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REVISTA DA MADEIRA - EDIÇÃO N°75 - AGOSTO DE 2003

Silvicultura

Influência dos tratamentos silviculturais na qualidade da madeira

De um modo geral, pode-se melhorar, modificar, controlar ou minimizar os fatores que afetam a qualidade da madeira por meio de tratos silviculturais. Os tratamentos silviculturais mais empregados na cultura de Eucalyptus, no Brasil, com o intuito de alterar a qualidade da madeira são o espaçamento, fertilização, controle de pragas e plantas invasoras, desbastes e podas.

As alterações nas condições de crescimento devido à aplicação de fertilizantes ou qualquer outro tratamento silvicultural são freqüentemente associadas a alterações na qualidade da madeira. A aplicação de fertilizantes em povoamentos florestais pode acarretar alterações na densidade da madeira e, consequentemente, nas propriedades físico-mecânicas. A adubação pode alterar a estrutura anatômica da madeira e a constituição química da parede celular. Não se encontraram respostas para a densidade da madeira de Eucalyptus grandis, aos seis anos de idade, em decorrência da aplicação de fertilizantes, mesmo quando foram considerados os materiais lenhosos formados em distintas fases de desenvolvimento das plantas.

Povoamentos de Eucalyptus grandis e Eucalyptus saligna, com espaçamentos de 3,0 x 1,5 e 3,0 x 2,0 m, no estado de São Paulo, já se encontravam em estado de estagnação a partir dos sete anos de idade. Um menor número de plantas por hectare pode levar à formação de ramos com maiores diâmetros, redução da desrama natural e do volume a ser obtido no primeiro desbaste, além de apresentar a primeira tora para serraria bastante cônica; por outro lado, um maior número de árvores por hectare pode levar à competição entre árvores antes da idade do primeiro desbaste recomendado (4 anos), com diâmetro bastante reduzido das árvores. Se o objetivo do manejo é a obtenção de madeira para serraria e postes, não se recomendam espaçamentos menores que 3,0 x 2,5 m, sugerindo densidades entre 2.000 a 1.200 plantas por hectare.

Em experimento com clones híbridos de E. grandis x E. tereticornis, com nove anos de idade, plantados em espaçamentos variados, verificou-se que o espaçamento altera a proporção de madeira juvenil.. Estudando-se a influência do espaçamento na qualidade e na produção em peso da madeira de Eucalyptus grandis e E. urophylla, verificou-se que o espaçamento não afetou significativamente a densidade e o peso da madeira. A definição de um dado espaçamento tem um efeito muito forte tanto no crescimento como na formação da madeira, em função da intensa competição por nutrientes, água e luminosidade. A variação na densidade é fortemente afetada pelo grau de supressão, tendo um efeito inverso bastante pronunciado na uniformidade da madeira. As árvores que crescem em espaçamento bastante fechado apresentam um aumento na densidade muito rápido da madeira à medida que se afasta da medula e as árvores que crescem em espaçamento mais aberto apresentam um padrão de densidade mais uniforme, bem como apresentam uma maior proporção de madeira madura, atingindo valores de densidade maiores numa idade mais precoce.



Desbastes

A produção tradicional de madeira de eucalipto no Brasil tem-se utilizado do sistema de corte aos 6ou 8 anos, seguido da condução de rebrota, por mais uma ou duas rotações.. O principal mercado dessa madeira são as empresas que a transformam em celulose e papel, chapas e carvão vegetal para uso siderúrgico. Produzida em alta escala para atender à demanda acelerada desse parque industrial, quase não houve espaço para o desenvolvimento de florestas de eucalipto que visassem à produção de madeiras para serraria e laminação. Este uso difere bastante daquela produção para a indústria de transformação em móveis, pisos, peças estruturais, assoalhos, painéis etc. pelo fato básico de que a madeira é utilizada na sua forma integral, preservando as suas características de aparência e versatilidade.

