MENU
Amazônia
Construção
Desdobro
Editorial
Exportação
Habitação
Mercados
Móveis
Pesquisa
Portos e Logística
Produção
Qualidade
Usinagem
E mais...
Anunciantes
 
 
 

REVISTA DA MADEIRA - EDIÇÃO N°61 - NOVEMBRO DE 2001

Habitação

A Madeira como Alternativa na Construção de Habitações

O Brasil possui uma forte tradição construtiva em alvenaria de tijolos. Este sistema construtivo foi trazido pelos portugueses na época da colonização, utilizando a mão de obra escrava para carregar pedras, fabricar tijolos e telhas. O uso da madeira na construção de habitações se deu fundamentalmente na região sul e sudeste , onde a matéria prima a Araucária (“Pinheiro do Paraná”) era abundante. A maioria dessas casas eram construídas com tábuas na vertical e mata juntas para eliminar as frestas entre elas . O desconhecimento do método construtivo faz surgir um preconceito com relação ás construções em madeira. Este preconceito está fundamentado no uso inadequado da madeira com problemas de secagem, tratamento, projeto, especificações e outros, aliado ao meio ambiente tropical que acelera a sua deterioração. Este preconceito tem origem histórica. Segundo o Prof. e historiador Key Imaguire na cidade Curitiba por exemplo “...em 1905 o governo proíbe a construção de casas de madeira nas principais ruas. O código de posturas de obras em 1933 mantém a proibição de construir em madeira na zona central e estabelece restrições nas demais zonas da cidade. Apesar da preocupação com incêndios em áreas densamente ocupadas nota-se também um caráter discriminatório nessas posturas . A madeira de pinho era barata e acessível a todos.”

Existem vários processos construtivos e subsistemas de construções utilizando o material madeira. Apesar de podermos classificar alguns destes sistemas como artesanal, identificamos muitas vantagens em relação ás construções em alvenaria.



Descrição dos principais sistema construtivos em madeira

Sistema construtivo tipo viga–pilar e paredes com encaixe macho e fêmea

Como o próprio nome já define a estrutura é independente da vedação ou seja, as paredes tem a função de vedar e os pilares e vigas tem função estrutural. Os pilares de madeiras podem ser fixados na fundação por meio de parafusos metálicos e escorados.

Na fase subseqüente as pranchas de parede são encaixadas nos montantes (pilares) que possuem rasgos. A simples colocação das paredes tem a função de travar a edificação.

A proposta deste sistema é poder utilizar madeira com elevados teores de umidade, por este motivo há um rasgo na face inferior das vigas onde devem ser encaixadas as pranchas de paredes para evitar a abertura de frestas em função da variação do volume da madeira seca e úmida. A estrutura do telhado é convencional, podendo ser construído com terças, caibros ou dependendo do vão tesouras e treliças espaciais.



Sistema construtivo tipo plataforma e ballon frame

Este é considerado um sistema leve de construção. Ao contrario do sistema viga pilar as paredes e a plataforma de piso tem a função não só de vedação mas também estrutural . Aproximadamente 70% das construções residenciais nos EUA e Canadá usam este método. Consiste numa trama estrutural com pé direitos duplos, espaçados de 40cm a 60 cm (no caso de edificações de dois pavimentos ) a estrutura do piso é apoiada sobre vigas mestras .

Outros sistemas construtivos

Madeira Roliça

Sistema construtivo mais utilizado pelos imigrantes poloneses no inicio do século XX., utiliza madeira roliça com encaixes entre as toras

Tábuas com mata juntas

Este sistema é utilizado para casas populares. Geralmente o tipo de madeira aplicada em paredes, assoalhos, forro, portas, rodapés, caibros é o Pinus Ellioti . Para estrutura utiliza-se geralmente vigotes de 2”x 3”, as paredes são de tábua de 1”x 12” com altura variável colocadas lado a lado e vedadas com mata junta (sarrafos de ½” x 2” ). Deve-se observar que nesse sistema pode ocorrer o uso inadequado de espécies de madeira não tratada que possuem baixa resistência ao agentes biodegradantes.



