Definições precisas de termos e de especificações de dimensões e qualidade são reconhecidas internacionalmente como uma das exigências básicas para o desenvolvimento racional do comércio de madeiras. No Brasil, a classificação de madeira serrada foi praticada em larga escala somente com o pinho-do-paraná, destinado aos mercados domésticos e internacionais. Atualmente, a despeito da existência de normas para pinus e para madeiras de folhosas (angiospermas-dicotiledôneas), registradas na ABNT, a classificação só é praticada na madeira destinada à exportação para os países desenvolvidos.
No mercado nacional a madeira é vendida de forma não selecionada, a chamada “bica corrida”, ou então, segundo classificações genéricas como “primeira”, “extra” etc., que freqüentemente são motivos de discordância entre compradores e vendedores.
A ausência de padronização é uma das queixas freqüentes do setor de construção civil, sendo, portanto, necessário tomar medidas efetivas para resolução desse problema. Dentre estas, apontam-se: a revisão das normas e especificações disponíveis, sob a perspectiva do desempenho do material/produto no uso pretendido, divulgação das normas junto aos setores de produção, comércio e utilização de madeira serrada e treinamento de classificadores e de inspetores,
Algumas recomendações são apresentadas para se especificar e inspecionar madeiras serradas, para obter um bom desempenho da madeira em determinado uso. As características a serem observadas dizem respeito a:
• espécies de madeira;
• dimensões;
• teor de umidade;
• defeitos naturais e de processamento.
Escolhida a madeira para um certo uso, conforme já apresentado em capítulos anteriores, recomenda-se especificá-la por seu nome popular ou comercial associado ao nome científico. Tal procedimento evitará as frequentes confusões que existem no comércio devido a variabilidade dos nomes populares.
Na inspeção de recebimento a madeira deve ser identificada pela anatomia da madeira ou enviada a um laboratório especializado. Tal medida é recomendada em virtude da grande variabilidade de madeiras que existem no mercado, cujas características sensoriais (cor e densidade, principalmente) são semelhantes, porém com propriedades mecânicas e de durabilidade natural distintas.
Em pesquisa realizada na cidade de São Paulo, verificou-se que a maior parte dos distribuidores de madeira e construtoras afirma que trabalha com medidas padronizadas. No entanto, os entrevistados não mencionam que normas ou especificações são adotadas. Em geral afirmam que são dimensões comerciais. Também é comum associar o nome das peças com suas dimensões nominais (espessura x largura). Entretanto, há uma confusão em relação aos nomes das peças, como por exemplo, caibros com pontaletes, tábuas estreitas e sarrafos.
É interessante constar que embora existam textos da ABNT especificando dimensões e nomes das peças, esses são ignorados pelo setores de produção e comércio de madeira serrada e beneficiada.
As normas disponíveis são:
• NBR 7203 - Madeira serrada e beneficiada;
• NBR 9480 - Classificação de madeira serrada de folhosas;
• NBR 12498 - Madeira serrada de coníferas provenientes de reflorestamento, para usos geral: dimensões e lotes.
Outro aspecto importante é o desperdício provocado pela especificação de peças com dimensões inadequadas. Portanto, os projetistas devem ser orientados a especificar dimensões, principalmente comprimento e largura, o mais próximo possível das dimensões de uso.
Considerando as normas disponíveis e para evitar conflitos na inspeção de recebimento, recomenda-se especificar em projetos/pedidos de compra o seguinte:
• nome da peça (viga, caibro, ripa etc.) e respectiva seção transversal ou bitola (em mm). Ao especificar dimensões para peças aparelhadas, o usuário deve considerar que a prática comercial é se referir aos valores nominais da madeira serrada em bruto;
• mencionar as tolerâncias positivas e negativas admitidas (variável em função do grau de processamento das peças); e
• citar o teor de umidade de referência.
Teor de umidade
Várias propriedades da madeira são afetadas pelo teor de umidade das peças. Considera- -se a madeira seca quando o seu teor de umidade está em equilíbrio com a umidade relativa do ambiente onde a madeira será utilizada. Nesta situação, as propriedades mecânicas são superiores e a movimentação dimensional é menor do que quando a madeira está verde, ou seja, quando o teor de umidade esteja acima do ponto de saturação das fibras, ao redor de 30%.
