Preservar uma madeira é, em primeira análise, proporcionar o aumento da sua resistência frente aos organismos deterioradores, através de aplicação de preservantes químicos. A seleção adequada de um produto preservante é a primeira condição para conferir um aumento na durabilidade natural da madeira.
Igualmente importante é a seleção do método de aplicação. Produto algum poderá conferir proteção satisfatória à madeira se não for corretamente aplicado. Os critérios de seleção para preservantes e métodos de aplicação exigem, obrigatoriamente, o conhecimento das condições de agressividade biológica que a madeira está sujeita quando empregada além de sua resistência natural e permeabilidade.
Vale ressaltar que através da preservação de madeiras de reflorestamento é possível aumentar significativamente a vida útil das peças de madeiras em serviço. Tal fato contribui diretamente para a conservação ambiental, uma vez que reduz a necessidade de exploração das matas nativas.
Existem vários agentes biológicos responsáveis pela degradação da madeira, entre eles microrganismos, insetos e xilófagos marinhos. Vamos tratar agora dos produtos químicos empregados em sua preservação e que são designados genericamente como preservativos. fizeram uma analogia entre o processo de gênese de um carcinoma – que é uma distorção de um crescimento ou processo reprodutivo natural por meio de um agente químico – e o de apodrecimento da madeira.
Um produto químico para ser utilizado como preservativo de madeira tem de satisfazer uma série de requisitos:
a) Eficiência: É o requisito básico de todo o preservativo. Deve apresentar-se tóxico à gama mais ampla possível de organismos xilófagos. A medida da eficiência é feita, preliminarmente, por meio de ensaios de laboratório e depois por ensaios de campo. Deve ainda, para ser eficiente, permitir penetração profunda e uniforme na madeira. Esta característica está correlacionada com o método de tratamento empregado.
b) Segurança: Deve apresentar toxidez baixa em relação a seres humanos e animais domésticos, além de não aumentar as características de combustibilidade inerentes à madeira Complementando, a solução preservativa não deve ser corrosiva a metais e plásticos com que são confeccionados recipientes e equipamentos, uma vez que em caso afirmativo podem ocorrer vazamentos que podem, por seu turno, dar origem à poluição.
c) Permanência: depende das propriedades físicas e químicas do preservativo e a maneira pela qual se fixa na madeira: para ser resistente à lixiviação deve ser insolúvel em água ou formar complexos insolúveis por meio de reação química com os componentes da parede celular da madeira.
d) Custo: é sem dúvida o fator que viabiliza o uso de um produto que apresente todas as potencialidades anteriormente mencionadas. A madeira tem de, em termos de custo anual, apresentar competitividade com outros materiais. Hoje em dia, os preservativos têm um peso considerável na composição de custos, que sem dúvida, deve ser uma preocupação permanente na pesquisa de novas alternativas, impostas pelas restrições de natureza ecológica cada vez mais rigorosas.
e) Outras características: além das anteriormente mencionadas, existem outras que poderíamos denominar facultativas e que são impostas pelas peculiaridades de cada situação de uso. Por exemplo, madeira para habitação e para certos tipos de embalagens deve deixar a superfície limpa e isenta de odores residuais. Para dormentes ferroviários a condutividade elétrica é um fator relevante devido ao sistema de sinalização.
É difícil que um preservativo atenda a todos os requisitos mencionados. A escolha deve ser feita apoiada nas especificações existentes, e na experiência acumulada na literatura, fatores que devem ser auxiliados pelo bom senso.
Deterioração da madeira
A deterioração da madeira pode ocorrer devido à ação de agentes físicos, químicos e biológicos. A madeira exposta ao tempo sofre deterioração fotoquímica, por exemplo, promovida pela radiação ultravioleta que atua principalmente sobre a lignina, causando alterações significativas na coloração da madeira e na estrutura celulósica que vai sendo destruída em camadas que são levadas pela água da chuva. O fenômeno é lento e é conhecido por Intemperismo (Weathering). A madeira por ser combustível, pode ser destruída pelo fogo. Apesar de ser inerte à ação de muitos produtos químicos, pode sofrer a ação destruidora de poluentes ao longo do tempo ou por ações diretas de produtos ácidos, por exemplo. Contudo, são os agentes biológicos, chamados de biodeterioradores, os merecedores de maior atenção, uma vez que têm sido os causadores dos maiores prejuízos à utilização da madeira. Os organismos que atacam a madeira, com uma conseqüente degradação de sua qualidade são: mofos e manchas, fungos destruidores, insetos xilófagos, e furadores marinhos.