Vantagens e desvantagens do sistema construtivo em madeira em relação ao sistema tradicional de alvenaria de tijolos

São inúmeras as vantagens dos sistemas construtivos em madeira em relação ao de alvenaria. Podemos estabelecer alguns parâmetros de comparação:

a)Fundação

O sistema de fundação está sempre em função do tipo de solo e do peso da construção. O peso de uma edificação em madeira é muito menor que o de alvenaria , por tanto há um menor consumo de material de fundação.

b) Paredes- isolamento térmico

As trocas de energia entre o interior e exterior de uma edificação tem como determinante o envelope construtivo. A madeira é considerada um fechamento opaco. A transmissão de calor acontece quando há diferença de calor entre a temperatura interna e externa . A radiação incidente tem uma parcela absorvida e outra refletida, que depende da refletividade e da absortividade do material. Com a elevação da temperatura externa, haverá um diferencial entre a temperatura da superfície interna e externa , que traduzirá numa troca de calor entre as duas. Nesta fase a troca de calor se dá por condução e a intensidade do fluxo do calor vai depender do material, e da sua condutividade térmica(?). Quanto maior for o valor de ?, maior será a quantidade de calor transferido entre as superfícies. A madeira é considerada um material com baixa condutividade térmica devido a sua constituição. A transmissão de calor é dada pelo coeficiente da condutividade interna , a qual se define como a quantidade de calor que atravessa por hora , em estado de equilíbrio um cubo de um metro de aresta de uma face a outra, uma diferença de 1?C. A madeira tem um calor específico muito elevado, requer uma quantidade maior de calor que outros corpos para alcançar uma determinada temperatura. O coeficiente de condutividade térmica da madeira é ?=0,29 a ?=0,15, (dependendo da espécie) , para alvenaria ?=0,65 , concreto ?,=1,5. A madeira é um excelente isolante térmico, devemos ter um especial cuidado com a orientação da casa em relação ao sol, a ventilação a vedação das portas e janelas, e principalmente o isolamento térmico das coberturas. Se estas medidas não forem observadas corremos o risco de criar verdadeiras estufas ou congeladores.

Paredes – isolamento acústico

A absorção do som é diferente de isolamento acústico. Isolamento requer materiais pesados, a absorção requer maciez, porosidade. A madeira é um bom condutor do som apesar da sua porosidade .A velocidade de propagação do som através das fibras é quase igual a dos metais. Paredes construídas com dois ou mais elementos que não estejam diretamente em contato, (câmara de ar) são mais eficientes no isolamento acústico, A transmissão do som está diretamente relacionada ao peso do material. A alvenaria tradicional é mais eficiente em relação ao isolamento acústico por ser um material mais “pesado” que a madeira. Devemos buscar soluções técnicas que procurem solucionar problemas relativos ao conforto acústico no interior das edificações de madeira.

Consumo energético

Com a crise energética instalada em nosso país, o consumo energético no processo de produção do material é muito importante. A madeira serrada possui baixo consumo energético em seu processamento. A energia solar responde pela formação da madeira e a usinagem requer baixo consumo energético (madeira serrada = 1MJ/KG). A fabricação do concreto do aço e do alumínio , matérias primas muito utilizada na alvenaria de tijolos tem um maior .consumo energético em seu processamento( aço =33MJ /KG concreto = 2MJ/KG alumínio 145MJ/KG).

e)Tempo de construção

Esta é a uma das maiores vantagens sobre o sistema convencional, os componentes podem chegar á obra pré-cortados ou mesmo pré-fabricados, reduzindo muito o tempo de execução da obra . A alvenaria de tijolos é um sistema construtivo bastante artesanal pois a estrutura é feita no próprio canteiro e as paredes são levantadas sobrepondo-se tijolo por tijolo.

