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REVISTA DA MADEIRA - EDIÇÃO N°119 - AGOSTO DE 2009

Créditos de carbono

Geração de créditos de carbono por sistemas florestais

Com o surgimento dos novos instrumentos de política global sobre o clima, dentre eles o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) previsto no Protocolo de Kyoto, o plantio de florestas tornou-se uma alternativa para reduzir a concentração dos gases de efeito estufa (GEEs) da atmosfera e consequentemente para a mitigação do aquecimento global. A possibilidade de geração dos chamados créditos de carbono por meio da atividade florestal é um mecanismo de interesse tanto dos países desenvolvidos, e de países em desenvolvimento. Os países em desenvolvimento podem se beneficiar gerando créditos de carbono por meio da comprovação certificada da remoção ou redução do CO2 atmosférico e vendendo tais créditos no mercado de carbono. Por outro lado, os Países desenvolvidos podem utilizar esses créditos para abatimento em suas metas de redução de emissões, estipuladas pelo protocolo para o período de 2008-2012.

Os projetos de remoção (ou seqüestro) de CO2 da atmosfera pelas florestas, no contexto do MDL, se enquadram na categoria de “Agricultura, Floresta e Outros Usos da Terra” e são denominados projetos de Florestamento e Reflorestamento. Segundo as definições da Convenção-Quadro das Nações Unidas de Mudanças Climáticas (CQNUMC) expressas no acordo de Marrakesh, o Florestamento consiste no plantio de florestas em áreas que não contém florestas por um período de pelo menos 50 anos, e o Reflorestamento consiste no plantio de florestas em áreas que não contém floresta desde 31 de dezembro de 1989. A fixação de tais datas para averiguação da existência ou não de florestas na área do projeto teve por intuito evitar o desmatamento de terras florestadas para implantação de projetos de créditos de carbono, uma vez que o desmatamento pode ocasionar o retorno do carbono estocado para a atmosfera.

Outras formas de promover o seqüestro de carbono para a geração de crédito, como por exemplo, as atividades de manejo florestal e conservação florestal, chegaram a ser discutidas no âmbito do Protocolo de Kyoto. Entretanto, somente as atividades de florestamento e reflorestamento foram aprovadas como modalidades de projetos florestais elegíveis no MDL para o primeiro período de compromisso do Protocolo. Para os próximos períodos de compromissos, vem se discutindo nas Conferências das Partes, a possibilidade da inclusão no MDL dos projetos de Redução de Emissões provenientes do Desmatamento e Degradação (REED).

Para elaboração de um projeto de MDL florestal é necessário, primeiramente, que se comprove a elegibilidade da terra onde o projeto será implementado. Tal elegibilidade está relacionada à existência, ou não, de florestas na área. Conforme o acordo de Marrakesh, Floresta é definida como um terreno com área mínima de 0,05 a 1,0 hectares, que tenha cobertura de copa de árvore superior ao limite de 10 a 30 por cento e árvores com potencial de altura mínima de 2 a 5 metros na maturidade, in situ. Estandes naturais jovens e todas as plantações que atingiram ou tendem a atingir esses limites são consideradas florestas. Áreas que normalmente formam parte de uma área florestal e que estejam temporariamente sem estoque, devido à intervenção humana como corte ou de causas naturais e que se espera ser convertida para floresta, também devem ser consideradas floresta pelo acordo.

Com base nesta definição cabe à Autoridade Nacional Designada (AND) de cada país membro do Protocolo de Kyoto, e que tenha interesse em desenvolver projetos de MDL florestais, definir dentro dos limites estipulados de área, cobertura de copa e altura das árvores os seus próprios valores. A definição de floresta tem implicações diretas na elegibilidade de uma atividade de projeto. Dependendo dos valores escolhidos, determinadas áreas poderão ser consideradas florestas, tornando-se inelegíveis às atividades de florestamento e/ou reflorestamento.

Sendo o Brasil um país detentor de grande diversidade de biomas e de condições altamente favoráveis à atividade florestal, a AND Brasileira definiu como floresta áreas de no mínimo 1 hectare, que possuem árvores com cobertura de copa mínima equivalente a 30 por cento e altura mínima de 5 metros. Esses valores evitam, de certo modo, que áreas onde exista uma vegetação arbustiva mais desenvolvida sejam caracterizadas como florestas, tornando-se desta forma inelegíveis ao MDL.

