MENU
Biomassa
Construção Civil
Editorial
Integração
M&T
Madeira Tropical
Mudas
Paricá
Pellets
RM_Digital
Sementes
Transporte
E mais...
Anunciantes
 
 
 

REVISTA DA MADEIRA - EDIÇÃO N°137 - OUTUBRO DE 2013

M&T

Qualidade dos Painéis Colados de Eucalipto para produção de móveis

O uso da madeira pelo homem iniciou-se nos tempos da antiguidade, representando evoluções no seu cotidiano de acordo com suas diversas necessidades. A madeira constitui um precioso material cujas propriedades tecnológicas podem contribuir a favor da qualidade de seus produtos. Seja para a construção civil ou outros propósitos, a madeira proporciona conforto, praticidade e boa trabalhabilidade, características hoje muito requisitadas pelos consumidores.

Além dos aspectos estéticos favoráveis à confecção de móveis, a madeira é matéria-prima para diversos produtos, como celulose, carvão, lenha, construção civil, entre outros. Na construção civil e na fabricação de móveis a madeira é utilizada tanto na forma sólida quanto como reconstituída. Portanto, mesmo na presença de materiais substitutos, o mercado mantém condições favoráveis à comercialização da madeira e seus produtos

A área de tecnologia da madeira e as atividades relacionadas à produção florestal vêm há alguns anos, buscando um equilíbrio que otimize os benefícios extraídos da matéria-prima madeira e seus derivados.

O levantamento de informações que possibilitem o aprimoramento técnico, e o desenvolvimento de novas tecnologias, que reduzam custos e utilizem de melhor forma os plantios comerciais das espécies madeireiras, devem ser práticas contínuas, incentivadas por empresas e instituições de pesquisa.

O papel do Brasil no cenário mundial como produtor madeireiro e pólo de pesquisa florestal vêm sendo concretizados há alguns anos. Projetos pioneiros no sentido da diversificação do uso final da madeira vêem sendo desenvolvidos em várias empresas, em todo País. Essas práticas se devem ao fato de que, muitas vezes, as condições econômico-financeiras prevalecentes na época da intervenção na floresta forçam a busca de mercados intermediários e usos alternativos para a madeira.

A utilização da madeira de reflorestamento, principalmente a de eucalipto, vem crescendo devido ao melhor conhecimento de suas propriedades, maior divulgação e à crescente preocupação com a preservação das florestas nativas. Além disso, essas madeiras possuem preço competitivo, comparado às madeiras nativas .

Através da realização em escala piloto de todo o processo produtivo, desde a coleta da madeira no campo, passando pelas etapas de desdobro, secagem, resserragem, produção dos painéis, avaliações qualitativas e obtenção do produto final, um estudo teve como objetivo principal, verificar a qualidade da madeira e dos painéis colados lateralmente obtidos, da espécie Eucalyptus saligna, na geração de matéria-prima para o segmento moveleiro.

O projeto procurou gerar resultados que colaborem com outras áreas de estudo ligadas ao material madeira, buscando soluções e melhorias para correção de problemas relacionados à utilização desta matéria-prima, sendo assim, o trabalho teve ainda os seguintes objetivos específicos:

− Determinar e avaliar o rendimento em madeira serrada após o desdobro das toras;

− Avaliar a metodologia para a secagem de madeira serrada de Eucalyptus saligna na câmara de secagem automatizada

− Avaliar defeitos da madeira após secagem;

− Produzir painéis colados lateralmente (PCLs) a partir da madeira serrada obtida e determinar o rendimento (%) desta transformação;

− Avaliar os painéis através de ensaios físico-mecânicos

− Produzir um móvel piloto a partir dos PCLs

Após a determinação do rendimento na condição verde, a madeira serrada foi empilhada e levada para secagem artificial em câmara de secagem automatizada .

Em virtude dos problemas de secagem inerentes às espécies do gênero Eucalyptus sp, na secagem artificial foi utilizado um programa considerado suave, com temperaturas de bulbo seco variando de 40ºC a 65ºC conforme o decréscimo da umidade da madeira. Devido ao período de três semanas, pelo qual a madeira ficou empilhada ao ar livre e passou por uma pré-secagem até um teor médio de umidade por volta de 35%, o tempo de secagem artificial previsto foi de 80 horas, até uma umidade final pretendida de 12%.

