As florestas plantadas no Brasil, especialmente com pinus e eucalipto, são a principal fonte de matéria-prima para aqueles setores industriais que se utilizam da madeira e que se caracterizam por produção em grande escala. Entre estes, os que absorvem a maior parte da produção florestal são os setores de celulose e papel, carvão vegetal e madeira processada mecanicamente, tanto serrarias quanto as indústrias de painéis à base de madeira.
A demanda de matérias-primas nestes setores industriais flutua ao longo dos anos devido à estrutura e condições dos mercados dos vários produtos e ao perfil da comercialização. Estas flutuações da demanda se refletem também na oferta da matéria-prima, especialmente em face da redução verificada na implantação de novas áreas florestais e do conseqüente acirramento da competição pela matéria-prima.
Exemplos claros desta situação podem ser vistos nas variações cíclicas no setor de celulose e papel, que causam aumentos e reduções da produção e comercialização destes produtos, o que afeta diretamente a área de florestas em exploração e em reposição anual. Outro exemplo é a concentração na manufatura de produtos de maior valor agregado, numa clara tendência à melhor utilização da matéria-prima produzida, e à busca da melhor remuneração.
A indústria moveleira, especialmente de móveis seriados, se caracteriza por alta velocidade e grande produção. Estas características são típicas do segmento e garantem a sua competitividade. Para mantê-las, a indústria moveleira requer matéria-prima com propriedades uniformes, principalmente a densidade, a cor. Também são importantes as características tecnológicas, como trabalhabilidade, colagem, retenção de conectores metálicos e acabamento, com produtos como tintas, vernizes e outros.
Variações nas características e propriedades da matéria-prima usada afetam diretamente os processos industriais de produção, nos seus parâmetros e sua produtividade e, evidentemente, também na qualidade do produto final. Outras características requeridas referem-se ao fornecimento da matéria-prima, que deve ser constante, a preços competitivos, atendendo as dimensões e os volumes requeridos.
As características exigidas das matérias-primas são encontradas tanto na madeira sólida, proveniente de reflorestamento (pinus e eucalipto), como também nos painéis à base de madeira de reflorestamento: compensados, sarrafeados, aglomerados, chapas de fibras, MDF e OSB.
A produção brasileira de madeira serrada, em 2002, foi de aproximadamente 23 milhões de metros cúbicos no total, sendo o seu consumo aparente cerca de 19,7 milhões m³ (ABIMCI, 2003). Destes, 15%, ou seja, perto de 3,5 milhões m³ de madeira serrada foram destinados à indústria de móveis, sendo que deste total, aproximadamente um terço é originário de florestas plantadas, especialmente pinus. Tem-se assim, no setor moveleiro, que usa madeira sólida, especialmente em móveis destinados à exportação, um mercado de 1 milhão de metros cúbicos por ano de madeira de reflorestamento, com uniformidade de características e mínimos defeitos.
Esta demanda, que tem condições de ampliação, defronta-se com um sério obstáculo: o esperado déficit na produção de madeira de pinus para serraria e para a indústria moveleira. Estudos recentes estimam já em 2003, um déficit de 11,3 milhões m³ de toras de pinus. Este déficit deverá crescer, alcançando por volta de 2020 mais de 27 milhões m³ (ITTO, 2003).
Assim, as importações de madeira serrada de pinus já são uma realidade, especialmente originárias do Uruguai, que possui um suprimento desta matéria-prima, dentro do raio de alcance da indústria moveleira do sul do Brasil.
Entretanto, se há incerteza quanto ao fornecimento de pinus para a indústria moveleira, existe a constatação da crescente disponibilidade da madeira de eucalipto serrada e seca em estufa, de boa qualidade e em condições uniformes de cor, densidade e características tecnológicas, a preços competitivos. Uma tendência à substituição de matérias-primas tradicionais por madeira de eucalipto já é visível em alguns centros produtores de móveis, como Colatina (ES), que estão substituindo as madeiras nativas, seja por escassez e preço, ou por pressão de agências ambientais.
A partir de campanhas bem estruturadas por parte de produtores e processadores, a madeira serrada e seca de eucalipto tem preenchido com sucesso vários nichos de mercado, que vão desde madeira seca em estufa para compor a estrutura de móveis estofados, como pode ser visto na produção dos pólos moveleiros de Ubá (MG) e Arapongas (PR), até a demanda por madeira sólida e de maior densidade, de cor avermelhada, para constituir móveis mais sóbrios e mais pesados, que transmitam a sensação de solidez e grande durabilidade.
