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REVISTA DA MADEIRA - EDIÇÃO N°78 - FEVEREIRO DE 2004

Valor Agregado

Valor adicionado e exportações

A Amazônia é uma região distante dos centros consumidores, com uma geografia que dificulta e encarece o transporte. Tendo um passado essencialmente extrativista a região ainda não desenvolveu sua potencialidade econômica como em produtos oriundos de madeira. De lá a madeira sai em apenas serrados ou laminados e raramente é beneficiada. Perde-se em material que não será aproveitado no produto final e perde-se no frete.

A região ainda é abastecida principalmente por produtores do Sul do país. Há um grande potencial para exportar e também para abastecer mercados regionais. Assim há um grande potencial para o desenvolvimento sustentável. A sustentabilidade é mais que gerar emprego e distribuir renda; é ir além dos mercados, da divisão Norte-Sul, da economia ecológica. É preciso integrar a natureza com o crescimento econômico.

A região vende produtos tradicionais. Eles têm limitado valor agregado e seus mercados são quase estagnados, e têm uma gradual elevação da oferta, o que pressiona a lucratividade.

A região precisa com urgência aumentar suas vendas de produtos semi-manufaturados. Isto vale para todo o Brasil. Além de atender nichos, oferecendo preços compensadores, em geral eles são feitos em pequenas empresas e oferecem um valor adicionado significativo, quando comparados com outras indústrias, absorvendo muita mão de obra não-qualificada.

Em vez de exportar painéis ou pranchas, ou mesmo S4S, podemos exportar o piso pronto, acondicionado em volumes de m² para entrega direta nos hipermercados de material de construção. A lâmina já deve ser exportada em contraplacado. A faqueada deve enriquecer móveis de alta qualidade. Madeiras nobres devem sair já como componentes (pernas, braços de cadeiras, tampos de mesa) prontos para receber acabamento final e montagem. Temos ótimos artesãos e marceneiros. Podemos machetear como poucos. O mercado externo está abarrotado de ofertas de produtos padronizados. Os nichos mais lucrativos são justamente os de madeira maciça e produtos individualizados.

O grande problema é que estas pequenas empresas ainda não têm qualidade, organização de produção, embalagem, logística, contatos comerciais, que são pré-requisitos para atender mercados distantes. O produtor pequeno ainda não se organizou em grupos ou evoluiu para racionalizar sua produção. Espalhou-se o conceito já superado que é preciso muito capital e tecnologia para produzir bens para os nichos mais lucrativos. Isto depende de cada matéria-prima, da região ou município em que se encontra e do contexto dos mercados adjacentes. Mas o que falta é sobretudo catalisadores locais que, com apoio dos que têm acesso às redes de compradores, e conhecendo diferentes níveis tecnológicos recomendar o adequado a cada um, e os ajudar a lá chegar. Na União Européia mais de 80% das marcenarias são empresas familiares; e na França o meio rural está crescendo (27%) muito mais que o urbano.

O Sebrae tem programas para promover novas pequenas empresas. O PATME/Sebrae apóia o desenvolvimento técnico das já estabelecidas. O FAT oferece treinamento operacional. O PROEP oferece recursos para a expansão do ensino técnico. A APEX apoia a iniciação de empresas em exportação. Enfim, há recursos da União para projetos que desenvolvam pessoal e pequenas empresas. Há fundos internacionais para adaptação de tecnologia. Mas nada disso tem atendido à pequena indústria da pequena cidade. O desperdício é enorme. Queima-se cavaco e serragem, que na Europa vira aglomerado. Queima-se ripa, que lá vira banco, encosto e perna de cadeira, mesinha. A qualidade é muito variada; o produto estufado reabsorve umidade; a qualificação é insuficiente.

O que falta é uma ação para:

Identificar e dimensionar oportunidades de desenvolvimento da pequena/média indústria,

Identificar e dimensionar necessidades de investimentos em estruturas de apoio ao empresário de beneficiamento da madeira; e treinamento,

Identificar e dimensionar projetos específicos para a iniciativa privada,

Simplificar a burocracia (hoje uma marcenaria paga 60 impostos, tarifas, contribuições em 17 diferentes dias do mês),

Delinear uma ação em parceria com organismos federais, para adaptar cursos e apoio técnico a atuais e potenciais empresários, usando uma linguagem simples e com muitas demonstrações em seminários e sobretudo "coaching" na consultoria em cada empresa ou associação interessada, e levá-la a usar processos racionais de produção qualitativa,

Descentralizar as decisões de programas governamentais para as associações locais.



Visão geral do setor



Com relação a madeiras e seus derivados (pranchas, aparelhados, laminados, portas e janelas, pisos, móveis, etc) alguns aspectos são observados como :

a escolha do ângulo de serra do toro nem sempre o utiliza ao máximo

usam-se muitas vezes equipamentos sub-dimensionados e ferramentas inadequadas

não há suficiente e adequada manutenção de equipamentos, nem afiação de ferramentas

madeira serrada é vendida e trabalhada verde, sem utilizar modernas técnicas de estufa solar

não se dominam técnicas de planejamento e controle de produção

o lay-out não oferece um fluxo racional de materiais entre as máquinas

não há uma escala para usar ao máximo as máquinas que são o gargalo na produção, ocasionando baixa utilização do parque industrial instalado

carpintarias fazem de tudo, não se especializam e assim limitam seu volume, qualidade e entrega

o marketing não é dirigido a nichos, quando existe

a embalagem (quando há), não corresponde à usada pelos diferentes nichos de mercado

o transporte é obsoleto, caro e não garante o prazo de entrega contratado

a classificação de lâminas não oferece o nível de exatidão exigido pelos clientes de porte

em marcenarias e carpintarias não se tem ainda uma produção racional, em série

há uma substancial perda de matéria-prima, por não vender dimensões menores a quem as use

a produção de laminados faqueados, com enorme valor agregado, é inexistente ou limitada



Muitos empresários têm insuficiente domínio de técnicas simples, como transporte, embalagem, organização da produção, contabilidade de custos, marketing. O desperdício é vultuoso e chega a 80% do volume na floresta. Como não há beneficiamento local e o custo do frete é elevado, abandona-se galhos de importantes dimensões, quando ali mesmo seria possível usar pequenas serras de disco (muito freqüentes na Europa) em serrarias móveis, cujo custo instalado é de US$ 3 a 4mil. Elas geram tecnologia e emprego local, aproveitam recursos hoje desperdiçados, criam produtos que hoje são feitos à 300-900km do consumidor. É o exemplo de lâminas de madeira de Rondonia, transformadas em compensado em São Paulo ou Pará e que voltam, depois de 4000 km de estrada, para as fábricas de móveis ou construções da região. O oligopólio do setor fez lobby para que se acreditasse não ser possível fazer uma pequena fábrica de compensado, numa pequena cidade rodeada de floresta. Mas há exemplos recentes em Guiné, Angola, Filipinas, Malásia, que o mais importante para a vitalidade de tal fabricação, além de proximidade à matéria-prima, é a organização da empresa e do grau de responsabilidade econômica e social de seus dirigentes.





(*)Jack Soifer foi peão de fábrica antes de fazer engenharia operacional e mestrado. Há 36 anos é consultor de pequenas empresas em 10 países. Publicou 30 trabalhos e livros em 4 línguas. é Conselheiro dos Inst. de Desenvolvimento Econômico e Social, IBRADEC; de Pesquisa, Desenvolvimento e Educação, IPDE; Brasileiro de Promoção do Comércio Internacional, PROMOINTER. E está no Grupo de Trabalho da Pequena Empresa do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, da Presidência da República.