Secagem

Após a secagem das tábuas, primeiramente, foram novamente realizadas as determinações das dimensões comprimento (m), espessura média (m) e largura média (m) de cada uma das tábuas, que possibilitaram a determinação da perda volumétrica em função da retratibilidade da madeira e do rendimento do processo de desdobro na condição seca.

A partir de então foram quantificados, em cada tábua, os índices de defeitos quanto à presença de rachaduras nas extremidades; a presença de rachaduras superficiais; os tipos de empenamentos: encurvamento, arqueamento, encanoamento, torcimento e encurvamento complexo; a incidência de colapso e a quantidade de nós (soltos ou vivos) na madeira em função do comprimento linear de cada peça.

Produção de painéis

As tábuas utilizadas na produção dos painéis foram coletadas aleatoriamente entre todas as tábuas produzidas no desdobro, na etapa anterior. Na produção dos painéis colados lateralmente, foram descartadas as porções das tábuas que apresentavam defeitos severos, como as rachaduras nas extremidades ou rachaduras superficiais e os nós soltos. Para eliminação dos empenamentos as tábuas foram submetidas a uma redução em sua espessura na plaina desempenadeira.

Estas operações de retificação das peças, por si só, geraram peças menores e isentas de defeitos. Esse conceito de qualificação das peças, ou “limpeza” da madeira serrada, embora cause uma redução no volume das tábuas, transformando-as em peças menores ou sarrafos, visa valorizar o produto final, transformando a madeira serrada bruta em peças limpas ou “clear-blocks”, conceito aplicado na madeira nacional que vem sendo exportada.

O painel colado lateralmente foi formado então, pela junção destas peças menores resultantes da retirada dos defeitos da madeira e das imperfeições geradas em seu processamento e secagem, visando a obtenção de um produto (painel) de maior qualidade e homogeneidade.

A matéria-prima para a produção dos painéis, peças menores “limpas”, ou isentas de defeitos, ou ainda sarrafos, foram padronizadas em relação à largura em 5cm.

Nas emendas e nas laterais dos sarrafos foi aplicado adesivo à base de PVA, especial para colagem de madeira, comumente utilizado na indústria moveleira. A gramatura estimada foi de aproximadamente 200g/m2. A colagem lateral dos sarrafos foi feita pelo contato direto das superfícies retas (sem “finger-joint”).

Após a aplicação do adesivo os sarrafos foram prensados. Cada painel foi mantido prensado por, no mínimo, 48 horas.

As propriedades de resistência dos PCLs produzidos foram determinadas através de ensaios de cisalhamento e tração, adaptados ao material, seguindo procedimentos normativos do documento ABNT NBR 7190:1997; e ensaios de flexão orientados pelo documento normativo ASTM D-1037 (norma americana).

Aplicação dos painéis

Como forma de avaliar e discutir a aplicação do PCL de eucalipto produzido ao longo do trabalho, foi proposto a confecção de um móvel piloto gerado a partir de parte do material da pesquisa.

Com uma concepção simples, porém agregando valor devido ao design utilizado, o projeto do móvel procurou aliar a praticidade e a resistência do PCL de eucalipto, gerando um produto onde pudessem ser observados os principais conceitos abordados, o da colagem de pequenas peças de madeira, o aproveitamento de madeira de rápido crescimento, a valorização da madeira de eucalipto e a resistência de um material colado à base de madeira.

O valor médio de 21,96% de rachamento na condição seca indica grande porção da madeira de Eucalyptus saligna Smith com aproveitamento comprometido. Para a confecção de peças menores, como ripas e sarrafos de pequena largura, ainda parte da porção rachada das tábuas é utilizada, porém para usos onde as tábuas não serão necessariamente reduzidas, é necessária a operação de destopo com perda significativa do volume de madeira.

Os empenamentos das tábuas podem ocorrer logo após o desdobro, novamente devido às tensões de crescimento liberadas neste momento, como também podem aparecer ou diminuir ao longo da secagem. A secagem ao ar livre é a de menor impacto nos defeitos de empenamentos nas tábuas, pois é feita de modo mais lento e de forma menos drástica. A secagem artificial, realizada em câmaras, ou estufas de secagem, acelera o processo de perda de umidade, aumentando a eficiência e reduzindo tempo desta etapa, porém, é esperado que maiores problema quanto a distorções nas peças e índices de rachaduras sejam encontrados.