Mofos e manchas
Tanto o mofo como algumas outras classes de microorganismos não afetam a resistência da madeira já que se alimentam dos conteúdos das cavidades celulares, e não das paredes das células. Quase todos eles são incapazes de atacar a madeira quando a porcentagem de umidade se encontra abaixo do ponto de saturação das fibras (conteúdo de umidade variável de essência para essência, próximo a 25%). A existência do mofo em um pedaço de madeira pode ser facilmente visualizado devido à existência de colônias que dão à sua superfície um aspecto “algodoado”. A coloração dessas colônias pode variar do branco ao preto, e se apresentam quando a umidade é muito elevada. Quando a madeira se encontra seca, o mofo poderá ser retirado sem que a resistência da madeira sofra qualquer alteração.
As manchas na madeira podem ser ocasionadas por fungos cromogenos ou por mudanças químicas, devido aos distintos materiais que se infiltram nas cavidades celulares. Estas últimas não afetam as características da madeira. As ocasionadas pelo crescimento de fungos têm efeitos adversos sobre a madeira. Como exemplo pode-se citar as manchas azuis, as quais não afetam a resistência das madeiras, mas sim sua aparência. As manchas têm uma penetração tal que, ao contrário do mofo, não podem ser retiradas da superfície.
Fungos destruidores
Os grupos de organismos que muda as propriedades físicas e químicas das paredes das células ou das cavidades celulares, e que afetam seriamente a resistência da madeira, recebem o nome de fungos destruidores da madeira, ou mesmo, fungos xilófagos. Estes fungos são os que produzem a decomposição da madeira. Quase todos eles a atacam, uma vez que a árvore tenha sido cortada ou logo que a mesma tenha caído. Existem também fungos que atacam árvores vivas, cuja condição física tenha sido debilitada por feridas ou por ataque de insetos. Existem dois tipos principais de fungos que causam a destruição das células, que são os de podridão branca, e os de podridão parda. Os primeiros atacam mais facilmente a lignina (substância que mantém juntas as células da madeira) do que a própria célula da madeira. Já os fungos de podridão parda atacam mais facilmente a celulose do que a lignina.
A reprodução de todos estes microorganismos destruidores da madeira é efetuada por meio de esporos. Os esporos crescem e se desenvolvem até o exterior da madeira, de onde são transportados pelo ar muito facilmente. Uma vez que o ar os leve, ou desde que as condições sejam adequadas, os ditos esporos germinam, iniciando o ciclo de decomposição da madeira.
Insetos xilófagos
A madeira quando está devidamente tratada com preservativos tem sua vida média aumentada.
Entretanto, existem fatores que podem diminuir a eficiência desses preservativos e afetar este tratamento, e precisam ser considerados, para que se obtenha o melhor desempenho da madeira tratada. Estes fatores foram agrupados em três categorias: características da madeira, características da solução de tratamento, e processo de tratamento.
As madeiras são divididas em coníferas e dicotiledôneas, e apresentam diferentes arranjos nos seus elementos anatômicos constituintes, com reflexo na tratabilidade de cada uma delas. Agrupam-se as madeiras em quatro grupos, de acordo com a maior ou menor facilidade com que o cerne é penetrado. De forma geral, a classificação com base na permeabilidade a gases evidencia a existência de boa correlação entre tratabilidade e permeabilidade.
De uma forma geral, o alburno das madeiras é receptivo ao tratamento preservativo, em contraste com a situação apresentada pelo cerne. Isto ocorre pela deposição de extrativo no cerne que acentua a aspiração das pontuações, além de fechar o toro das mesmas. Durante o processo de secagem, há tendência à aspiração das pontuações. Tal fenômeno é menos acen¬tuado no lenho tardio, devido à maior espessura do retículo de sustentação. Este fato explica a razão pela qual, nas coníferas, a impregnação é mais fácil no lenho tardio do que no inicial.
Já foi visto que essa propriedade da madeira correlaciona-se bem com sua respectiva tratabilidade.
O teor de umidade da madeira afeta sua tratabilidade. Acima do ponto de saturação das fibras, um aumento do teor de umidade diminui a fração de vazios da madeira, podendo impedir que se atinja a retenção de preservativo desejada. Abaixo do ponto de saturação das fibras, aumentos de umidade geralmente diminuem a permeabilidade da madeira a gases. A explicação pode ser dada pela redução do tamanho dos poros causada pelo inchamento da membrana das pontuações. Essa redução atinge o máximo no ponto de saturação das fibras, provavelmente, pela condensação de umidade nos pequenos capilares das membranas das pontuações, bloqueando a passagem de gases pela madeira.