A madeira de eucalipto já começa a ser introduzida no mercado de exportação, na forma de móveis de madeira certificada. Exemplos disto podem ser vistos nas exportações dos pólos moveleiros de São Bento do Sul (SC) e de Bento Gonçalves (RS). O eucalipto, serrado e seco, com cor e densidade uniformes, passou também a ser matéria-prima utilizada com sucesso e entusiasmo, pelos maiores nomes do design brasileiro em móveis de luxo.
Construção civil
Estudos recentes mostraram que na região sudeste, especialmente em São Paulo, a madeira usada em construção habitacional, especialmente em estruturas de telhado, provem de dez a doze espécies, principalmente nativas e algumas madeiras de florestas plantadas. Estas são o cedrinho (Erisma uncinatum), o ipê (Tabebuia spp), o pinus (Pinus spp), o pinho-do-Paraná (Araucaria angustifolia), a peroba-rosa (Aspidosperma polyneuron) e outras, em menor proporção, como o cambará (Qualea spp), o jatobá (Hymenaea courbaril), a imbuia (Ocotea porosa), o angelim-pedra (Hymenolobium spp), a itaúba (Mezilaurus itauba), e outras. Entretanto, a escassez destas madeiras e o seu alto preço, forçam o mercado a substituir estas espécies por outras, mais abundantes e disponíveis a preços mais competitivos.
A demanda de materiais naturais para a construção tem aumentado com a expansão da construção habitacional. Isto se dá não somente nos usos tradicionais, como estruturas, pisos e esquadrias, mas também constituindo paredes externas e divisórias. Isto se nota não só nos centros urbanos, mas especialmente em casas pré-fabricadas de padrão médio a alto, no litoral ou na serra, em condomínios urbanos e rurais. Esta expansão evidencia a necessidade de matéria-prima com características uniformes, amplo suprimento e baixo custo, possíveis nas madeiras de florestas plantadas, homogêneas e de rápido crescimento, especialmente eucalipto e pinus.
Embora o rendimento em serraria das madeiras densas, como o eucalipto, possa ser relativamente baixo (45% a 55%), devido aos diâmetros e a conicidade dos troncos, a madeira serrada resultante se presta muito bem ao uso como material de construção, especialmente tábuas estreitas, pontaletes e vigotas, caibros e ripas.
Com madeira selecionada, peças dimensionadas com base na resistência mecânica da espécie, conectores metálicos apropriados e projetos bem elaborados, os institutos de pesquisas, as universidades e as empresas especializadas em casas pré-fabricadas têm produzido protótipos de primeira linha. Com métodos construtivos modernos, têm-se experimentado a pré-fabricação de painéis, com vistas à montagem mais rápida nos locais de construção, bem como acabamentos internos modernos, como gesso acartonado, de rápida instalação. Os resultados têm sido encorajadores e os protótipos, tanto de pinus como eucalipto, têm sido expostos e divulgados amplamente na mídia e em exposições.
As boas práticas construtivas incluem sempre o tratamento preservativo da madeira contra o ataque de fungos e insetos, com produtos químicos de baixa toxicidade, o que confere proteção às peças, principalmente aquelas sujeitas a condições agressivas, de alta umidade e em contato com o solo. Crescentemente, têm-se utilizado acabamentos com produtos hidrorrepelentes, com ou sem pigmentos, visando aumentar a durabilidade da madeira á intempérie.
A madeira serrada de eucalipto e pinus, em vigas laminadas e coladas, tem sido empregada também na construção de edifícios multiuso, com estruturas do tipo pórtico leve, destinados a centros de reunião, escolas, escritórios, salas de aulas e outras finalidades. Estes edifícios diferem daqueles tradicionais, construídos em alvenaria, porque os componentes das estruturas são fabricados em madeira, com peças delgadas, formando estruturas leves, que transmitem os esforços e as cargas às fundações através de uma única base.
As construções em madeira, de uma maneira geral, oferecem vantagens aos projetistas, pois as estruturas em madeira, mais leves, podem ser executadas com conectores simples, em material econômico e com grande variedade de acabamentos. A estrutura leve admite fundação também leve, mas que garante um excelente desempenho; aos fabricantes, pois este tipo de construção usa menos mão-de-obra, com menor custo e maior rapidez. Neste tipo de construção, as peças utilizadas são geralmente de pequeno comprimento e espessura, e portanto, de fácil desdobro, secagem e tratamento; aos usuários, pois as habitações assim construídas proporcionam melhor conforto térmico, em função de suas propriedades de isolamento e maior custo-benefício.
Na construção de habitações e edificações em geral, com madeira de reflorestamento, a matéria-prima pode ser utilizada em várias situações:
Os painéis de paredes construídos com montantes verticais e peças curtas horizontais: o pórtico do painel serve para fixar os painéis de revestimento. A madeira usada deve ter rigidez média a alta, boa retenção de pregos, boa trabalhabilidade e não apresentar arqueamento.