O encurvamento não inviabiliza a utilização da madeira nas proporções obtidas no trabalho, média de 3,92 mm/m. Para a utilização em movelaria, por exemplo, tanto o aplainamento das peças como as pregações podem eliminar o encurvamento das tábuas, ripas ou sarrafos.

O arqueamento é um defeito considerado mais problemático, prejudicando, por exemplo, a confecção de painéis colados lateralmente. O arqueamento não se mostrou acentuado nas tábuas produzidas (3,56 mm/m).

O encanoamento corresponde a um defeito que pode ser eliminado no aplainamento, mas que reduz com isso a espessura das peças produzidas. Em função da largura das tábuas produzidas ser pequena o encanoamento observado se mostrou relativamente baixo, média de 1,62 mm na condição seca. Porém, todas as tábuas de eucalipto apresentaram tal defeito após a secagem.

Em apenas uma das tábuas foi verificado o torcimento, e o encurvamento complexo não foi encontrado em nenhuma das peças.

Problemas de colapso são também comuns na secagem artificial do eucalipto. Nas tábuas obtidas observou-se apenas 1,15% de colapso severo, com distorção grave de parte da madeira. A maioria das tábuas não apresentou colapso (71,26%) ou o defeito foi observado em nível leve (19,54%), não comprometendo a utilização da peça.

Quanto ao número de nós por metro linear de madeira serrada, os valores encontrados para a presença de nós soltos e vivos, 0,02 e 0,46 nós/m sucessivamente, foram abaixo dos valores descritos por Carvalho (2000) , que encontrou para a madeira de eucalipto jovem 0,70 nós vivos/m e 0,90 nós soltos/m.

Confecção do Móvel

Foram utilizados no protótipo os painéis que apresentaram os melhores resultados na avaliação qualitativa de resistência mecânica, ou seja, os PCLs com dupla camada de sarrafos. A poltrona confeccionada apresenta basicamente quatro partes constituintes, duas laterais, um encosto e um assento.

O projeto procurou evidenciar a utilização dos painéis colados lateralmente de eucalipto, proporcionando a visualização prática e interativa do potencial do material na confecção de um produto final - móvel. O painel possui características estruturais e o seu recorte gera inúmeras possibilidades de desenhos e designs.

No acabamento foi utilizado um verniz fosco para impermeabilização, que não alterou a coloração natural da madeira.

Nas ligações entre as partes constituintes foram utilizadas peças metálicas e parafusos, sem entretanto agredir a aparência de um móvel de madeira. No assento e encosto foram colocadas almofadas de espuma recobertas com couro sintético.

Pelos resultados obtidos no presente trabalho foram possíveis as seguintes conclusões:

Os PCLs de eucalipto avaliados sugerem que este tipo de painel tem potencial para produção industrial e para utilização na indústria moveleira;

Os rendimentos no desdobro de toras da madeira de Eucalytus saligna Smith poderiam ser melhorados com adaptações no equipamento, tais adaptações devem ser estudadas para que as espécies de eucalipto aumentem a sua participação no mercado da madeira serrada;

A madeira estudada apresentou significativos índices de defeitos, principalmente rachaduras, confirmando o comportamento da espécie ao longo da secagem. Devem ser estudados programas de secagem específicos para as diferentes espécies de eucalipto, para que os índices de perda de madeira na conversão para produtos serrados seja cada vez mais proveitosa;

Devido aos índices de defeitos a conversão da madeira serrada em sarrafos “limpos” e, posteriormente, em PCLs apresentou uma elevada perda de material; esta perda deve ser compensada pela valorização qualitativa do produto PCL, que apresenta grande potencial de mercado, inclusive para exportação, já que o Brasil é um grande produtor da matéria-prima eucalipto;

As emendas do tipo “finger-joint” utilizadas em parte dos tratamentos da produção dos painéis, agregaram significativas melhorias na qualidade da colagem e nas variáveis de resistência avaliadas;

Os painéis duplos, com duas camadas de sarrafos apresentaram resultados superiores aos de camada simples, indicando uma boa estratégia para melhoria da qualidade dos painéis colados lateralmente;

Os documentos normativos ABNT NBR 7190-1997 e ASTM D-1037 se mostraram eficientes na avaliação da resistência dos painéis produzidos e estudados neste estudo. Com isso confirma-se que foi bastante satisfatório o processo e o produto final obtido na confecção do protótipo de móvel - poltrona de PCLs de eucalipto.

Autor: Kelysson de Freitas Amparado