Os desbastes são cortes parciais feitos em povoamentos imaturos, com o objetivo de estimular o crescimento das árvores remanescentes e aumentar a produção de madeira de melhor qualidade. Entende-se como melhor qualidade árvores de maiores dimensões, possibilitando a utilização em produtos sólidos, como serraria e laminação. As coníferas são mais frugais que as folhosas ou as espécies de rápido crescimento do gênero Eucalyptus. Com isso, a capacidade de suporte do sítio é maior para as coníferas em termos de área basal. O eucalipto é mais influenciado pelo micro-sítio, havendo uma grande interação com o material genético, principalmente oriundo de sementes. Os desbastes tendem a acentuar essa interação genótipo-ambiente, quando são realizados apenas com base no vigor das árvores. Há indícios de que se pode aumentar a capacidade de produção de madeira de uma área de florestas com Eucalyptus, através do desbaste. A reação da árvore é transferir a energia produzida para o crescimento, adaptando-a à nova situação ambiental. Com isso, o crescimento inicial logo após o desbaste é lento. Os desbastes, portanto, devem ser pouco intensos e mais freqüentes, levando-se em conta que a intensidade e a freqüência devem ser economicamente viáveis.

A nível mundial, as melhores experiências com o manejo de eucalipto para serraria aconteceram na África do Sul, acumulando uma experiência de mais de setenta anos no manejo das florestas. Resultados conclusivos com várias espécies evidenciam que uma maior produção volumétrica e madeira de melhor qualidade ocorrem na condução da rotação de média duração, entre 14 e 15 anos. Idades menores não exploram todo o potencial produtivo da floresta e a qualidade da madeira não é satisfatória, ao passo que além dos 30 anos, começam a surgir sérios problemas que prejudicam a madeira, como defeitos e tensões internas, além da perda de lucratividade pelo tempo demasiado de ocupação da terra.. Para Eucalyptus regnans, um desbaste de 1200 para 150 árvores por hectare, aos sete anos de idade, não ocasionou nenhuma vantagem no crescimento, pelo menos 2,5 anos após a intervenção. O motivo é que a redução de 88% afetou a performance das árvores. Um desbaste para 35o árvores/há, porém, promoveu significativo aumento no crescimento das árvores remanescentes.

Trabalhos realizados por vários pesquisadores, com Eucalyptus grandis, na África do Sul, demonstraram que os desbastes resultaram numa madeira com maior densidade e menor variação no sentido medula-casca, quando comparado com plantios sem desbastes. Num regime de desbastes para o Eucalyptus grandis, plantado num espaçamento de 3,0 x 2,0 m, no Rio Grande do Sul, previram-se desbastes aos 4, 8 e 15 anos, reduzindo-se a lotação para 950, 475 e 238 árvores por hectare, com um corte raso aos 21 anos. A produção prevista de madeira para o final do ciclo foi de 540 m3/ ha, sendo 275 m3 para serraria, 130 m3 para laminação e 135 m3 / ha para outros usos. Alguns pesquisadores verificaram que as florestas de eucaliptos na África do Sul com desbastes menos intensos reduziam a formação de madeira juvenil, mas também reduziam o crescimento das árvores; por outro lado, os desbastes mais cedo e mais pesados produziam madeiras com maiores tensões de crescimento. Desbastes mais cedo e mais pesados em Eucalyptus grandis irão estimular o crescimento em diâmetro; no entanto, a madeira produzida durante os 15 primeiros anos será de qualidade inferior, com elevada tensão de crescimento, independente do espaçamento em que as árvores estejam crescendo. Para aumentar a proporção de madeira de qualidade, o primeiro desbaste deve ser leve, preferencialmente quando a madeira tiver diâmetro mínimo para utilização. Recomenda-se o seguinte manejo para o Eucalyptus grandis: plantio inicial de 1330 árvores/há, baixando para 990 plantas/ha entre 6 e 7 anos; baixar em seguida para 74o plantas entre 9 e 10 anos; para 490 plantas entre 12 e 13 anos; para 250 plantas entre 15 e 16 anos; para 150 plantas entre 18 e 20 anos; para 100 plantas entre 20 e 22 anos e corte raso aos 30 anos.

