A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) realiza há cerca de doze anos pesquisas relacionadas com o emprego da madeira na construção civil. Estes estudos envolvem diversos aspectos ligados à madeira, desde a sua caracterização básica, ou seja, a obtenção de suas características botânicas, físicas e mecânicas, até o estudo da edificação em madeira como um todo, o que envolve a realização de ensaios em laboratório de elementos e componentes construtivos em tamanho real.
A tendência atual é de modificação significativa do setor de edificações em madeira no Brasil. Acredita-se que num futuro próximo as empresas do setor passem a trabalhar com madeira de florestas plantadas e a construir suas edificações com base em sistemas leves em madeira, deixando de lado os sistemas construtivos precários, ainda hoje empregados, e que não são capazes de oferecer um produto de qualidade aos usuários, mas também pela gradativa dificuldade em se obter madeira tropical. Essa mudança de conceito nas construções em madeira está acontecendo também pelo fato do mercado estar apresentando produtos derivados da madeira com a qualidade necessária e requerida para as construções em sistema auto-portante.
Os sistemas leves em madeira têm sido o foco de estudos por parte dos pesquisadores ligados ao GIEM/UFSC, em especial o denominado Sistema Plataforma, que é o sistema construtivo em madeira mais difundido em todo o mundo e ainda bastante desconhecido no Brasil. Este sistema se diferencia dos tradicionais sistemas construtivos por não apresentar o sistema estrutural na forma de pilares e vigas, sendo formado por um entramado composto de inúmeras peças de madeira maciça de pequenas dimensões, cujo fechamento é feito com chapas de madeira reconstituída (ex. compensado e OSB). Deste modo, os entramados de piso, parede e cobertura são erguidos e unidos para formar a estrutura portante da edificação.
As pesquisas atualmente em andamento na UFSC contemplam a caracterização dos materiais empregados no sistema construtivo leve em madeira, de forma ampla, procurando avançar no conhecimento teórico e no comportamento mecânico-experimental, através de ensaios dos diversos componentes empregados nesse sistema construtivo, bem como do comportamento em tamanho real do próprio sistema construtivo na forma de pisos, paredes, estrutura de cobertura, etc. O Laboratório de Experimentação em Estruturas (LEE) do Departamento de Engenharia Civil da UFSC possui uma infra-estrutura que permite a realização de ensaios em escala real de uma edificação de até dois pavimentos, em uma planta de 10m x 10m.
Dentre os principais estudos hoje em andamento, pode-se citar a caracterização dos materiais empregados na forma de madeira bruta ou reconstituída e no estudo da potencialidade e confiabilidade de elementos estruturais produzidos sob novas tecnologias.
Projeto Stella-UFSC
Este projeto de pesquisa, financiado pelo programa HABITARE/FINEP, envolve a participação da UFSC em parceria com a empresa Battistella. O objetivo geral da pesquisa é revisar este sistema construtivo, buscando reduzir os custos envolvidos e simplificar as soluções aplicadas, tornando-o acessível a uma parcela da população com faixa salarial compreendida entre 4 e 10 salários mínimos.
O ponto de destaque foi a construção de um protótipo de 42 metros quadrados em dois pavimentos no campus da UFSC, que tem servido para a avaliação do processo de execução, do desempenho térmico, da funcionalidade e dos custos.
Nesse projeto, houve a oportunidade de verificação do comportamento e da aplicabilidade de componentes estruturais em desenvolvimento no GIEM. Dessa forma, foram utilizadas em seu sistema construtivo, as vigas de perfil “I” e também as vigas em Madeira Laminada Colada (MLC). Por outro lado, está em andamento o estudo do diafragma piso com ensaios em tamanho real e também as paredes diafragma. Esses assuntos são objeto de comentários no decorrer desta matéria.
Viga “I” com alma em OSB
As vigas I apresentam alta resistência com baixo peso próprio, podendo ser empregadas como elemento estrutural em sistemas leves em madeira. Com a industrialização, pode-se sistematizar as etapas de todo o processo construtivo das peças e dos componentes a serem padronizados, obtendo-se maior controle de qualidade em toda a linha de produção, economia nos custos, possibilidades de arranjos estruturais diversificados e flexibilidade na concepção arquitetônica. Atualmente, estes elementos vêm sendo bastante difundidos em diversos países. Geralmente, as vigas I são feitas com mesas (parte superior e inferior) em madeira maciça e a alma (parte mais delgada) em chapas de madeira reconstituída.
As pesquisas em andamento buscam avaliar vigas I com madeira de Pinus e chapas de OSB. O objetivo principal é avaliar diferentes formas de se fazer a união entre as mesas e a alma do perfil. Estão sendo testados elementos com ligação colada e também com ligação através de pregos de diferentes tamanhos e tipos (liso, anelado e espiralado). As vigas I, com 20cm de altura e 210cm de comprimento, estão sendo submetidas a ensaio de flexão simples para obtenção dos parâmetros de resistência e rigidez. De uma forma geral pode-se dizer que em média, essas vigas, que pesam apenas 12 quilos suportam um carregamento progressivo que no momento da ruptura podem atingir 5 toneladas.
Estruturas de piso e parede
No Brasil, o emprego de sistemas leves em madeira é incipiente e consiste apenas de algumas iniciativas isoladas de empresas trabalhando na construção de edificações com base no Sistema Plataforma. Essas empresas atuam no empirismo, pois não encontram subsídios no cenário nacional em termos de publicações, normas ou pesquisas acadêmicas para auxiliarem na concepção arquitetônica e no dimensionamento dos elementos estruturais das edificações, o que envolve diversos detalhes técnicos e construtivos.
