O desconhecimento de algumas propriedades e características da madeira, tanto por parte da população em geral, como também dos profissionais ligados à construção civil, graduados ou não, tem fomentado o preconceito existente de que a madeira é um material de baixa durabilidade e resistência para ser utilizado como principal matéria prima na produção de componentes construtivos. O preconceito é ainda maior quando se trata de madeira de plantios florestais como o Eucalyptus sp., que carrega o estigma de madeira de baixa qualidade, que empena, racha e apresenta índices de retração e inchamento muito altos, o que tem sido motivo suficiente para vetar o seu emprego em diversas situações.
Os defeitos mais comuns que ocorrem nas peças de madeira serrada e que estão relacionados às propriedades de retração e inchamento são as rachaduras internas e superficiais, os empenamentos e as variações de suas dimensões ao longo do tempo de uso. Os componentes construtivos apresentam frestas, distorções de formas e alterações nas dimensões que comprometem seu desempenho geral, chegando muitas vezes a inviabilizar o uso. Torna-se, portanto, indispensável o estudo dos fatores relacionados à variação dimensional da madeira para melhor compreensão do fenômeno, bem como para definir os procedimentos mais adequados para minimizar seus efeitos na produção de componentes construtivos para a construção civil.
Para o estudo das propriedades de retração e inchamento da madeira as normas panamericana COPANT 462 e brasileira NBR 7190/97, especificam a utilização de corpos-de-prova de geometria cúbica, com dimensões de 5x5x10 cm e 2x3x5cm, respectivamente, fabricados com o lado maior da seção transversal paralelo à direção radial, como mostram as Figura 1a e 1b. Já a norma americana ASTM-D143 especifica para o estudo das retrações radiais e tangenciais a utilização de corpos-de-prova saturados de 2,5x10x2,5 cm, obtidos de pranchas de 2,5x10 cm, orientados conforme as Figura 1c e 1d. Mesmo em peças de pequenas dimensões como estas, não se verificam direções estritamente tangenciais ou radiais que, por não serem paralelas aos lados da seção transversal, sofrem influência da curvatura dos anéis de crescimento. Além disso, a tangente varia ao longo dos anéis de crescimento cuja curvatura diminui no sentido da medula para a casca e, assim, os corpos-de-prova obtidos das regiões mais periféricas da tora apresentam maiores proporções de madeira de direção tangencial do que os obtidos das regiões mais internas. Consequentemente apresentam maiores valores de retração tangencial. Conclui-se então que a retratibilidade ou inchamento determinado de acordo com essas normas é dependente das características geométricas dos corpos-de-prova.
Devido às dimensões das peças comerciais não existem, na prática, retrações e/ou inchamentos puros nas direções radial, tangencial ou longitudinal que são as direções principais de elasticidade. Isso deve-se ao fato de que as peças serradas não apresentam somente esta ou aquela direção, mas sim uma combinação delas nas suas três dimensões. Além disso, o desdobro das toras raramente produz peças essencialmente radiais, tangenciais e/ou longitudinais, sendo mais comum a obtenção de peças orientadas de forma aleatória. Assim, as deformações reais por retração e inchamento nas diferentes direções de corte das peças comerciais corresponderão apenas a uma parcela da deformação pura, além de sofrerem influência das demais direções, bem como dos desvios de grã ao longo da peça.
Em relação às peças compostas como no caso de painéis sarrafeados, também não se verifica a utilização de peças homogêneas, orientadas numa única direção de corte, mas sim uma combinação de peças heterogêneas, serradas nas mais diversas direções, de modo que a deformação total do painel resulta do conjunto das deformações de cada uma das peças as quais estão sujeitas às interferências dos fatores supracitados. Há que se considerar ainda que, na prática, dadas as dimensões das peças comerciais, as deformações por retração e inchamento também nunca ocorrerão na sua totalidade. Considerando que a madeira atinge o equilíbrio com o ambiente partindo da superfície para o interior da peça, ocorre que, durante o processo de retração da madeira as camadas mais superficiais voltam a inchar devido ao aumento de umidade do ambiente, enquanto as camadas mais internas ainda não retraíram totalmente. O mesmo acontece para o processo inverso, ou seja, as camadas mais superficiais podem voltar a retrair, pela perda de umidade para o ambiente, enquanto as mais internas ainda não incharam totalmente.
