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REVISTA DA MADEIRA - EDIÇÃO N°120 - OUTUBRO DE 2009

Qualidade

Desafios dos produtos de madeira para a construção na Europa

O desafio da qualidade está em todos os domínios da indústria da construção. É uma conseqüência natural da recente normalização européia elaborada para apoio à implementação da Diretiva dos Produtos da Construção, juntamente com as crescentes expectativas do consumidor final. Existe hoje um novo cenário na aplicação de produtos de madeira maciça na construção, apontando algumas ações possíveis de empreender de forma sustentada a sua utilização.

A madeira é utilizada na construção em diversas funções, sejam estruturais ou não estruturais, exposta a diferentes ambientes (temperatura e umidade relativa do ar) e situações de risco de degradação biológica. Todas estas condições traduzem em exigências de resistência mecânica, de durabilidade, de estabilidade dimensional e de natureza estética muito distinta. Deste modo, a especificação e fornecimento de madeira por parte de agentes com pouca informação sobre o material acarretam uma elevada probabilidade de comportamento não satisfatório em serviço, seja por mera questão estética seja por degradação biológica ou mecânica.

A utilização da madeira pela indústria de construção enfrenta ainda uma forte competição por parte de outros materiais de construção (aço, plásticos, pedra, e outros). No caso concreto dos recursos florestais nacionais, a realidade do mercado único acarreta ainda a forte competição de recursos florestais provenientes dos diversos países europeus.

A conjuntura atual implica que a madeira pinus constitua o recurso florestal nacional com uma produção comercial significativa, sendo uma das fontes sustentáveis de fornecimento da madeira à indústria . No entanto esta madeira é geralmente considerada como sendo uma madeira de fraca qualidade, devido em grande parte à sua utilização no passado em condições de aplicação e utilizações finais não sustentáveis; - incapacidade da indústria nacional em responder de forma adequada às solicitações, fornecendo de modo reiterado material desajustado face aos requisitos constantes no caderno de encargos.

A sua utilização ainda é limitada pela forte competição interna (procura) por parte de indústrias de pasta e papel, de placas de derivados de madeira e outras (por exemplo: paletes).

A utilização da madeira na construção deverá ser promovida segundo uma lógica de produto (com características físicas, mecânicas e de durabilidade definidas em face de um determinado fim), de forma a equiparar-se a outros materiais que se apresentam perante a indústria de construção sob a forma de produtos prontos a serem incorporados na obra. A colocação de produtos de madeira permitirá ainda ajudar a melhorar a clara falta de conhecimentos sobre as propriedades e comportamento da madeira, assim como sobre os mecanismos associados à falha da madeira em serviço, por parte dos profissionais relacionados com a indústria de construção (arquitetos, engenheiros, e outros).

Outras operações como a secagem e o tratamento preservador, igualmente crucial para um desempenho em serviço aceitável (qualidade mínima), orientam-se numa lógica de produto. Assim, a secagem e o tratamento preservador são efetuados de forma a fornecer elementos de madeira com um teor em água de equilíbrio e uma durabilidade face a uma dada classe de risco, respectivamente, de acordo com o local de aplicação.

Ao longo dos últimos anos esta perspectiva (oferta de produtos) tem correspondido a um aumento da qualidade e da utilização de elementos de madeira por parte da indústria de construção. Refira-se o aumento de qualidade das empresas e produtos destinados a revestimento de piso, levando ao desenvolvimento ou comercialização de produtos próprios e sustentados em apoio técnico. Considera-se que esta perspectiva será consolidada com a implementação plena da diretiva dos produtos da construção.

Normas técnicas

O êxito do mercado único europeu depende do sucesso do considerável esforço, desenvolvido pela Comissão Européia (CE), tendente a prevenir que legislação nacional possa levantar barreiras técnicas ou outras à livre circulação de bens entre países. No caso da construção este esforço se traduz com a diretiva dos produtos da construção.

Como suporte a esta diretiva, a CE atribuiu mandatos ao Comitê Europeu de Normalização (CEN) de forma a este, por meio dos seus comitês de normalização no campo da madeira e seus derivados produzisse um conjunto de normas européias harmonizadas. A CE atribuiu, ainda, à European Organisation for Technical Approvals (EOTA) o papel de elaborar Guias de Aprovação Técnica Europeia (ETAG), cobrindo produtos não abrangidos pela normalização européia.

A uniformização dos requisitos de qualidade impostos a qualquer produto de madeira destinado a ser incorporado na construção, independente do país de origem, favorece que documentação de apoio à sua utilização e promoção sirva um leque mais alargado de agentes.