Os desbastes podem prejudicar as árvores remanescentes em qualquer idade pela ação do vento ; porém, para desbastes de mesma intensidade, plantios mais jovens são menos afetados. Os desbastes em Eucalyptus devem ser drásticos, precoces e por baixo. O primeiro desbaste deve ser cedo e pesado para eliminar árvores dominadas e defeituosas. Os desbastes intermediários acima de 12 anos devem ser mais leves que o primeiro desbaste para impedir o aparecimento de ramos laterais, o que ocasionaria o aparecimento de grande quantidade de material de baixa qualidade. As bases para condução dos eucaliptos através de desbastes devem apresentar os seguintes aspectos: a) desbastes moderados e freqüentes são preferíveis aos fortes e espaçados, devendo a área por árvore aumentar mais rapidamente na fase juvenil, pois as respostas serão muito melhores do que no estado adulto; b) desbastes precoces ou exagerados são inconvenientes por prejudicarem a formação da copa, estimularem brotações laterais indesejáveis e sujeitarem as árvores delgadas à ação danosa dos ventos, sem permitir adaptação gradativa; c) espaçamentos iniciais mais amplos não substituem os desbastes sucessivos, pois a forma das árvores vai piorar, o volume total será menor e os defeitos da madeira serão mais acentuados e irremediáveis.

Atualmente, um dos métodos mais aplicados com sucesso em todo o mundo é o CCT( Tendências das Curvas de Crescimento Correlacionadas), que permite definir, com relativa precisão, a freqüência e a intensidade dos desbastes. Através de parcelas experimentais de acompanhamento, onde são feitas comparações de desbastes e cujos resultados são extrapolados para todo o povoamento. O princípio básico é evitar que o povoamento entre em competição, permitindo que as árvores cresçam livremente, em ritmo acelerado, resultando em madeira mais homogênea e mais estável, além de maiores volumes finais.

Algumas empresas florestais brasileiras voltadas para a produção de madeira para os tais usos tradicionais atualmente estão vislumbrando a possibilidade de se produzir madeira de maiores dimensões, objetivando a agregação de maior valor à matéria-prima. O método de “exploração com remanescentes” consiste em se selecionar as melhores árvores( 50 a 200) árvores por hectare e não derrubá-las por ocasião do primeiro corte, aos 7 anos; tais árvores são novamente poupadas no corte da rebrota, aos 14 anos, sendo estas árvores remanescentes retiradas somente após o terceiro corte da brotação, por volta dos 21 a 23 anos. A viabilidade desse método é comprovada pela obtenção simultânea de madeira para os usos tradicionais (rebrota) e a obtenção de 50 a 200 árvores de excelente qualidade para serraria e laminação. Alguns autores, no entanto, afirmam que os solos pobres e arenosos não respondem a este tipo de manejo, ficando restrito apenas aos solos de maior fertilidade; além disso, afirmam que a brotação anula os efeitos do desbaste, após o 2o ou 3o anos, entrando a floresta em grande competição novamente, após esse período; garantem eles que os benefícios esperados para as árvores remanescentes somente ocorreriam com a eliminação da rebrota.

Desrama

A desrama ou poda consiste na eliminação dos ramos laterais do tronco da árvore, com o objetivo de produção de madeira livre de nós. Embora muitas espécies de Eucalyptus apresentem desrama natural, a permanência dos ramos secos nas idades jovens ou a retirada dos mesmos ocasionam problemas de nós na madeira e a formação de bolsas de resina. Tanto a presença de nós como a bolsa de resina diminuem a resistência física das peças de madeira e prejudicam a aparência. A poda nas plantações industriais de eucalipto melhora a qualidade da madeira, livrando-a dos nós e diminuindo a conicidade do tronco. A desrama deve ser realizada logo após o fechamento da copa e a uma altura mínima de de 2 metros com as seguintes vantagens: a) permitir o acesso ao talhão para acesso ao talhão para inspeção e marcação do desbaste; b) reduzir o risco de incêndios, diminuindo a chance do fogo atingir a copa das árvores; c) facilitar o corta das árvores nas operações de desbaste e d) produzir madeira livre de nós na base da árvore, onde se concentra a tora de maior diâmetro. A poda pode ser feita em todo o talhão ou em algumas árvores seletivamente. Em geral, a poda é feita nos primeiros anos do plantio de eucalipto e, como ainda na fase jovem não há como selecionar os melhores fenótipos, recomenda-se a poda em todas as árvores.