O material deve estar razoavelmente seco, com teor de umidade de 15% a um máximo de 20%. Os painéis externos são construídos com montantes selecionados visualmente e contêm as aberturas das portas e janelas. As peças tem medidas básicas de 50x100 mm (2x4”) ou 40x90 mm, espaçadas regulamente, e unidas em juntas retas simples, pregadas.
As coberturas podem ser treliças leves, com espaçamento definido em função das dimensões das placas de madeira usadas para cobertura (400 a 900 mm). As peças de madeira são esbeltas, geralmente 40x90 mm, devendo-se verificar os comprimentos de flambagem das peças comprimidas para a colocação de reforços.
A substituição das madeiras nativas usadas em construção civil por madeiras de reflorestamento resulta em estruturas fabricadas com componentes mais delgados e, portanto, mais leves. Com isto, a construção habitacional e de outros tipos de edificações com madeiras de reflorestamento, passa a constituir um mercado em expansão para esta matéria-prima.
Um nicho de mercado para as madeiras de reflorestamento de maior densidade, na construção habitacional, é o de pisos de madeira, como tábuas para assoalhos em vários comprimentos e com encaixes macho-fêmea nos quatro lados, tacos e tacões, painéis e parquetes. Em adição aos pisos de madeiras nativas, o eucalipto apresenta aceitação crescente no mercado, especialmente com as espécies mais densas, como o E. saligna ou mesmo híbridos naturais de Eucalyptus grandis e E. urophylla .
Este último produto já representa item de exportação, tendo a Aracruz vendido no ano passado, uma partida de 10.000 m³ para a Weyerhaeuser (Weyco), uma das maiores empresas de produtos florestais do mundo, para distribuição nos EUA e Canadá.
Outros nichos de mercado, mais sofisticados e específicos, podem ser encontrados também na área estrutural, que pode absorver madeiras de menor ou maior densidade e resistência mecânica, para estruturas de pórticos leves, treliças, vigas laminadas e coladas, compostas com painéis compensados, componentes estruturais e outros.
Painéis
Os painéis representam uma excelente opção para o aproveitamento da madeira na indústria moveleira. A tecnologia disponível atualmente permite a confecção de painéis com qualidade e apreços competitivos, tanto compensados quando os painéis reconstituídos.
A indústria brasileira de compensados produz cerca de 2,25 milhões de metros cúbicos (2001), a maior parte destinada à exportação. Destes, cerca de 50% são produzidos com madeira tropical e o restante, a partir de madeira de reflorestamento, principalmente pinus
As exportações brasileiras de compensados têm crescido cerca de 16,5% ao ano desde 1990. Os volumes exportados em 2000 e 2001 oscilaram entre 1,2 e 1,4 milhões de metros cúbicos, sendo a Alemanha, Bélgica, Estados Unidos e Reino Unido os principais importadores do produto, recebendo 64% do volume exportado, a preços que têm variado entre US$150 e 250 por m³ .
O consumo nacional, de aproximadamente 875 mil m³, destina-se à fabricação de móveis (45%) e embalagens (17%). Os compensados consumidos no mercado interno são principalmente de madeiras tropicais, embora a chapa tipo "combi" (face de madeira tropical e miolo de pinus) esteja ganhando importância, principalmente no setor moveleiro.
Neste setor, a produção de compensados, seja para a exportação ou consumo no mercado interno, se apresenta como um mercado promissor para as madeiras de reflorestamento, especialmente pinus. Lâminas de eucalipto, embora de produção ainda incipiente, têm se mostrado também um item de procura crescente.
Os painéis reconstituídos (aglomerados, chapas de fibras, MDF e OSB) são fabricados no Brasil a partir de madeiras de reflorestamento, principalmente pinus e eucalipto.
Os aglomerados, com produção de 1,5 milhão m³, representam 62% do total de painéis reconstituídos fabricados no Brasil e são quase totalmente consumidos no mercado interno. As chapas duras de fibras de eucalipto é um importante produto de exportação, que absorve cerca de 40% da produção nacional. O seu consumo interno é da ordem de 300 mil m³ por ano.
O MDF, preponderantemente fabricado a partir de pinus, tem uso crescente e vem ocupando partes dos mercados de madeira maciça e de outros painéis, sendo cada vez mais empregado na indústria moveleira. A produção brasileira é recente. Até 1996 o Brasil importava todo o MDF que necessitava e até hoje a maior parte da produção nacional é utilizada internamente. As exportações são diminutas.