A despeito disso, o comércio de madeira serrada para fins estruturais não leva em consideração essa característica e as peças de madeira acabam secando no depósito do comprador ou, o que é mais frequente, em uso. Tal prática pode resultar em empenamentos e rachamentos das peças após a realização da inspeção de recebimento.
Devido aos custos envolvidos na secagem de peças de madeira de bitolas avantajadas (vigas e pranchas) e à prática comercial arraigada, prevê-se que no médio prazo esse tipo de material não estará disponível no mercado.
O mesmo não acontece com a madeira destinada aos usos em que a estabilidade dimensional é um requisito importante. Já não é difícil adquirir madeira para pisos, esquadrias e revestimentos, com teor de umidade adequado. No comércio, esse material é referido como madeira seca em estufa ou “madeira estufada”.
A despeito disso, no mercado não se especifica o teor de umidade médio, nem os valores máximo e mínimo recomendados para o local de aplicação das peças, o que pode resultar em mau desempenho das mesmas.
Outro cuidado a ser tomado refere-se à verificação do teor de umidade das peças do lote na inspeção de recebimento. É freqüente a má utilização dos medidores elétricos, em geral, relacionada ao uso de aparelhos não calibrados, posicionamento dos eletrodos em partes não representativas da peça e erro de leitura em função da escala empregada, que varia com a espécie de madeira.
No tocante ao teor de umidade, recomenda-se:
• especificar o teor de umidade médio e os valores mínimo e máximo, considerando o local de uso da madeira;
• verificar o teor de umidade das peças do lote, por amostragem, empregando medidores elétricos (ensaio não destrutivo) de acordo com as instruções do fabricante, ou pelo método de perda de massa em estufa (ensaio destrutivo). Este último, apesar de ser mais preciso, requer equipamentos de laboratório e é bem mais demorado. Defeitos
A presença de defeitos naturais (nós e bolsas de resina, p. ex.) ou de processamento (empenamentos e rachas de secagem, p. ex.) afeta a qualidade e desempenho das peças de madeira serrada.
Para adequar a qualidade das peças às necessidades dos consumidores, existem normas de classificação que distribuem as peças produzidas em classes de qualidade. Essa distribuição pode ser realizada de acordo com dois sistemas básicos de classificação, conforme segue:
Classificação por defeitos: este sistema, que também é conhecido como classificação por aparência, é empregado largamente em madeiras de coníferas e em madeiras de folhosas (angiospermas-dicotiledôneas) classificadas para mercados especiais.
A classificação por defeitos pressupõe que a peça de madeira será utilizada nas dimensões originais, portanto não sujeita a ser recortada em outras dimensões correspondentes àquelas requeridas pelo uso final. Nesse sistema é considerado o número, a importância e a distribuição dos defeitos que apareçam em uma ou ambas as faces da peça serrada.
No Brasil, esse sistema é empregado na norma de classificação para a madeira serrada de pinho (“Manual prático de normas reguladoras de qualidade das madeiras de pinho no mercado nacional”, da ABPM), na NBR 11700 “Madeira serrada de coníferas provenientes de reflorestamento para uso geral” e na norma que está sendo elaborada pela ABNT para classificação de madeira serrada de eucalipto.
Classificação por uso final proposto: este sistema engloba dois subgrupos de classificação de acordo com o uso final da madeira: classificação para uso em estruturas, onde as propriedades mecânicas são decisivas e classificações específicas, onde as peças são fornecidas em dimensões exatas para usos bem definidos.
A classificação para uso em estrutura pode ser feita pelo método visual ou pelo método mecânico. No primeiro caso, a classificação está baseada no fato que os defeitos afetam a resistência e a rigidez das peças de madeira. As regras de classificação especificam tolerâncias para os tipos de defeitos, seu tamanho, quantidade e posição, que devem ser comparados visualmente pelo classificador, peça por peça. Este tipo de classificação é empregado pela NBR 7190 “Projeto de Estruturas de Madeira”.
Já na classificação mecânica, realizada automaticamente em máquinas informatizadas, o princípio de classificação baseia-se na estreita correlação entre o módulo de ruptura na flexão e o módulo de elasticidade. Este sistema apresenta maior confiabilidade que o sistema visual e também alta produtividade. Embora ainda não disponível no Brasil, será incluído na NBR 7190.