A definição da freqüência e a intensidade da desrama deve seguir algumas premissas básicas: a) A desrama é uma operação de altos custos e deve estar acompanhada ou seguida de desbastes, pois são atividades complementares, quando se busca a qualidade da madeira; b) as desramas devem ser verdes e realizadas o mais cedo possível; c) no caso de plantações de eucalipto, a desrama segue o ritmo de crescimento do povoamento e, não necessariamente, a sua idade, que pode variar de 1,5 a 3 anos; d) a primeira desrama é feita até 2 ou 3 metros de altura, o que corresponde a cerca de 50% da copa; e) a intensidade da desrama pode envolver até 2/3 da copa, o que não compromete o crescimento das árvores e pode até estimular o crescimento; f) a desrama não deve ultrapassar os 6,5 metros de altura; g) as operações de desrama devem ser feitas na primavera, a fim de promover a rápida cicatrização das feridas.Após analisar os efeitos de poda e desbaste em Eucalyptus, alguns pesquisadores recomendam a poda somente nas melhores árvores, aos dois anos de idade, até a altura máxima de 4 a 5 metros. Acima desta altura, a desrama natural é efetiva e não ocasiona a formação de nós mortos. A primeira desrama para Eucalyptus grandis deve ser feita até a altura de 2,20m, quando a planta estiver com 2 anos de idade e nova desrama, apenas nas melhores árvores, até a altura de 6,0 m, quando a planta estiver com 4 anos, por ocasião do primeiro desbaste.

O Departamento Florestal da África do Sul toma como referência a altura média do povoamento e não a idade para se realizar a poda. Tais podas devem ocorrer até 3,0, 5,0 e 7,5m quando as árvores tiverem, no mínimo, 6,6 , 9,0 e 13,5m de altura , respectivamente. Alguns pesquisadores, estudando a distribuição da podridão causada por podas e tensão de crescimento, em Eucalyptus regnans na Nova Zelândia, verificaram que, quando as podas são freqüentes, os diâmetros dos galhos são menores, diminuindo o tempo de cicatrização; consequentemente, o tempo de exposição dos ferimentos à infecção é menor. A madeira livre de nós (clearwood) no mercado internacional é muito valiosa, chegando a valer até 2,25 vezes mais que a madeira com nós.

Este tipo de manejo propicia uma taxa interna de retorno de 10,58%, um custo médio de madeira em pé de US$ 6,81/ m3 e um custo de exploração de US$ 4,52/ m3. Comparando com o sistema tradicionalmente usado para a produção de madeira para processo em 3 cortes, tem-se 300m3/há aos 7 anos, 245m3/ha aos 14 anos e 161m3/ha aos 21 anos, apresentando uma taxa interna de retorno de 18,74%, um custo médio da madeira em pé de US $4,44/m3 e um custo de exploração de US$ 4,21/ m3. Do ponto de vista econômico, para que as taxas de retorno do manejo com desbastes sucessivos se igualem à taxa de retorno com corte raso é necessário que o preço da madeira de serraria seja acrescido de 230%, o que é facilmente obtido nas condições atuais de mercado. A execução de desbastes sucessivos em Eucalyptus grandis se mostra como opção mais adequada à produção de madeira para serraria do que o antigo sistema de corte seletivo, onde se mantinham as árvores remanescentes.



Prof. José de Castro Silva Departamento de Engenharia Florestal- UFVAgosto/2003