Destes segmentos de mercado, quaisquer volumes de pinus podem ser absorvidos na produção de MDF, OSB e aglomerados. A madeira de eucalipto encontra destinação certa na produção de painéis de madeira aglomerada, chapas de fibras, e cada vez mais, lâminas de madeira.
Maior valor agregado
Os produtos de maior valor agregado, assim como os painéis, também se constituem como uma alternativa de mercado bastante promissora. Entre os mais difundidos no mercado estão: clear blocks & blanks, ou madeira sem defeito. Este produto é de comercialização recente, tendo surgido no mercado por volta de 1994/95, com o início das exportações de serrados de pinus. Embora não definido em normas técnicas nacionais, mas conhecido no mercado internacional como "clear blocks" ou "clears", este produto refere-se às peças de madeira serrada de pequenas dimensões, isentas de defeitos, como nós e imperfeições visuais.
A comercialização dos clears é dirigida principalmente ao mercado de exportação. Destinam-se à confecção de molduras, esquadrias, revestimentos, partes e peças aparentes de móveis, ou são vendidos aos consumidores para uso próprio (do-it-yourself) ou bricolagem. Os clears, quando são emendados nos topos por finger joint, formam peças mais longas, os blanks.
Os clears são obtidos por rebeneficiamento da madeira serrada, para ajuste de dimensões e eliminação de defeitos, como nós e outras imperfeições. São considerados defeitos proibitivos os nós, a medula, variação acentuada de cor e empenamentos e rachaduras de qualquer tipo. A secagem em estufa e a equalização dos teores de umidade à 12% (base seca) são condições freqüentemente impostas pelo mercado e as peças devem apresentar sobremedida para absorver o ajuste às dimensões finais. A exportação requer homogeneidade das peças e isenção de defeitos.
As dimensões dos clears são bastante flexíveis: espessuras desde 33,3 mm (1.5/16") até 38,1 mm (1.1/2"); larguras desde 46,9 mm (1.7/8") até 142,9 mm (5.5/8"); e comprimentos acima de 150 mm (6").
Estas características fazem com que o rendimento do produto em relação à madeira serrada deste produto seja alto na fabricação. Um experimento recente, produzindo clears para exportação, indicou um rendimento de 75% em relação ao volume total de madeira serrada seca em estufa.
A produção brasileira destes produtos está em expansão, assim como sua exportação. Um exemplo pode ser visto nas importações pela Boise Cascade dos Estados Unidos, de clear blocks & blanks de pinus (Pinus elliottii e P. taeda) a partir dos portos de São Francisco do Sul e Itajaí (SC), no período entre abril de 1999 e março de 2000. As importações alcançaram aproximadamente 16.300 m³ ao valor de US$ 6,37 milhões, ou sejam, cerca de US$ 390 / m³ (CIF).
Os clears são produzidos principalmente com pinus, favorecido no mercado por ser leve e de cor clara. Entretanto, consultas feitas a fornecedores e compradores diversos já em 1999 , indicaram que o mercado pode absorver clears de eucalipto, especialmente das espécies mais leves e claras, desde que haja uniformidade de cor e de densidade, além da ausência de defeitos.
A produção de madeira serrada e seu beneficiamento é um setor que apresenta grandes possibilidades de agregar valor aos seus produtos, especialmente àqueles destinados ao mercado de exportação. Isto representa para as madeiras de reflorestamento, um conjunto novo de oportunidades e nichos de mercado, até agora apenas explorados de maneira incipiente.
Tais mercados estão operantes e em crescimento para outros produtos de maior valor agregado, tais como os painéis colados lateralmente (edge glued panels - egp), de eucalipto, exportados a US$ 510 a 570 / m³, e de pinus, exportados a US$ 430 a 450 / m³ , molduras, com preços variáveis de US$ 150 a 296 / m³, tábuas para cercas (fencing boards), em média a US$ 175 / m³ (CIF), e janelas, portas e esquadrias, além de vigas laminadas e outros produtos.
Esta rápida visão dos mercados praticados para os produtos de madeira de florestas plantadas pretendeu mostrar sua diversidade, suas possibilidades de expansão e desdobramento, e sua capacidade de absorver praticamente quaisquer quantidades de madeira produzida.
Isto poderá se dar tanto na forma de matéria-prima para as indústrias de produtos intermediários, como os painéis à base de madeira, quanto na forma de madeira serrada, seca e beneficiada, como produto final, para o mercado nacional ou para exportação.
Uma rápida análise mostrou que o produto, nas suas mais variadas formas pode ser bem remunerado, desde que seja atendida a condição evidente de que os mercados favorecem a agregação de valor e de qualidade.
Marcio Augusto R. Nahuz, pesquisador PhD - IPT - São Paulo |