Outro requisito para contabilização dos créditos de carbono gerados pelos projetos de MDL é a comprovação da adicionalidade, ou seja, da remoção adicional que ocorreria com a implementação do projeto florestal em relação a uma linha de base. Linha de base é definida como o cenário que representa as mudanças no estoque de carbono que ocorreriam na ausência da atividade de projeto. A adicionalidade é representada pela comparação entre a remoção de CO2 no cenário de linha de base e a remoção de CO2 no cenário do projeto, ou seja, pelo carbono atmosférico fixado a mais pelas árvores em crescimento.

A remoção de CO2 do cenário de projeto é representado pela quantificação dos estoques de carbono nos reservatórios florestais (biomassa acima e abaixo do solo, matéria orgânica do solo, madeira morta e liter), das emissões de GEEs que ocorrem dentro dos limites geográficos do projeto e das fugas. Fugas são as emissões que ocorrem fora dos limites do projeto. Já a remoção do CO2 no cenário de linha de base é representada somente pela mudança do estoque de carbono nos reservatórios considerados. Para o cálculo dos estoques de carbono e das emissões dos gases de efeito estufa do projeto de MDL florestal deverá ser selecionada uma metodologia de linha de base e de monitoramento aprovada pelo Conselho Executivo do MDL. Caso não exista uma metodologia compatível com os propósitos do projeto deve-se, então, propor uma nova metodologia para aprovação.

Dentre os métodos de contabilização de carbono nos reservatórios florestais, inclui-se a quantificação direta de biomassa em campo, o inventário florestal, a utilização de equações alométricas, de modelos computacionais e de técnicas de sensoriamento remoto. Já, o cálculo das emissões dos GEEs provenientes da atividade de projeto é feito por meio de equações matemáticas, as quais utilizam dados quantitativos das fontes de emissões de GEEs, como aplicação de fertilizantes nitrogenados, queima de combustível fóssil e biomassa, e os fatores de emissão dos GEEs fornecidos no Guidelines for National Greenhouse Gas Inventories do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC).

O estoque de carbono assim como as emissões dos diferentes GEEs devem ser convertidos para CO2eq., visto ser esta a medida padronizada pela CQNUMC para o cálculo da remoção total promovida pela atividade de projeto de MDL. O cálculo do CO2eq leva em conta a massa atômica do Carbono, do CO2 e o potencial de aquecimento global de cada gás de efeito estufa. Deste modo, comprovada a adicionalidade em termos de remoção de CO2eq. de um projeto de florestamento ou reflorestamento, poderão então, ser gerados os créditos de carbono em quantidade equivalente às toneladas de CO2 removidas da atmosfera. Uma tonelada de CO2eq. corresponde à um 1 Certificado de Emissão Reduzida (CER), nome dado ao crédito de carbono oriundo do MDL.

Os CERs gerados pelos projetos de florestamento e reflorestamento podem ser de caráter temporário ou de longo prazo. O CER temporário (tCER) é aquele que expira ao final do período de compromisso subsequente ao que foi emitido e o CER de longo prazo (lCER) é aquele que expira ao final do período de creditação para o qual foi emitido. O período de creditação pode ser de 20 anos, renováveis por duas vezes, ou de 30 anos sem renovação. Este período deve ser escolhido de acordo com as espécies a serem utilizadas, a finalidade do plantio e as possibilidades de colheita, ou não da madeira, de forma que os acréscimos marginais de carbono compensem os custos de monitoramento. O pais desenvolvido que utilizar tCERs para cumprimento de suas metas deve manter uma contabilidade para substituição dos créditos em cada período de compromisso. Esta substituição pode ser feita tanto por créditos obtidos via MDL, quanto por créditos obtidos dos outros mecanismos de flexibilização, como Implementação Conjunta e Comércio de Emissões.

Os projetos de MDL florestais podem ser de pequena ou grande escala. Os de pequena escala são aqueles que geram remoções antrópicas líquidas de GEEs inferiores a 16.000 toneladas de CO2eq. por ano e devem ser desenvolvidos por indivíduos de baixa renda. Já os projetos de grande escala não possuem limites de tamanho.

Embora reconhecida a importância das florestas para a remoção do CO2 da atmosfera, manutenção do equilíbrio climático e, sobretudo para os serviços ecossistêmicos que estas desempenham, os projetos florestais no âmbito do MDL ainda não estão sendo implementados tanto quanto os de redução de emissão de GEEs. Como exemplos deste último destacam-se os dos setores de energia (eficiência energética e substituição de combustíveis fósseis por biomassa), os de aterro sanitário e os de manejo de resíduos animais (suinocultura).