As alternativas correntes para controlar os efeitos da variação dimensional consequente da variação do teor de umidade da madeira compreendem métodos essencialmente mecânicos, como a superposição de camadas finas orientadas ortogonalmente entre si (chapas compensadas) e métodos químicos impermeabilizantes com a utilização de produtos compostos de resinas naturais ou sintéticas, como tintas, vernizes, seladoras e ceras, além de soluções ou emulsões hidrorepelentes ou hidrofugantes.
As resinas naturais como a nitrocelulósica, por exemplo,, são mono componentes e sua cura se dá pela evaporação do solvente, enquanto que as resinas sintéticas como a poliuretânica (PU) e a poliéster são formadas por dois componentes que reagem entre si, sendo que um deles contém grupos reativos (catalisador). Tratam-se de produtos tóxicos, inflamáveis e insolúveis em água e utilizam como solventes substâncias orgânicas voláteis tóxicas cujo emprego sofre restrições governamentais em vários países.. Produtos menos nocivos à saúde e ambientalmente mais amigáveis tem sido desenvolvidos,, mas não foram encontrados relatos científicos de testes que demonstram sua eficiência quando utilizados como impermeabilizantes parra a madeira. Assim, o objetivo deste trabalho foi estudar a influência de dois adesivos à base de água, não tóxicos, segundo informações dos fabricantes, e que podem ser utilizados também como impermeabilizantes, da orientação dos anéis de crescimento em relação à largura (controlada, aleatória) e do tempo de imersão em água (0,5; 1; 24; 120 e 240h) na absorção e inchamento linear de painéis sarrafeados de Pinus sp.
Material e Método
Foram produzidos 36 modelos de painéis sarrafeados, de (2x16x16)cm, com sarrafos de Pinus sp. de (2x2x16)cmm obtidos ao acaso em lotes existentes no Laboratório de Engenharia e Máquinas para Madeira -LEM e orientados de 2 formas diferentes em relação aos anéis de crescimento visíveis na seção transversal. Em 18 deles os sarrafos foram dispostos ao acaso em relação à orientação da seção transversal (Figura 2a) e nos outros 18 os sarrafos foram dispostos de forma a alternar a face para a qual estava voltada a concavidade dos anéis de crescimento (Figura 2b). A ligação entre eles foi feita por meio do Fundo preparador para placa cimentícia Adespec, que é um composto mono componente à base de elastômeros e do Cascorez que é um adesivo em forma de emulsão aquosa à base de poliacetato de vinila (PVA), homopolímero isento de formaldeído. Esses adesivos também foram utilizados como impermeabilizantes.
Os painéis foram pesados em uma balança digital com precisão de 0,01g antes da aplicação dos impermeabilizantes. Após o tempo mínimo recomendado pelo fabricante para a secagem total do impermeabillizante, foram novamente pesados e tiveram as medidas de suas larguras tomadas em 9 pontos distintos, correspondentes às extremidades superior e inferior e à meia altura, sendo que em cada um desses pontos, foi tomada uma medida em cada face e uma à meia espessura. As avaliações de variação de massa e dimensões foram feitas na primeira meia hora, após 1 hora e depois a cada 244 horas.
A medição da largura foi feita em um aparato , composto por uma base em compensado, com uma guia de madeira em um de seus lados e no lado oposto um relógio comparador digital, com precisão de 0,01mm. Na guia foram marcados 3 pontos correspondentes às extremidades superior e inferior e meia altura dos painéis. O relógio comparador foi posicionado considerando-se a largura média dos painéis (L) menos a metade do passo do cursor (1) do relógio, garantindo-se as possíveis variações a maior ou menor.