Deste modo, poderá contornar-se a limitação de apoio à indústria por parte de Instituições de I&D, devido à reduzida dimensão dos grupos de investigação na generalidade dos países europeus, quando comparados com os grupos devotos aos restantes materiais de construção, nomeadamente o betão armado. Refira-se que grande parte das normas européias (EN) elaboradas na última década têm sido adaptadas como normas internacionais (ISO) e utilizadas freqüentemente em trocas comerciais. Igualmente o panorama em termos de normas aplicáveis a exigências de desempenho teve uma grande evolução, quer para fins estruturais como para fins não estruturais.

Existem dois níveis de qualidade que os produtos de madeira deverão atender quando postos no mercado da construção. O primeiro respeita à conformidade dos produtos com a diretiva dos produtos da construção, dando assim origem à marcação CE e preenchendo a condição essencial para entrar no mercado da construção (poderemos considerar como sendo um nível de qualidade mínimo). O segundo nível, mais exigente, refere-se à satisfação dos utilizadores finais.

Embora se assista há já alguns anos a um aumento do interesse na aplicação de produtos de madeira na construção, por parte de arquitetos e projetistas, estes têm sentido dificuldades na sua especificação devido a desconhecimento acerca do comportamento do material e da normalização aplicável. Estes problemas são sentidos igualmente pela indústria de construção em geral. As exigências de desempenho dos produtos de madeira devem ser vistos com base na normalização e regulamentação aplicável. Assim, é essencial que essa informação seja divulgada entre os parceiros diretamente envolvidos.

A indústria da madeira deverá garantir que os produtos colocados no mercado obedeçam aos requisitos impostos pela normalização e regulamentação aplicável, solicitando apoio a entidades se necessário, e a indústria da construção deverá efetuar as especificações do produto pretendido obedecendo a critérios concretos definidos por essa mesma normalização.

Qualidade

A indústria de construção está perante um sistema de atestação de qualidade que se baseia na satisfação do consumidor final, muitas vezes entidades singulares, que olham para a madeira como um material nobre e amigo do ambiente, mas que no entanto pretendem um nível de qualidade elevado.

Deste modo, colocando o ideal de conforto claramente à frente de possíveis ideais ambientais. A utilização sustentada de produtos de madeira na construção coloca desafios relacionados com atividades de formação, de desenvolvimento de produto, de certificação e de divulgação, que se estendem aos diversos agentes envolvidos. Estas atividades são essenciais e eliminam situações freqüentes em que a conjunção de especificações incorretas ou ambíguas e o fornecimento de materiais e produtos de características inadequadas levam a um comportamento deficiente dos elementos de madeira em serviço e a sua freqüente troca por outros tipos de materiais não lenhosos.

Assim, considera-se essencial melhorar a comunicação entre a oferta (indústria de madeira) e a procura (arquitetos, projetistas e indústria de construção), através da divulgação do panorama normativo e regulamentar aplicáveis a produtos de madeira e da formação dos agentes envolvidos (arquitetos, projetistas e indústria de construção em geral) acerca das propriedades do material e do seu comportamento em serviço.

Também é importante selecionar de na indústria da madeira aquelas empresas que encaram a indústria da construção como um potencial cliente, colocando ao seu dispor produtos de madeira (pavimentos, janelas, elementos para fins estruturais) que tenham como suporte a marcação CE (garantia de qualidade mínima).

A limitação do número de empresas, fornecedoras de produtos de madeira, permitiria eliminar a concorrência desleal de empresas sem capacidade para desenvolver novos produtos ajustados a um nível de qualidade superior. Estas ações permitiriam limitar casos de falha em serviço da madeira devido a os seguintes fatores:

• a generalizada falta de formação (mesmo ao nível de quadros superiores) relativamente à utilização de madeira na construção;

• a uma percepção histórica desajustada da realidade em que assenta grande parte das especificações elaboradas por projetistas e arquitetos;

• a uma utilização ambígua de termos e conceitos, que torna difícil conciliar o que de fato é solicitado com o produto ou material entregue. Relativamente ao papel das Instituições de I&D, torna-se necessário ultrapassar a desconfiança existente entre estas e a Indústria, derivada em grande parte pelo seu distanciamento durante muitas décadas.

No entanto, a atuação dos núcleos de I&D, envolvidos em investigação aplicada, deverá estar voltada para projetos inovadores, apoiando as empresas no desenvolvimento e aperfeiçoamento de produtos já comercializados. Também, deve promover investigação própria, abordando o desenvolvimento de novos produtos e metodologia de avaliação do comportamento a longo prazo desses produtos de durabilidade tanto mecânica como biológica.

Autor: José Saporiti Machado - Pesquisador do Laboratório Nacional de Engenharia Civil - Núcleo de Estruturas de Madeira de Lisboa - Portugal.