Dentre os quase 1500 projetos de MDL registrados pelo Conselho Executivo do MDL, no mundo, tem-se hoje um único projeto florestal gerando créditos de carbono, que é o projeto desenvolvido na China intitulado “Facilitating Reforestation for Guangxi Watershed Management in Pearl River Basin”, registrado no final de 2006. Um outro projeto com pedido de registro, mas em fase de correções é o projeto de conservação de solos submetido pela Moldova em 2008 - Moldova Soil Conservation Project. No Brasil, atualmente, têm-se dois projetos em andamento e ambos encontram-se na fase de validação por Entidades Operacionais Designadas. Um deles e o da empresa de Energia AES Tietê, que consiste no reflorestamento, com espécies nativas, de 12.631 hectares das bordas dos reservatórios da empresa. Estima-se que este projeto resultará na absorção de aproximadamente 6 milhões de toneladas de carbono da atmosfera (www.aestiete.com.br). O outro, é o projeto do Grupo Plantar Reflorestamentos, que consiste no plantio de florestas de eucalipto, na região do Cerrado de Minas Gerais, para suprir o uso de carvão vegetal na produção de ferro primário, ao invés de coque de carvão mineral ou biomassa não-renovável. Ao longo de 28 anos, este projeto diminuirá a concentração de aproximadamente 12,8 milhões de toneladas de CO2eq. da atmosfera (www.plantar.com.br). Acredita-se que a limitação no desenvolvimento de projetos de MDL florestais ocorra devido, principalmente, às regras estabelecidas para os mesmos e à insegurança do mercado quanto à este tipo de projeto. Tal insegurança pode ser atribuída ao tempo de permanência que o carbono retirado da atmosfera ficará estocado na vegetação e às incertezas em relação à mensuração do carbono e dos GEEs reduzidos.

Visto que o único projeto de MDL florestal registrado no mundo foi implementado no ano de 2006, não existem, ainda, créditos de carbono florestais sendo negociados no mercado de Kyoto. Por outro lado, no mercado voluntário, a exemplo da Bolsa de Chicago, o crédito de carbono florestal tem ganhado o mercado. Empresas florestais brasileiras, como a Klabin, a Irani Celulose e Papel e a Plantar Reflorestamentos já negociaram créditos de carbono por esta modalidade. Vale ressaltar que, o crédito obtido no mercado voluntário não pode ser utilizado pelos países Anexo I para o cumprimento das metas estipuladas no Protocolo de Kyoto. Os créditos do mercado voluntário são adquiridos pelas empresas, bancos, negociadores, etc. com vistas a cumprimento de metas internas de redução de emissões existente em alguns países ou para promoção de marketing ambiental.

Embora o Brasil apresente condições favoráveis para o desenvolvimento de projetos de MDL florestal, tanto em relação às condições edafoclimáticas, quanto por possuir uma conjuntura organizacional representativa no MDL, percebe-se que o país não tem assumido uma posição de destaque no desenvolvimento desses projetos. Mesmo não tendo metas de redução para o primeiro período de compromisso e sendo o país reconhecido internacionalmente por possuir uma matriz energética limpa e um programa de uso de combustíveis de biomassa (álcool), não se pode negar a imagem negativa do Brasil em relação ao uso irracional dos recursos naturais e a destruição das florestas. Atividades relacionadas ao uso da terra como a agricultura e o desmatamento levam o país a ocupar a quarta posição do ranking dos maiores emissores de GEEs.

Vale ressaltar que as empresas do setor florestal, sobretudo aquelas detentoras de extensas áreas de plantio de culturas de longa rotação, apresentam um grande potencial para desenvolvimento de tais projetos, tendo em vista que a receita do MDL poderá viabilizar a ampliação das bases do empreendimento florestal em áreas onde sua implantação é atualmente inviável e que a demanda por créditos de carbono poderá aumentar à medida que se aproxima o final do primeiro período de compromisso do Protocolo de Kyoto.

Fonte: Michele Karina Cotta Walter - Eng. Florestal MSc. - Cepari/Unicamp; Priscila Pereira Coltri - Eng. Agrônoma MSc. - Cepari/Unicamp