f) Desperdícios

No Brasil segundo o Sindicato da Indústria da Construção Civil, este índice é de 1/3, ou seja, há tanto desperdício que de cada 3 casas construídas uma é "jogada fora". O desperdício se dá à partir da inexistência de projetos, mal planejamento das ações no canteiro ou simplesmente a falta de mão de obra capacitada, por inexistência ou por não se querer compensá-la como tal. No processo construtivo de madeira, as peças, na maioria dos casos, pode chegar à obra pré-cortadas ou pré fabricadas (montados em painéis ) não havendo desperdícios. O canteiro de obras de uma casa de madeira é “limpo”, não há entulhos.

g) Instalações elétricas e hidráulicas

Nos sistemas construtivos em madeira não há a necessidade de construir para depois destruir. As tubulações podem passar por dentro dos painéis ou no caso do sistema viga pilar e paredes maciças, passa ao lado dos pilares por meio de uma régua elétrica. A instalação hidráulica também passa por dentro dos painéis. Deve-se tomar muito cuidado na utilização da madeira sem tratamento em áreas úmidas em virtude da proliferação de agentes biodegradantes como fungos e bactérias. Em madeiras tratadas o revestimento cerâmico é simplesmente colado sobre os painéis.

h) Resistência ao fogo

A evolução de um incêndio depende dos materiais envolvidos. As cortinas, carpet , móveis e objetos e a pintura são os primeiros a pegar fogo. Os regulamentos de proteção ao fogo usualmente classifica o material conforme sua resistência a temperaturas de ordem de 850 .C , temperatura do centro de um incêndio no qual o material deveria suportar até a extinção do mesmo. Todos os tecidos da madeira são combustíveis, e apesar deste fato apresenta uma resistência alta ao fogo quando comparada com outros materiais estruturais como o aço por exemplo. A madeira se carboniza lentamente na presença do fogo , havendo uma redução da sua secção transversal no lado exposto a uma velocidade de aproximadamente de 0,64mm/ minuto . Os elementos de secção transversal maiores resistirão mais ao tempo portanto é recomendado o calculo de uma madeira de sacrifício necessária para satisfazer o tempo de resistência requerido.

Durabilidade

Ao contrário do que muitos pensam a habitação em madeira pode ter uma durabilidade muito grande. Tudo depende em primeiro lugar de questões projetuais, existem muitos detalhes construtivos que proporcionam a proteção das peças. Deve-se respeitar as limitações do material e especificar adequadamente a espécie de madeira para cada uso. Outra questão muito importante é procurar afastar a madeira do solo, bem como retirar os restos de madeira que possam servir de alimento para cupins. Há uma regra geral: algumas espécies são naturalmente mais resistentes a agentes biodegradantes. Numa construção de madeira é indispensável o acompanhamento de um profissional capacitado na área de construções em madeira. Pois a questão da durabilidade é sempre um conjunto de variáveis. Não existe madeira ruim , o que existe é a especificação e uso inadequado da espécie. Aproximadamente 30% de uma edificação de alvenaria é feita de madeira, a estrutura do telhado, aberturas, portas e janelas e os acabamentos rodapé , forro etc. As medidas preventivas devem ser as mesmas de uma casa de madeira. A prevenção é a melhor cura.

A madeira é um excelente material de construção sob todos os aspectos, conforto, plasticidade, rapidez de montagem e durabilidade, não tem substitutos na construção civil. Morar em uma casa de madeira é sem dúvida estar mais perto da natureza, pois este material possui uma enorme gama de cores, texturas e aromas que podem ser explorados pelos arquitetos e projetistas na criação de espaços “sinestésicos”. Segundo o arquiteto Ricardo Caruana “...não se pode separar a estética dos materiais de síntese de uma ética dos seres humanos, entre eles e deles com a natureza. Apesar da madeira (especificada corretamente para um determinado uso) ser um material de comprovada qualidade, e o Brasil ,um país de vocação florestal, a maioria dos agentes financeiros não possuem linhas de créditos para o financiamento de habitações em madeira.



Christine Laroca

Arquiteta- Desenvolve projetos de construções em madeira

Professora do departamento acadêmico de construção civil CEFET-PR

Mestranda em Tecnologia e Utilização de Produtos Florestais- UFPR

Fevereiro/2002