Viscosidade
É uma das propriedades de influência mais notória (NICHOLAS apud LEPAGE, 1986). Se a equação de Poiseuille for admitida como válida, infere-se que a vazão é inversamente proporcional à viscosidade. Pelo modelo de SIAU, percebe-se que a viscosidade tem uma influência menor do que a que seria esperada.
Em regime estacionário observou-se que a lei de Darcy não era seguida, havendo um decrés¬cimo da vazão com o tempo. Isto era devido à oclusão física de substâncias presentes na madeira. Com isto outros pesquisa¬dores foram capazes de atingir vazões constantes usando água filtrada e recentemente fervida. Com relação a materiais particulares, pode-se dizer que a madeira age como um ultra-filtro em virtude de sua estrutura de poros finos.
O efeito dos vários produtos químicos usados em formulações preservativas é variável. O fluoreto de sódio, por exemplo, não tem efeito, enquanto arsenato de sódio, cromato de sódio, pentaclorofenato de sódio e bórax diminuem a penetrabilidade da solução de tratamento. A razão para o decréscimo da penetrabilidade das soluções contendo vários problemas químicos ainda não é bem conhecida. No caso dos boratos, a redução parece ser devida à formação de complexos com carboidratos. No caso de arseniatos e cromatos a explicação reside no fato desses íons formarem compostos insolúveis ligados à estrutura da madeira.
Há, portanto, dois tipos de reações químicas que podem afetar adversamente a penetração. Em primeiro lugar, produtos insolúveis de reações que ocorrem entre componentes do tipo multisal. Estas reações podem ser iniciadas por redução do cromo, que então reage com o cobre e o arsênio. Em segundo lugar, podem ocorrer reações entre preservativos e centros ativos na madeira, ou com extrativos. Com relação aos preservativos oleosos ou oleossolúveis, parece ocorrer um processo de envelhecimento da solução decorrente da contínua reutilização. Nos oleossolúveis, em particular, esse efeito pode ser atribuído mais ao solvente do que ao próprio preservativo. No caso do creosoto, onde não há solvente (na maior parte dos casos), pode-se imaginar reações entre os seus numerosos componentes químicos e extrativos. O contínuo aquecimento desses produtos coopera para acelerar essas reações. O efeito observado nas operações de tratamento é a formação de lamas depositadas no fundo dos tanques de estocagem e sobre os produtos preservados, de forma a reduzir a penetração.
A presença de extrativos em soluções aquosas reduz de forma significativa a penetração, sendo o efeito mais pronunciado em solução alcalina do que em solução ácida. O fato de que soluções alcalinas acumulam mais extrativos sugere que as hemiceluloses estejam envolvidas no processo.
Em preservação de madeiras há dois tipos de soluções: oleosas ou oleossolúveis e hidrossolúveis. Os veículos desses dois tipos são fundamentalmente diferentes. O veículo do tipo oleossolúvel é relativamente não-polar, enquanto a água é um solvente polar. Sabe-se, através de estudos, que a vazão em líquidos não-polares é consideravelmente maior do que em solventes polares. Em idênticas condições de tratamento, muitas vezes observa-se que a retenção de oleossolúvel chegou a ser duas vezes a retenção de hidrossolúvel (em idênticas condições de viscosidade). Observações de usina revelam melhor penetração obtida com pentaclorofenol dissolvido em óleos leves, do que a obtida com soluções hidrossolúveis.
A explicação mais lógica para o fato está baseada na capacidade de formar pontes de hidrogênio dos dois tipos de líquidos. Líquidos polares, como a água, formam fortes pontes de hidrogênio, enquanto líquidos não-polares, como os óleos, não têm essa capacidade. Então, argumenta-se que essas pontes de hidrogênio representam uma espécie de perda de carga durante o fluxo do líquido, através de pequenos poros. Por outro lado, os óleos, não possuindo doadores de receptores de hidrogênio, não oporiam nenhuma resistência ao fluxo.
Métodos que melhoram a tratabilidade da madeira
Incisamento
Atualmente, o incisamento é talvez o método mais efetivo de melhorar a tratabilidade da madeira. Por meio da ruptura mecânica da parede celular a intervalos regulares ao longo e através da peça, a estrutura torna-se suficientemente porosa para permitir o fluxo de líquidos na zona incisada. As principais desvantagens do incisamento residem no fato de que ele produz uma superfície áspera e provoca alguma perda de resistência mecânica.
