O conceito de sustentabilidade está relacionado à capacidade de um sistema em propiciar meios de subsistência à determinada população em intervalos espaço/temporais definidos. De forma simplificada, um sistema auto-sustentado pode ser caracterizado por apresentar um equilíbrio dinâmico – balanço espaço/temporal – entre suas necessidades e os meios de sustentação necessários. Especificamente quanto ao setor de papel e celulose, a implementação de um programa de desenvolvimento sustentado está relacionada à gestão da base de recursos e à interação com os agentes sociais associados aos processos de produção de matéria-prima, transformação e comercialização dos produtos.
A aplicação do conceito de desenvolvimento sustentado representa estratégia semelhante a medicina ou odontologia preventivas. Procura-se antever a incidência de determinado problema com o estabelecimento de estratégia pró-ativa. À semelhança dos resultados espelhados pela área de saúde, os custos globais tornam-se gradativamente menores em função do aumento progressivo da produtividade e da redução dos gastos em ações acauteladoras e corretivas. Tal fato, por si só, justifica a operacionalização deste conceito. Ademais, a melhoria dos níveis de qualidade de vida tende a propiciar condições objetivas de aprimoramento do próprio processo produtivo. Mais do que truísmos, estas afirmações correspondem a resultados derivados da experiência em outros setores produtivos, a exemplo do setor automobilístico japonês, o qual deve sua capacidade produtiva e competitiva, em grande parte, à redução global dos custos sociais e concomitante melhoria das condições de vida das populações direta e indiretamente envolvidas.
Dois fatores impulsionam, adicionalmente, a adoção de estratégias de desenvolvimento sustentado para o setor de base florestal: aumento crescente da pressão social; e necessidades objetivas de inovação tecnológica.
Considerando um setor produtivo específico, a idéia de desenvolvimento sustentado estabelece as bases operacionais sobre as quais são projetadas soluções de continuidade mais favoráveis. Um programa de desenvolvimento sustentado para o setor florestal é concebido de forma a permitir a manutenção dos processos produtivos por períodos mais longos e a custos relativamente estáveis. Tal assertiva não deve implicar, necessariamente, aumento constante dos níveis de produtividade, mas, sobretudo, otimização dos processos envolvidos.
A exploração florestal adquire contornos específicos de acordo com os ecossistemas e sistemas de paisagens considerados. Florestas de produção instaladas em regiões de clima temperado apresentam condicionantes ambientais características e diferenciadas daquelas encontradas em regiões tropicais. A observação dos sistemas de florestas naturais nestas regiões nos remete a estabelecer igual paralelo para sistemas introduzidos ou diretamente manejados pelo homem. A implantação de florestas de produção em diferentes zonas climáticas assume características próprias, demandando ações de planejamento e manejo ambiental particulares.
No caso da América Latina, onde é registrada significativa diversificação do ambiente, a observância das características locais /regionais torna-se mais crítica. Não obstante, os sistemas de produção florestal apresentam características estruturais e de manejo semelhantes, os reflexos sobre o ambiente circunvizinho e a dinâmica sócio-econômica ocorrem de maneira diferenciada.
Fator de particular importância refere-se à biodiversidade instalada ou preexistente em determinada região ora ocupada por empreendimentos florestais. Regiões de climas temperados apresentam diversidade mais reduzida quando comparadas a zonas tropicais. Empresas florestais instaladas em tais regiões tendem a proceder ao manejo de áreas mais extensas, assumindo estratégia mista – exploratória / extrativista.
Dois fatores fundamentam a adoção desta estratégia: menor produtividade, induzida por fatores climáticos e resultantes biofísicas, estabelece a necessidade de áreas mais extensas para sustentação da atividade produtiva; menor diversidade da cobertura florestal introduz parâmetros estruturais que propiciam o estabelecimento de planos de manejo e exploração com base em espécies endógenas ou exóticas.
Por serem áreas normalmente de menor densidade demográfica, os reflexos sobre a estrutura social são menos extensos, à exceção do deslocamento de comunidades indígenas e da inserção de pólos migratórios regionais. A exploração de recursos florestais apresenta-se como alternativa econômica viável, frente à baixa disponibilidade de oportunidades – menor potencial de diversificação do setor primário.