Para possibilitar a medição à meia espessura e na face inferior do painel utilizaram-se duas bases móveis que se encaixavam no aparato, sendo uma com 8,0mmm e outra com
Análise
O delineamento estatístico escolhido foi o inteiramente casualizado com 3 repetições e 12 tratamentos para cada instante avaliado. Foi utilizado o teste de Hartley para verificar a homogeneidade de variância e o teste F para análise de variância segundo os esquemas fatoriais 3x3x4 (Posição Longitudinal x Posição Radial x Tempo), para verificar as diferenças entre as variações dimensionais nos pontos medidos nos tratamentos testemunhas, por apresentar as maiores variações e 2x3x2x4 (adesivos x tratamento impermeabilizante x orientação dos sarrafos x tempo de imersão) para verificar as diferenças entre as variações de massa de água absorvida e dimensional entre todos os tratamentos. Foram considerados 4 instantes de medição: 0,5; 1; 24; 120 e 240 horas de imersão em água. Foi aplicado o teste de Tukey, se observadas diferenças significativas no teste F para algum tratamento.
As variações dimensionais ocorridas nos pontos medidos não apresentaram diferenças estatísticas significativas. Nos painéis colados com o adesivo Adespec os pontos situados a meia espessura apresentaram maiores variações dimensionais no primeiro instante de medição, sendo superados por pelo menos uma das extremidades com o decorrer do tempo. O mesmo não ocorreu com os painéis colados com o adesivo Cascorez, em que diferenças entre as variações dimensionais nas extremidades e à meia espessura foram menos acentuadas. Porém, observa-se que em ambos os casos, não se verifica um padrão de respostas, variando de acordo com o tratamento e o tempo de medição, sendo que na maioria dos casos, as variações decresceram da extremidade superior para a inferior. Sabendo-se que a umidade na madeira migra das camadas mais externas para as mais internas, eram esperadas maiores variações dimensionais nas posições mais próximas à superfície. Possivelmente devido às dimensões dos painéis e ao número de intervalos analisados, as diferenças esperadas não foram detectadas, já que com o passar do tempo, as dimensões tendem a igualar-se. Também os defeitos devidos ao processo de inchamento, como um possível abaulamento dos painéis, por exemplo, podem ter sido a causa das variações menores em pelo menos uma das posições mais externas.
Na análise geral, os corpos-de-prova cujos sarrafos foram colados com Cascorez, apresentaram maiores variações dimensionais, o que indica uma provável maior expansão desse adesivo quando em contato com a umidade. Isso não significa que o Adespec tenha tido melhor eficiência como adesivo, já que, no decorrer do ensaio, houve descolamento dos sarrafos em alguns painéis colados com Adespec, não verificado com a Cascorez.
O tempo de imersão teve influência sobre a eficácia do impermeabilizante. No primeiro instante de leitura, embora não tenha havido diferença na variação de massa de água absorvida verificou-se que nas amostras impermeabilizadas com Cascorez a variação dimensional foi menor, indicando uma maior eficácia e resistência às condições extremas de umidade desse experimento. Nos instantes seguintes, o Adespec foi tornando-se mais ineficiente, igualando-se à resposta das testemunhas.
O adesivo Cascorez é mais eficiente como impermeabilizante do que como adesivo. Embora o próprio fabricante apresente o produto como sendo de baixa resistência à umidade, no ensaio realizado, demonstrou ser eficiente, no tempo analisado, no controle da absorção de umidade e, por conseguinte, na variação dimensional da madeira. Embora em outro teste de impermeabilização da madeira de Eucalyptus sp. o Fundo preparador para placa cimentícia Adespec apresentou-se como o impermeabilizante mais eficiente dentre os que foram testados, verificou-se neste trabalho que a aplicação de uma única demão nos painéis, não é suficiente para o bom desempenho do produto.
Também pode-se concluir que o tempo de imersão influencia na eficácia do impermeabilizante, visto que o Adespec apresentou respostas semelhantes à da testemunha para tempos maiores de imersão e que o inchamento é dependente da orientação dos anéis de crescimento na seção transversal dos sarrafos. As variações dimensionais nas posições longitudinais e radiais não apresentam diferenças significativas para os intervalos analisados.
Fonte: Maristela Gava - Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho " -UNESP -Câmpus Experimental de Itapeva; Aline Maria Faria Cerchiari e José Nivaldo Garcia -Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz " -Universidade de São Paulo -ESALQ/USP |