Atualmente estão sendo feitas pesquisas no GIEM/UFSC para estudar o comportamento estrutural de elementos de piso e de parede quanto à capacidade resistente a cargas laterais de vento. São confeccionados diversos protótipos em escala real, com dimensões aproximadas de 5,00mx 2,50m, que são ensaiados até a ruptura para a avaliação de desempenho e estudo das variáveis que exercem maior influência no comportamento destes elementos. Pelos estudos já realizados com os pisos (as paredes serão ensaiadas no decorrer do mês de setembro), chegou-se a um dado que mostra, em termos de resistência mecânica, um comportamento que evidencia a necessidade de um vento da ordem de 300km/h para provocar a ruptura e a perda da estabilidade do conjunto que forma o piso mostrado na foto do ensaio.
Madeira Laminada Colada (MLC)
A técnica de produção de peças estruturais, a partir da utilização de tábuas de pequenas dimensões se comparado com a dimensão final de uma viga, por exemplo, trouxe a possibilidade de utilização das madeiras de florestas plantadas na produção de elementos estruturais pré-fabricados com controle de qualidade, duráveis e versáteis, possibilitando a produção de elementos retos ou curvos de grandes dimensões.
Em parceria com empresas do setor produtivo, foram desenvolvidos estudos sobre a viabilidade de utilização de madeiras de florestas plantadas na produção de vigas e pilares para emprego nas edificações em geral e em particular na construção da habitação. Esse estudo foi realizado de forma comparativa e alternativa ao uso da madeira maciça e das vigas compostas em perfil “I”.
Nessa pesquisa sobre as peças estruturais em MLC, foram realizados estudos de caracterização das espécies de Pinus disponíveis nos reflorestamentos na faixa de 8 a 10anos e também na faixa de 20 a 25anos; assim como, a classificação desse material; a eliminação de nós que possam ser mais prejudiciais que as emendas por “finger-joints”; a composição racional de uma viga a partir de classes de resistência e de rigidez do conjunto de tábuas a serem empregadas; a resistência das ligações coladas e o comportamento do elemento estrutural do tipo pilar ou viga.
Foram desenvolvidos também estudos prevendo a possibilidade de produção de vigas em MLC reforçadas com tecido unidirecional de fibras de vidro em substituição às emendas por “finger-joints”. Foram realizados ainda estudos prevendo a possibilidade de reforço de vigas de MLC compostas de tábuas horizontais e verticais, pela introdução de mechas de fibra de vidro nas juntas de cola posicionadas entre as tábuas verticais.
As pesquisas com os elementos em MLC estão passando atualmente pelo aprofundamento da possibilidade de produção das vigas reforçadas com fibras de vidro, cinta de carbono e outras fibras vegetais.
Comportamento da madeira ao fogo
A tendência da arquitetura atual é a de utilizar estruturas cada vez mais leves, tanto por razões estéticas quanto econômicas. As estruturas em madeira se adaptam bem a esses novos desafios, mas as técnicas construtivas devem evoluir para responder aos problemas originários dessas novas concepções. Diferentes são os tipos de solicitações às quais pode ser submetida uma estrutura em madeira e em particular a ocorrência do fogo revela uma situação em que este material apresenta propriedades conflitantes. A madeira é um material isolante, mas combustível. Por outro lado, a madeira que tem a característica de ser inflamável, mantém boa resistência mecânica durante um processo de queima. Isto se dá porque a queima da parte periférica da peça forma uma camada carbonizada que dificulta o acesso do oxigênio do ar e em não havendo oxigênio a propagação do fogo para o interior da peça vai perdendo intensidade. Logo, o núcleo não carbonizado pode conferir boa resistência mecânica durante um bom tempo.
O potencial de resistência ao fogo de madeiramentos antigos é bem conhecido, contudo as construções modernas, onde predomina o emprego das madeiras de florestas plantadas e de baixa densidade, precisam garantir uma estabilidade ao fogo, a fim de permitir a evacuação dos locais, resgate de objetos de valor e o combate ao incêndio com a minimização dos danos ligados à propagação do fogo. Esta necessidade se traduz, particularmente para as estruturas de madeira, pela necessidade de conhecimento do comportamento ao fogo das ligações. Elas são responsáveis pela transmissão dos esforços no interior das estruturas.
Para aprofundar o conhecimento desse fenômeno, está em implantação no GIEM uma linha de pesquisa que trata da influência da temperatura sobre as ligações e sobre as propriedades da madeira quando da ocorrência de incêndios.
Prof. Dr. Carlos Alberto Szücs – coordenador geral do GIEM e Diretor Regional do IBRAMEM/SC
Profª. Drª. Ângela do Valle – engenharia civil
Profª. Drª. Poliana Dias de Moraes – engenharia civil
Profª. Drª. Carolina Palermo Szücs – arquitetura e urbanismo
Prof. Dr. João de Deus Medeiros – botânica
Eng. Civil Gustavo Lacerda Dias – doutorado em engenharia civil
Eng. Agrícola Altevir Castro dos Santos – doutorado em engenharia civil
Arquiteta Joana Geraldi Velloso – mestrado em engenharia civil
Arquiteta Thaís Krambeck – mestrado em arquitetura e urbanismo
Eng. Civil André Luiz Lima – mestrado em engenharia civil
GIEM-Grupo Interdisciplinar de Estudos da Madeira
Departamento de Engenharia Civil / UFSC
e-mail: szucs@ecv.ufsc.br
página web: http://www.ecv.ufsc.br/giem
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