A madeira, sendo um material higroscópico, tem suas propriedades mecânicas e elásticas afetadas por condições ambientais (temperatura, umidade relativa do ar etc.). O acompanhamento da secagem de peças de um determinado lote de madeira não é uma tarefa simples, pois exige que sejam realizadas avaliações freqüentes em peças do lote. Essas avaliações, realizadas em amostras de controle, nem sempre indicam com a exatidão necessária o verdadeiro teor de umidade das peças do lote. Por outro lado, realizar o ensaio convencional de determinação da umidade em todas as peças seria uma tarefa impossível.
O objetivo dessa pesquisa foi avaliar o comportamento da velocidade de propagação da onda de ultra-som em função da umidade. Para atingir esse objetivo foram ensaiados 45 corpos-de-prova de Pinus elliottii, Eucalipto citriodora e Embúia ensaiados em umidades abrangendo desde a condição saturada até umidades próximas de 4%. Durante o ensaio foram obtidas as velocidades de propagação da onda de ultra-som nas peças, em cada condição de umidade, e nas direções longitudinal (L), radial (R) e tangencial (T). Os resultados permitiram observar que, de maneira geral a velocidade cresce com o decréscimo da umidade, para todas as direções consideradas e que existe uma variação diferenciada em termos de magnitude, dependendo do intervalo de umidade e da direção (L, R ou T) considerada, comportamento esse similar ao observado para as propriedades mecânicas.
As relações de dependência das propriedades da madeira com a variação do teor de umidade têm sido amplamente estudadas por muitos pesquisadores. A determinação do teor de umidade é realizada, normalmente, em pequenos corpos de prova isentos de defeitos. No Brasil, a NBR 7190/97 em seu anexo B.5 descreve os procedimentos a serem seguidos na determinação do teor de umidade da madeira. Nesse anexo propõe-se a utilização de corpos de prova de seção transversal retangular, com dimensões nominais 2 cm x 3 cm e comprimento 5 cm . O teor de umidade de equilíbrio da madeira e de produtos à base de madeira é atingido quando, para uma dada combinação de umidade relativa do ar e de temperatura, nenhuma difusão de água ocorre interna ou externamente.
Para espécies de zonas temperadas inúmeras pesquisas já foram realizadas para se determinar com exatidão o ponto de saturação de várias espécies estando este ponto entre 28% e 30%. As condições ambientais afetam a umidade da madeira que, por sua vez, afeta as propriedades mecânicas da madeira (resistência e elasticidade) sendo, portanto, seu estudo, de extrema importância. Importante também é lembrar dos aspectos referentes à secagem de peças de madeira, procedimento este que envolve o conhecimento da relação madeira-água. Em estudos observou-se que as propriedades mecânicas da madeira eram pouco afetadas pela água livre, porque somente a parede celular contribui na resistência. Todos os trabalhos confirmam a redução da resistência e do módulo de elasticidade da madeira com o acréscimo da umidade, até valores de teor de umidade próximos de 30%. Acréscimos de teores de umidade acima deste ponto não mais influenciavam os parâmetros mecânicos.
No Brasil, diversos foram, também, os pesquisadores que se interessaram pelo estudo da influência da umidade em propriedades mecânicas da madeira. Define-se um
coeficiente de influência da umidade da madeira, assumindo um comportamento linear do diagrama resistência-umidade entre valores de 10% e 20% de umidade.
O uso do ultrasom para o monitoramento do teor de umidade da madeira é relativamente novo. Estudos analisaram o comportamento da velocidade e da atenuação das ondas de ultra-som em corpos de prova da espécie spruce, medida nas condições saturada e seca ao ar. A máxima velocidade longitudinal VLL foi atingida na condição seca ao ar. O gráfico mostra a existência de um ponto crítico U1 = 38% de umidade para a velocidade VLL. A velocidade decresce de maneira muito acentuada com o acréscimo da umidade até o ponto de saturação das fibras e, após, a variação passa a ser muito pequena. A teores de umidade baixos (U < 18%), quando a água está presente nas paredes celulares na forma de água de impregnação, o pulso de ultrasom se dispersa nas células e nos limites inter-celulares da madeira. Acima do ponto de saturação das fibras, quando a água livre está presente nas cavidades celulares, a porosidade do material intervém como fator predominante na dispersão das ondas. Da revisão da literatura vê-se que a variação da velocidade de ultra-som está relacionada à presença de água de impregnação, enquanto que a variação da atenuação está relacionada à presença de água livre. O objetivo desse trabalho foi estudar o comportamento da velocidade de propagação de ondas longitudinais na madeira em função da umidade.
As espécies adotadas foram o Pinus, o Eucalipto e a Imbuia. Foram utilizados 15 corpos de prova de dimensões: 60 mm x 30 mm x 300 mm. Para a determinação do tempo de propagação da onda foi utilizado equipamento de emissão de ondas de ultra-som com transdutores de freqüência 45 kHz. Inicialmente foram retiradas amostras de controle. As amostras de controle foram utilizadas para estabelecer uma previsão de peso final na umidade desejada, tendo em vista que a secagem foi realizada em estufas e não em câmaras de climatização. Após a retirada das amostras de controle, os corpos de prova foram levados à condição saturada. Após a saturação foi determinada a massa inicial (mi) com exatidão de 0,01 g bem como o volume por meio das medidas dos lados da seção transversal e do comprimento com precisão de 0,1 mm de todos os corpos de prova.
