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REVISTA DA MADEIRA - EDIÇÃO N°76 - SETEMBRO DE 2003

Certificação

Mercado para a madeira certificada é crescente

Os requisitos, exigidos das empresas que desejam obter selos de certificação, a maioria ligados a qualidade, encurtam o caminho na conquista de novos mercados, principalmente no exterior, onde a demanda vem evoluindo nos últimos anos, principalmente no mercado europeu. A demanda por madeiras com estes requisitos vem valorizando o produto, chegando a custar mais de 15%, em alguns mercados.

Além do preço, e da abertura de mercado ou manutenção, outro ponto positivo é a redução do número de intermediários trazida pela certificação da cadeia de custódia, graças à dificuldade de sua realização com o envolvimento de uma série de intermediários. Isto beneficia o produtor primário, o aproximando do comprador final.

Em relação ao mercado de madeira tropical, outra vantagem é a possibilidade do desenvolvimento para madeiras pouco conhecidas, o que amplia a exploração e possibilitando o desenvolvimento econômico do segmento florestal.

Segundo estudos realizados por especialistas do setor existem dois conjuntos de forças atuando na criação do mercado para produtos florestais de origem sustentável. O primeiro dele estimula as empresas a assumirem posturas mais sustentáveis na exploração. Estas forças incluem: os grupos ambientais, pressionando a indústria florestal a reduzir os impactos de suas operações; a evolução dos sistemas de manejo florestal e dos sistemas de certificação florestal, providenciando mecanismos que diferenciam aquelas indústrias que realizam o “bom manejo”; os pioneiros no uso dos sistemas citados, que vêem a sustentabilidade como uma oportunidade de negócios e que, de certa forma, pressionam as outras indústrias para a mudança; e a crescente regulamentação governamental obrigando os exploradores florestais a trabalharem de modo mais sustentável.

O segundo o grupo de forças, conduzem a indústria florestal para a sustentabilidade. Entre estas forças estão: a preocupação dos consumidores em relação a produtos colhidos de forma sustentável; a demanda dos grupos de compradores de produtos florestais e a conseqüente criação de demanda agregada para produtos certificados; a preferência governamental em diversas instâncias, particularmente instâncias locais, por produtos de madeira certificados; a demanda por parte de determinados nichos formadores de opinião, particularmente arquitetos e decoradores.

Grupo de compradores

O grupo de Compradores de Produtos Florestais Certificados, existe no Brasil há três anos, é integrado por 59 empresas (indústrias, varejistas e designers), 2 governos estaduais (Acre e Amapá) e uma prefeitura (Guarujá, SP). Dois sindicatos moveleiros (de Brasília e do Pará) também já fazem parte deste grupo.

Juntas, essas organizações demandam hoje 1.000.000 m³ de madeira bruta certificada, podendo chegar ao dobro disso, ou 2 milhões de m³/ano, caso toda a sua produção seja de madeira certificada. Cerca de 90% da madeira certificada adquirida pelo Grupo é de Eucalypto e mais da metade (entre 60 e 70%) é utilizada em produtos destinados à exportação. O grupo de Compradores de Produtos Florestais Certificados estabeleceu como meta que, até 2005, suas compras de madeira serão 50% certificadas se oriundas de floresta nativa e 100% no caso de reflorestamento (plantações).

No exterior o mercado é ainda mais atraente. Por isso, na América do Norte, Austrália, Japão, França, Alemanha, Espanha, Suíça, Holanda, Bélgica, Áustria e Escandinávia já existem mais de 8.500 empresas (grandes médias e pequenas) que procuram operar somente com madeira certificada. A Rede de Floresta e Comércio Global é integrada por grupos de 16 países. Outros grupos de compradores de madeira certificada estão se organizando também na Itália, África do Sul e Sudeste Asiático.

Para citar alguns exemplos, empresas como a Homebase e a B & Q, da Inglaterra, e a Home Depot e a Lowe’s Company, dos Estados Unidos, a Castorama , da França (com lojas espalhadas por toda a Europa), e a St. Gobain (representada pela Meyer International), que é a segunda maior construtora da Europa, já aderiram a Grupos de Compradores do FSC. Para se ter uma idéia do que isso significa, a Homebase sozinha compra 550 mil metros cúbicos de madeira por ano para fabricar cerca de 5.500 produtos que utilizam a madeira ou o papel como matéria-prima, gerando no varejo um faturamento de mais de 700 milhões de dólares por ano. No entanto, o Brasil supre apenas 7% desse mercado. O restante da madeira vem da Suécia, África do Sul, Finlândia e da própria Grã-Bretanha. A demanda pelo produto com selo FSC tende a crescer cada vez mais. Compradores internacionais, principalmente da Europa, viajam pelo mundo inteiro em busca de matéria-prima e de produtos finais certificados.

Madeira tropical

Um trabalho realizado em parceria pelo Programa Amazônia da ONG Amigos da Terra, pela certificadora Imaflora e pelo Imazon, com o objetivo de mapear o consumo de madeira tropical no mercado interno brasileiro, concluiu que nas regiões sul e sudeste do Brasil está concentrado o maior e mais intenso consumo de madeira tropical do mundo, mais do que o dobro do que é importado pelos quinze países da União Européia, diferente portanto do tradicionalmente estabelecido que diz que a madeira da Amazônia é prioritariamente exportada para os países do norte.

