. Os principais contratos destes programas constituem basicamente, em doações e transporte de mudas e insumos, assistência técnica. Como todo contrato, os de fomento também envolvem obrigações que num certo momento podem ser desagradáveis para uma ou todas as partes, seja pelos preços negociados, o volume, as especificações dos produtos, a entrega da madeira, enfim, algo que venha ser prejudicial para a continuidade da atividade. Muitos contratos não têm logrado êxitos e nem tem sido cumpridos ou renovados. Atualmente existem programas mais arrojados, com financiamentos para os produtores investirem na atividade florestal, bônus para o produtor, garantias e seguros de florestas, etc. Estes programas têm ajudado a alavancar o setor.
Atualidades
Felizmente, as espécies florestais exóticas, como as do Pinus e Eucalyptus, se adaptaram tão bem no Brasil e graças à avançada tecnologia silvicultural brasileira, se promovem aqui produtividades, no mínimo, dez vezes maiores que as de muitos países de clima temperado, muitos deles competidores internacionais.
Este rápido crescimento das plantações florestais confere ao país uma vantagem competitiva invejável e assustadora a estes competidores, devido às condições favoráveis de clima, solo, extensão territorial, mão-de-obra, infra-estrutura e capacidade gerencial produtiva.
Inusitadamente, as condições de competências gerenciais só foram possíveis com o fim da política de incentivos fiscais, em dezembro de 1988. Com o término dos subsídios houve uma seleção de empresas florestais que culminou com a falência de outro número muito grande delas. No entanto, as que sobreviveram, se fortaleceram e se constituíram em grandes conglomerados de importância nacional e internacional.
Graças ao crescimento das empresas florestais brasileiras e das demandas internacionais por produtos da cadeia, o Brasil tem se tornado um dos maiores países do ranking de exportadores do mercado internacional de produtos florestais, conquistando posição e ganhando competitividade de países tradicionais no ramo de celulose, como a Finlândia e a Suécia, respectivamente.
Com a consolidação da abertura comercial mundial, a desvalorização do câmbio no Brasil, a retomada do crescimento econômico brasileiro e dos países desenvolvidos e o espetáculo do desenvolvimento da China e da Índia, o setor florestal brasileiro vem, ao longo dos últimos anos exportando cada vez mais, destacando-se como um dos setores de maior crescimento da indústria nacional, contribuindo para a geração de mais emprego, renda, impostos, PIB, etc.
Mudanças significativas vêm ocorrendo ao longo dos anos no mercado doméstico e internacional de produtos florestais. A expansão dos mercados existentes e o surgimento de novos mercados e novos produtos que se utilizam basicamente da madeira de reflorestamento foram se consolidando aqui e no exterior. Internamente, as indústrias de celulose cresceram vertiginosamente sua produção e as siderúrgicas estão trabalhando no limite da sua capacidade, as serrarias se multiplicaram, bem como as indústrias de compensados. Surgiram novos produtos, como o MDF (medium density fiberboard) e o OSB (oriented strand board). A madeira de eucalipto que era utilizada basicamente na produção de carvão e celulose, passa a ser empregada também na serraria, movelaria, construção civil, etc.
Para atender aos aumentos nas vendas, as empresas florestais estão operando a plena capacidade produtiva, e investindo em novas plantas industriais. No entanto, este aumento na produção industrial não vem sendo acompanhado, num mesmo ritmo, pelo aumento na área reflorestada no país. Desta forma, era óbvio que surgisse um problema, que no jargão florestal, tem sido chamado de “apagão florestal”, analogia dada à escassez de energia ocorrida no início desta década.