Nesta mesma condição, todos os corpos de prova foram submetidos a uma primeira leitura de tempo de propagação de onda nas três direções principais (VLL, VRR e VTT). Os corpos de prova da amostra de controle foram colocados em estufa com temperatura 103°C ± 2°C para secagem completa. De posse da massa inicial saturada e da massa seca foi determinada a umidade inicial dos corpos-de-prova. Tomando-se as umidades obtidas para os corpos-de-prova da amostra de controle como referência para os demais corpos-de-prova da espécie e, de posse das massas iniciais de cada corpo de prova (mi), pôde-se determinar as massas previstas para uma determinada umidade final desejada para os corpos-de-prova. Os corpos-de-prova foram, então, dispostos em local coberto e ventilado para a primeira fase da secagem – etapa da secagem ao ar. Durante a secagem os corpos de prova foram medidos até alcançarem a massa prevista para que a umidade estivesse entre 28 a 30%. Em seguida, os corpos de prova foram dispostos em local cobertos e ventilados para a segunda etapa da secagem ao ar livre até que a umidade estivesse entre 22 e 25%. A secagem ao ar livre então prosseguiu até que fosse atingida umidade entre 18 e 22% com o mesmo procedimento já descrito. Após esta etapa, a secagem ao ar livre prosseguiu até que os corpos-de-prova atingissem a umidade de equilíbrio ao ar.
Terminada a etapa de secagem ao ar livre os corpos de prova foram levados à estufa para uma secagem forçada, porem lenta. Para cada uma das etapas (condições de umidade), foram obtidos os tempos de propagação da onda ultra-sonora. Ao final do processo, de posse das massas secas reais de todos os corpos-de-prova, foi determinada a umidade real dos corpos de prova em cada etapa, bem como o cálculo da densidade básica. De posse dos comprimentos percorridos pela onda em cada direção foram obtidas as velocidades VLL, VTT e VRR. Para cada espécie foram realizadas análises de regressão visando determinar o modelo de variação da velocidade em função da umidade.
Os resultados médios de velocidade e umidade para cada espécie foram inseridos em gráficos para que se pudesse avaliar a tendência geral da variação da velocidade de propagação em função da umidade.
No caso do pinus visualiza-se um comportamento nitidamente diferenciado em dois trechos. No trecho compreendido entre a umidade aproximada de 4% e o ponto de saturação das fibras nota-se uma variação muito maior na velocidade do que aquela existente para umidades superiores ao ponto de saturação. Esse comportamento se repete para as três direções estudadas. Essa tendência pode ser verificada pelos coeficientes obtidos nas regressões, ou seja, as velocidades decrescem com o acréscimo da umidade e esse decréscimo é bem mais acentuado até o ponto de saturação das fibras. No caso da imbuia esse comportamento se verifica mas as diferenças são menos acentuadas. Para o eucalipto esse comportamento somente se verifica na direção longitudinal. Nas outras direções, até o ponto de saturação das fibras as regressões demonstram não haver influência da umidade na velocidade e, acima do ponto de saturação esse comportamento é invertido.
No caso do pinus e da imbuia os resultados confirmam aqueles obtidos por outros autores, bem como são equivalentes aos obtidos nos ensaios mecânicos, ou seja, as propriedades da madeira são mais afetadas até o ponto de saturação das fibras. Até o ponto de saturação das fibras tem-se a presença de água livre nos vazios celulares e água de impregnação nas paredes. Isso faz com que a propagação da onda ocorra, tanto na parede celular quanto na água, reduzindo assim a velocidade. Nesse estado, a variação de velocidade entre as espécies estaria mais ligada à porosidade do material. Abaixo do ponto de saturação a propagação da onda se daria somente na parede celular, o que faz com que a velocidade seja maior e com que a dispersão se dê em função de fatores ligados à estrutura da madeira. As regressões indicam, também, uma variação mais acentuada na direção longitudinal, seguida da radial e da tangencial.
A utilização do ultra-som permitiu visualizar que a velocidade de propagação da onda, de maneira geral, variou segundo dois trechos distintos, ou seja, para teores de umidade até o ponto de saturação das fibras e teores de umidade entre o ponto de saturação das fibras e aproximadamente 4%. Essa variação segue a mesma tendência de comportamento dos ensaios normatizados de determinação de umidade.
A variação da velocidade de propagação das ondas foi mais significativa no trecho de teores de umidade abaixo do ponto de saturação das fibras. Acima do ponto de saturação existe variação, no entanto essa variação é significativamente menor. A variação da velocidade é mais acentuada na direção longitudinal, seguida da radial e finalmente da tangencial. Os resultados permitem esperar ser possível determinar-se um modelo de variação da velocidade com a umidade para uma dada espécie. A partir desse modelo seria possível monitorar a secagem da madeira de maneira prática e precisa.
Fonte: Raquel Gonçalves - Universidade Estadual de Campinas; Brasil;
raquel@agr.unicamp.br COSTA, O. A. L., Universidade Estadual de Campinas; Brasil;
halo-elo@uol.com.br.