De maneira mais detalhada, o estudo aponta para uma produção de madeira em tora na Amazônia de aproximadamente 28 milhões de m³, extraídos majoritariamente nos estados do Pará e do Mato Grosso, seguidos por Rondônia. Espera-se para breve um incremento nas produções dos estados do Amazonas e do Acre. O sudeste brasileiro responde pelo consumo de aproximadamente 37,4% desta produção, enquanto que a região sul responde por aproximadamente 18,7%, tornando assim as populações dos estados destas regiões alvos preferenciais para qualquer tipo de estratégia que tenha o objetivo de influenciar a demanda por madeira amazônica.

Em relação aos preços praticados, a pesquisa pode observar que o preço médio das madeiras, por volta de R$135,00 por m³ (“posto caminhão” na origem), ainda pode ser considerado modesto e pode ser explicado pelo “baixo custo” da ilegalidade difusa.

O sistema convencional

A típica exploração de madeira na Amazônia, também chamada de mineração da madeira, tem início com a procura e derrubada pelo motosserrista das árvores das espécies requeridas pela indústria. Todas as árvores são derrubadas na direção de queda natural, sem preocupação com o direcionamento de queda para evitar danos às árvores jovens ao redor ou para facilitar o arraste das toras. Também não há o corte de cipós, operação que facilita a derrubada e também diminui o impacto sobre outras árvores menores. A partir da derrubada, o tratorista abre cerca de 200 ms de estrada para o arraste das toras até os pátios de estocagem no interior da floresta. Este processo é realizado para todas as árvores a serem extraídas, não sendo realizado nenhum planejamento prévio deste arraste. Normalmente, os operários não recebem qualquer tipo de treinamento formal sobre o uso dos equipamentos que operam.

As principais características da exploração tradicional realizada de forma empírica e predatória são: excessiva movimentação de máquinas, provocando uma maior área afetada por árvore extraída; perdas de volume causadas pela perda de algumas árvores abatidas e não localizadas no momento do transporte, além de corte equivocado de alguns indivíduos; menor rendimento das operações, pela falta de planejamento; maior custo por árvore extraída, em virtude do deslocamento desnecessário de máquinas e comprometimento do estoque remanescente.

Um outro aspecto salientado é o aumento da vulnerabilidade da floresta à entrada de fogo, além da redução das chances de regeneração da floresta com suas características originais.

O manejo florestal sustentável é a administração da floresta para a obtenção de benefícios econômicos e sociais, respeitando-se os mecanismos de sustentação do ecossistema. O manejo da floresta em regime de rendimento sustentável, para obtenção de produtos madeireiros e não madeireiros, necessita de uma exploração de baixo impacto, da aplicação de tratamentos silviculturais e do monitoramento.

Após o pedido de inspeção da área florestal e sistema de manejo a o certificador determina em que estado está em relação a critérios e princípios claramente definidos. O processo de certificação também pode incluir uma auditoria no produto florestal desde a área de corte até o ponto final de venda, chamada de certificação da cadeia de custódia.

Este sistema foi desenvolvido como uma alternativa a algumas outras iniciativas que objetivavam a melhoria do manejo florestal e a conseqüente redução da eliminação da cobertura florestal e que com o tempo foram percebidas como pouco eficientes. Uma destas iniciativas, por exemplo, foi o boicote aos produtos oriundos de madeiras tropicais, proposto por algumas Organizações Não-Governamentais (ONGs) na década de 80. O apelo à certificação florestal também surge através da observação da incapacidade dos governos, particularmente daqueles localizados nas áreas de florestas tropicais, de efetivamente conduzir suas políticas florestais, quando existentes.

A partir da percepção da possibilidade de diferenciação frente ao mercado, diversas iniciativas começaram a ser tomadas para a implantação de selos indicadores de “bons manejos” florestais, alguns deles inclusive de natureza local, como por exemplo, o desenvolvido pela Sociedade Brasileira de Silvicultura, o CERFLOR, em parceria com a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). As iniciativas mais importantes são as desenvolvidas através da série ISO, adotadas por indústrias de diversos países e a criação de uma entidade hoje reconhecida, principalmente entre as organizações ambientalistas, como a mais importante credenciadora da exploração florestal sustentável, o Forest Stewardship Council-FSC.

A entidade se caracteriza pela paridade entre o Norte e o Sul e por ser uma instituição tri-cameral, com uma participação igualmente distribuída entre as empresas, os movimentos ambientalistas e os movimentos sociais na elaboração de suas diretrizes. Estes participantes, reunidos em assembléia, definem os princípios e critérios mundiais, que são por sua vez adaptados à realidade local pelos membros do Grupo de Trabalho de cada país, distribuídos da mesma forma tri-cameral. Estando os princípios e critérios definidos, sua principal ocupação é credenciar e monitorar os certificadores.

Fontes: PRÓ-NATURA / IIED / GTZ (Peter Herman May, Fernando César da Veiga Neto, António Cláudio Horta Barbosa, Prof. Hugo Amorim) e FSC. Setembro/2003