O fato é que, com o fim da política de incentivos fiscais ao reflorestamento, a taxa de aumento das áreas plantadas no Brasil, praticamente foi nula, enquanto o aumento na demanda por madeira continuou crescente, passando a consumir madeiras de antigos povoamentos florestais a longas distâncias, rotulados de inviáveis, e madeira de plantações jovens, estoques de crescimento. A questão é que, o colapso da oferta desta madeira hoje é uma realidade que se refletiu nos preços, conforme pode se observado na Figura 1, onde mostra o que está ocorrendo na região de Itapeva, SP, sendo que, o que acontece lá não é diferente do que ocorre em outras regiões do país.
Uma observação interessante que se faz, refere-se à situação de que as grandes empresas florestais não conseguem mais controlar totalmente os preços da madeira em seu mercado de atuação, pois com o aumento na sua produção industrial sem o acompanhamento dos plantios, tornaram-se mais dependente da matéria-prima ofertada no mercado.
O acirramento no consumo de madeira vem transformando uma antiga imperfeição de mercado numa condição de concorrência perfeita, onde os preços e as quantidades são estabelecidos no equilíbrio entre as forças de oferta e demanda por madeira de reflorestamento.
Apesar de algumas opiniões catastróficas sobre o “apagão florestal”, a verdade é que muitos benefícios estão ocorrendo e ocorrerão, pois com o aumento nos preços, a produção florestal não, necessariamente, precisaria se concentrar próximo aos centros consumidores de matéria-prima florestal, visto que passaria a compensar o transporte a longas distâncias.
Perspectiva
Como o setor florestal brasileiro, principalmente o representado pelas indústrias de celulose e siderurgia, está cada vez mais competitivo no mercado internacional e como a taxa de câmbio, por questões macroeconômicas favoráveis tende a continuar desvalorizada, é provável que as exportações brasileiras continuem crescendo. Existe também a possibilidade do país conquistar novos mercados internacionais. Além disso, com a elevação da renda familiar no Brasil, devido ao crescimento econômico brasileiro a partir de 2004, a expectativa é de que o consumo doméstico continue aumentando, corroborando com a elevação da demanda por madeira de eucalipto.
Ao exercitar uma conjectura, é possível prever que o mercado e o preço da madeira de eucalipto tenderão a crescer. Assim, duas considerações devem ser apresentadas:
- existem grandes chances do mercado brasileiro de madeira reger-se sob a ótica da competição perfeita, com isso parcela significativa do abastecimento das empresas florestais virá dos produtores rurais independentes, tendo como vantagens: desconcentração de renda e da posse da terra;
- dado o período de maturação dos projetos florestais, do plantio à colheita, espera-se que o aumento nos preços persista por, no mínimo, cinco anos. Mas, mesmo quando a oferta se equiparar com a demanda, certamente os preços se equilibrarão num patamar superior ao histórico, haja vista a entrada de um grande número de atores econômicos (consumidores e produtores de madeira de eucalipto), neste mercado.
No futuro, a expectativa de uma participação maior dos produtores rurais no abastecimento de madeira industrial aliviará bastante as empresas que, por questões circunstanciais aqui discorridas, tiveram que formar grandes maciços florestais, mas que a partir de um certo momento poderão concentrar seus esforços apenas no processo industrial, ficando a cargo dos agricultores, quem de direito, o fornecimento da madeira via mercado.
Há uma série de fatores econômicos, técnicos e mercadológicos favoráveis à expansão da atividade florestal no Brasil;
• O setor tem enfrentado problema relacionado à oferta e demanda de madeira;
• O mercado de madeira está se tornando mais competitivo em razão das questões aqui descritas, favorecendo a inserção do pequeno e médio produtor;
• Falta uma política florestal mais dinâmica que se adeque às novas tendências e mudanças verificadas neste mercado;
• Tudo isso favorece o setor florestal brasileiro. Se não se agarrar esta oportunidade, outras nações poderão ocupar este espaço, no qual o Brasil tem tudo para dominar.
Sebastião Renato Valverde, Naisy Silva Soares, Márcio Lopes da Silva, Laércio Antônio Gonçalves Jacovine, Sigrid de Aquino Neiva |