Impactos
Outra questão relacionada a exploração de recursos florestais reporta-se às modificações observadas em escala planetária. Destas, a mais cogitada trata das mudanças climáticas, em especial quanto ao chamado efeito-estufa. O papel da conservação de grandes maciços florestais na manutenção dos climas globais permanece como elemento de intensas investigações. As primeiras indicações apontam para a importância destes ecossistemas na manutenção dos padrões climáticos em escala local/regional, apresentando, ainda, influência significativa nos padrões globais de circulação atmosférica. Todavia, muito resta a ser investigado para que possamos estabelecer relações mais consistentes. Em especial, a questão da escala de diferentes fenômenos atmosféricos e sua relação com a cobertura vegetal permanece como incógnita em grande parte das investigações atualmente desenvolvidas.
Tema amplamente discutido refere-se à possibilidade de aprisionamento de parte das emissões de CO2, a partir da implantação e manutenção de grandes maciços florestais. Esta questão é uma das que apresentam grande controvérsia na comunidade científica, visto restar uma série de aspectos a serem esclarecidos quanto ao ciclo de carbono em ecossistemas florestais. Como grande parte dos ecossistemas florestais com alta produtividade reporta uma taxa de produção/respiração muito próxima à unidade, a possibilidade de aumento do aprisionamento de carbono simplesmente pela manutenção de maciços florestais naturais parece improvável.
A implantação de florestas antrópicas para fins de aprisionamento de carbono merece atenção, embora apresente muitas incertezas quanto à viabilidade econômica de tais ações e a escala necessária para que sejam alcançados os efeitos desejados. Um estudo mais detalhado do ciclo de produção de papel e produtos correlatos pode elucidar algumas questões à medida que torna possível o estabelecimento de períodos médios de aprisionamento. É necessária, neste caso, uma análise pormenorizada quanto a matriz energética empregada durante todo o ciclo de transformação, de forma a que seja possível constatar fontes secundárias de emissão de poluentes – em especial daqueles responsáveis pelo efeito-estufa.
Grande parte dos sistemas de produção florestal estabelecidos na América Latina obedece a padrões estruturais e de manejo similares. São constituídos por plantações homogêneas, geralmente compostas por clones de espécies de crescimento rápido. Os procedimentos de manejo apresentam intensa entrada de energia, sendo diretamente dependentes da matriz energética clássica, a qual pressupõe alta disponibilidade de recursos para manutenção e exploração das florestas de produção. O sistema de exploração é intensivo, efetuando-se, geralmente, o corte raso em ciclos variáveis de 6 a 15 anos.
O modelo de produção florestal segue as assertivas estabelecidas pela revolução verde, tendo como referencial básico a maximização da produtividade imediata por área trabalhada. Muito embora o manejo florestal envolva períodos mais longos, as aspirações são essencialmente imediatistas, reportando-se ao planejamento estanque das atividades de manejo e ao reconhecimento da disponibilidade e manutenção dos recursos naturais necessários.
Os planos de manejo adotam, em sua maioria, uma abordagem reducionista quanto à questão ambiental, ficando restritos apenas aos aspectos silviculturais. A manutenção e a maximização da produtividade são definidas como elementos centrais destes modelos de produção florestal, sendo abordadas em segundo plano a qualidade ambiental, a estabilidade sócio-econômica e a preservação de bens culturais e antropológicos.
As abordagens a questões ambientais ao manejo florestal estão voltadas, em sua maior parte, ao atendimento de exigências estabelecidas por órgãos governamentais. Mais recentemente, com maior mobilização da opinião pública nacional e internacional em torno da conservação ambiental, as empresas do ramo florestal têm se deparado com crescentes pressões, muitas vezes refletidas em restrições de mercado. A análise do processo produtivo está voltada, no entanto, para a sustentação dos níveis de produção, apresentando como objetivo principal a manutenção da capacidade competitiva frente a diferentes mercados.
A introdução de espécies exóticas, muito embora tenha despertado certa combatividade por parte de grupos ambientalistas, apresenta-se como solução imediata para o demanda industrial por produtos madeireiros. A constituição de florestas homogêneas, principalmente com base na biotecnologia (seleção genética e clonagem), tem permitido a redução relativa das áreas diretamente exploradas por meio do aumento da produtividade por área plantada e da qualidade e homogeneidade dos produtos florestais obtidos. A formação de florestas de produção derivadas do processo de seleção genética e clonagem tem se mostrado como tecnologia viável tanto em ambientes tropicais quanto em temperados.
Autores: Alexandre Grimaldi de Castro - doutor em Ciências da Engenharia Ambiental do Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada da Escola de Engenharia de São Carlos, da Universidade de São Paulo Sérgio Morrot - engenheiro agrônomo, e consultor independente da Morrot & Associados Consultoria Ambiental. Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo. |