Apesar da série de vantagens de caráter industrial e comercial da padronização de medidas e de qualidade da madeira serrada, que beneficiam tanto os produtores quanto os consumidores, no Brasil as peças de madeira empregadas na construção civil são especificadas/ comercializadas em dois extremos:
• madeira não selecionada (bica corrida) que compreende todo o produto da tora exceto as peças inaproveitáveis. Esse sistema prejudica o produtor, pois peças sem defeito e que às vezes são utilizadas, em uso que poderia aceitar alguns defeitos, são comercializadas pelo mesmo preço de uma peça com defeitos;
• madeira de primeira qualidade em que as peças praticamente são isentas de defeitos. Neste caso, pedaços significativos de madeira são desprezados na serraria, constituindo um sério problema de descarte e um evidente desperdício do recurso florestal. Por outro lado, o consumidor fica desprotegido pois não há uma definição do que seja madeira de primeira, o que gera dúvidas no momento da inspeção de recebimento. Evidentemente que a situação descrita acima tem exceções. Por exemplo, há empresas produtoras de madeira serrada que ofertam seus produtos classificados em diversas classes de qualidade, como também há construtoras que especificam as madeiras em pelo menos duas classes de qualidade.
Madeira compensada
O compensado é um painel composto de várias camadas de lâminas de madeira de pequena espessura coladas entre si por um adesivo. Cada camada ou lâmina é colocada de forma que a direção das suas fibras forme um ângulo de 90º com a da outra camada adjacente. Geralmente é composto de um número ímpar de lâminas. Ao controlar a espessura e a quantidade dessas lâminas, é possível obter painéis de diferentes espessuras. Porém, painéis de 3, 5 e 7 lâminas são os mais produzidos, cujas espessuras variam de 4 mm a 18 mm.
De acordo com o local de utilização, o compensado pode ser classificado como:
Interior: compensado colado com adesivo do tipo interior, destinado à utilização em locais protegidos da ação d’água ou alta umidade relativa;
Intermediária: compensado colado com adesivo intermediário, destinado à utilização interna mas em ambiente de alta umidade relativa, podendo eventualmente receber a ação d’água;
Exterior: compensado colado com adesivo a prova d’água, destinado ao uso exterior ou em ambientes fechados onde são submetidos a repetidos umedecimentos e secagem ou ação d’água .
O desconhecimento dessa classificação por parte dos usuários ou a sua não verificação no ato do recebimento dos compensados gera um dos principais problemas relatados pelos usuários, ou seja, a delaminação dos painéis. Neste aspecto é importante especificar o tipo de compensado mais adequado ao uso pretendido e verificar, pelo ensaio da resistência da colagem ao esforço de cisalhamento, a qualidade da colagem.
Para os compensados de uso permanente ou para aqueles de uso temporário, porém que se pretende estender sua vida útil, e que serão empregados em usos em que a classe de risco à biodeterioração é alta, é necessário realizar o tratamento preservativo do compensado, visto que as madeiras utilizadas na sua produção são de baixa durabilidade natural.
Os compensados são normatizados pela ABNT e as normas relacionadas a seguir constituem um bom material de apoio na qualificação do produto:
- NBR 9484/86 Compensado - determinação do teor de umidade;
- NBR 9484/86 Compensado – determinação da massa específica;
- NBR 9486/86 Compensado – determinação da absorção de água;
- NBR 9488/86 Compensado – amostragem de compensado para ensaio;
- NBR 9489/86 Compensado – condicionamento de corpos-de-prova de compensado para ensaios; - NBR 9490/86 Lâmina e compensado;
- NBR 9531/86 Chapas de madeira compensada;
- NBR 9532/86 Chapas de madeira compensada;
- NBR 9533/86 Compensado – determinação da resistência à flexão estática;
- NBR 9534/86 Compensado – determinação da resistência da colagem ao esforço de cisalhamento; e
- NBR 9535/86 Compensado – determinação do inchamento.
O usuário de compensados conta também com Programa Nacional de Qualidade da Madeira da Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processada Mecanicamente – ABIMCI, que está certificando empresas produtoras de acordo com requisitos lastreados nas normas ABNT.
Autores: Geraldo José Zenid; Ligia Ferrari Torella di Romagnano; Marcio Augusto Rabelo Nahuz; Maria José de Andrade Casimiro Miranda; Oswaldo Poffo Ferreira; Sérgio Brazolin – IPT - USP |