Tratamento com vapor
Este processo pode ser adaptado aos processos comerciais e, na realidade, melhora a perme¬abilidade da madeira quando ela ainda está verde, minimizando a redução que ocorre com a secagem. Esse tipo de tratamento apenas conserva a permeabilidade que a madeira possuía quando verde. Parece que ocorrem alterações na aspiração das pontuações, o que é a mudança anatômica mais significativa durante a secagem. Entretanto, os resultados têm sido compensadores com madeira de Pinus. Uma desvantagem apresentada por esse processo é a diminuição de algumas propriedades mecânicas da madeira, provavelmente devido à hidrólise de polissacarídeos.
Método das pressões oscilantes
Esse método foi desenvolvido na Suécia e aperfeiçoado nos Estados Unidos. Consiste na apli¬cação de ciclos curtos e periódicos de pressão e vácuo na madeira imersa em preservativo, no cilindro de tratamento. A operação é controlada automaticamente por equipamentos especiais. No geral, esse método não apresenta diferença do tratamento de “célula cheia”. Nesse método, o cilindro é preenchido com preservativo, aplicando-se uma pressão de cerca de 7,5 atm e alternando com um vácuo de cerca de 95%. Usualmente os ciclos aumentam progressivamente em duração de 1 a 7 minutos. O número de ciclos varia com a madeira. Madeira permeável requer cerca de 40 ciclos e a impermeável de grande espessura 400 ciclos. Nesse método, na versão original, ao carregamento do cilindro seguia-se um pré-tratamento com vapor direto a uma pressão efetiva de cerca de 1 atm. Esse pré-tratamento foi concebido para tornar a madeira mais flexível e susceptível ao tratamento pelo método OPM.
Jatos de alta energia
Incisa-se a madeira com jatos de elevada pressão (30.000 - 60.000 psig), utilizando-se o próprio preservativo como fluido de corte, efetuando-se ambos objetivos (preservação e incisamento) numa única operação. Na reunião da AWPA de 1985 foi apresentado um trabalho relatando o tratamento de estacas de três espécies de madeira usando ACA e pentaclorofenol como preservativos. Os resultados obtidos com ACA foram nitidamente superiores ao pentaclorofenol, demonstrando a viabilidade técnica desse processo para preservativos hidrossolúveis com poder de difusão.
Já é bastante conhecido o efeito de microrganismos e de sistemas enzimáticos sobre o aumento da permeabilidade das madeiras, principalmente usando-se o bolor do gênero Trichoderma. O mesmo efeito é observado com bactérias, principalmente pela degradação dos raios e das membranas das pontuações. A vantagem do emprego de microrganismos reside na seletividade do ataque com pequena perda de resistência mecânica. Embora seja ainda muito pequeno o número de microrganismos capazes de atuar no cerne das madeiras, que é a parte da árvore cuja permeabilidade geralmente se deseja aumentar, este parece ser um campo bastante promissor, aberto a futuras pesquisas.
Os benefícios advindos do tratamento com ondas de choque são atribuídos à deaspiração das membranas das pontuações, embora acredite-se que o processo promova o deslocamento das bolhas de ar alojadas nos poros da madeira. O efeito também pode ser obtido por picos instantâneos de pressão, que permitiriam o fluxo de líquidos através dos menores poros. Há estudos indicativos da eficiência desse processo na melhoria da penetração em madeiras refratárias. Essas ondas de choque podem ser de baixa freqüência ou ultra-sônicas (alta freqüência).
No caso da aplicação de ondas de ultra-som é necessário que o preservativo possua grupos hidrofílicos; no caso da água, sua tensão superficial teria de ser reduzida com tensoativos. No caso dos sais de amônio quaternário, essa providência torna-se desnecessária. O motivo pelo qual grupos hidrofóbicos não são afetados pelas ondas de ultra-som é a necessidade de existência de uma certa afinidade entre o líquido e a madeira, para promover a remoção do ar dos capilares pela mudança de interface que passa de ar-madeira para líquido-madeira. Embora a água preencha os requisitos de afinidade com a madeira, sua elevada tensão superficial se opõe à eliminação do ar.
Com a reutilização, as soluções de tratamento passam por um processo de envelhecimento, com aumento de material particulado, que traz como conseqüência, a redução da penetração do preservativo na madeira. A solução mais evidente seria a filtração dessa solução; entretanto, uma filtração comum não seria adequada, uma vez que o material presente na solução, além de sua natureza coloidal, já passou por um filtro de malhas muito finas, que é a própria madeira.
Em razão disso, se for esperado algum benefício dessa medida, dever-se-á lançar mão de processos mais efetivos na remoção de material particulado, como, por exemplo, ultrafiltração, adsorção ou precipitação por floculação.
Autores: Mauro Augusto Demarzo e Rosemary Diogo Sgai |