O uso da madeira na forma de “serrados” foi o primeiro produto industrializado utilizado para construção civil, naval e fabricação de móveis e utensílios domésticos. Os produtos obtidos pelo processamento primário das toras através de desdobro em serras passaram a ser re-processadas em madeiras de melhor qualidade superficial e dimensional para usos específicos, com emprego de técnicas de secagem e equipamentos de usinagem da madeira, visando agregar valor aos produtos de madeira.
O desenvolvimento tecnológico do setor de indústrias de base florestal, aliados ao crescimento populacional e à evolução sócio-econômica mundial, resultou no aumento da demanda por produtos de madeira. Diante deste cenário, houve a necessidade de maior oferta volumétrica de produtos, conciliando ainda os fatores qualidade e custos, para finalidades de usos mais diversas da madeira. Começaram então os estudos sobre painéis de madeira, fabricados através de processos de colagem de lâminas, tábuas, sarrafos, partículas e fibras de madeira, para fazer frente a esta necessidade crescente de demanda por produtos de madeira.
O primeiro tipo de painéis de madeira foi o compensado multilaminado que surgiu no início do século XX. O painel compensado passou a ser utilizado em larga escala, tendo em vista suas vantagens tecnológicas como maior largura, restrição dos fatores anisotrópicos da madeira nas direções de crescimento tangencial e radial e melhor distribuição dos defeitos naturais e resistência da madeira nos planos longitudinal e transversal. Em princípio, as madeiras utilizadas na produção de compensados eram as espécies nativas de baixa densidade, tendo em vista a facilidade de laminação no torno desfolhador.
No Brasil, as indústrias de compensados surgiram na década de 30 e, durante a segunda guerra mundial, teve seu crescimento impulsionado para abastecer o mercado americano e europeu. No sul do país, onde se concentravam as grandes indústrias, a principal espécie empregada na produção de painéis compensados era a Araucária angustifólia – pinheiro do paraná. A partir da década de 70, com o esgotamento da madeira de araucária para uso industrial, as indústrias de compensados começaram a investir em transferência de suas unidades produtoras para as regiões centro-oeste e norte do país, em busca de madeiras tropicais como fonte de matéria-prima. As espécies como virola e sumaúma, foram as mais empregadas na produção de compensados de madeira tropical.
A partir da década de 80, com a maturação das florestas plantadas, as indústrias de base florestal no Brasil passaram por um processo de transformação em termos de matéria-prima, produtos e processos produtivos. A base da matéria-prima madeira que era quase que totalmente oriunda de florestas nativas passou a ser substituídas pelas florestas plantadas de rápido crescimento, especialmente a de pinus e eucalipto. As espécies do gênero Pinus (taeda e elliottii) foram as primeiras a serem utilizadas para substituição de madeiras nativas para fabricação de produtos sólidos e reconstituídos, face às suas características tecnológicas e disponibilidade.
Atualmente, a madeira de pinus é utilizada na produção de madeiras serradas e beneficiadas, laminados e compensados, aglomerados, MDF e OSB. No entanto, as estatísticas recentes têm demonstrado que a relação oferta / demanda pela madeira de pinus está atingindo a exaustão, com redução significativa da disponibilidade de florestas com árvores “maduras” para processamento industrial, especialmente àquelas indústrias que requerem toras de maiores diâmetros como as laminadoras.
Várias alternativas têm sido estudadas para suprir a demanda pela madeira de pinus por outras espécies alternativas de rápido crescimento. Neste cenário, as espécies de eucalipto, que ocupam uma grande área de florestas plantadas, principalmente nos Estados de Minas Gerais e São Paulo, são apontadas como uma das fontes para suprimento das indústrias de base florestal. As grandes áreas de plantios de eucalipto existentes hoje foram plantadas, inicialmente, visando o suprimento das indústrias siderúrgicas que utilizam carvão vegetal. Uma parte significativa é utilizada como matéria-prima pelas indústrias de papel e celulose, e painéis de fibras duras e isolantes. No entanto, a sua utilização como madeiras serradas e beneficiadas, lâminas e compensados, e outros tipos de painéis reconstituídos de maior valor agregado, é ainda muito recente e carente de estudos tecnológicos.
As espécies do gênero Eucalyptus têm sua origem na Austrália e ilhas da Oceania e se caracterizam por serem árvores de grande porte e de rápido crescimento. Estima-se que na Austrália existem cerca de 720 espécies de eucalipto, das quais aproximadamente 100 são utilizadas para obtenção de produtos de madeira. No Brasil, as espécies do gênero eucalipto foram introduzidas por Edmundo Navarro de Andrade no início século XX no Estado de São Paulo. Desde então uma grande variedade de espécies têm sido estudadas a nível experimental e algumas já consolidadas para plantios em florestas de produção. Dentre as espécies mais utilizadas em plantios comerciais destacam-se o Eucalyptus grandis, Eucalyptus saligna, Eucalyptus citriodora e clones de várias espécies com características desejáveis sobre ponto de vista silvicultural e para produção de madeira.
Principais Espécies
Eucalyptus grandis: é uma espécie natural do norte de Nova Gales do Sul e ao sul de Queensland, entre as latitudes 25 e 33º Sul. Na área de maior ocorrência, as altitudes variam desde próximas ao nível do mar até 600 m e entre 500 e 1.100 m nas áreas mais ao norte. O clima varia de subtropical úmido (área sul) ao tropical úmido. Na principal área de ocorrência, a temperatura média das máximas do mês mais quente está na faixa de 24 a 30ºC, e a média das mínimas do mês mais frio de 3 a 8ºC. Nos locais de maior altitude, podem ocorrer geadas ocasionais. A precipitação média anual está em torno de 1.000 a 3.000 mm, com maior precipitação no verão, principalmente no centro e no norte de Queensland. A madeira de Eucalyptus grandis é de tom branco rosado, é leve e apresenta bom comportamento em principais operações de usinagem, indicando um alto potencial para o setor de madeira serrada e moveleiro. O E. grandis é considerado entre os melhores eucaliptos para movelaria e proporciona uma boa colagem e acabamento superficial. No Brasil, a madeira de E. grandis é utilizada para produção de formas de concreto, carpintaria, estruturas de telhados, caixaria, embalagens e pallets. Em menor escala, são produzidos móveis rústicos, estrados para camas, forros, cabos, vigas laminadas, escadas, molduras de móveis, brinquedos, entre outros.
Eucalyptus dunnii: é uma espécie natural da região nordeste da Austrália, situada entre as latitudes de 18 a 30º e altitudes de 300 a 780m. O clima é subtropical úmido com temperaturas mínima e máxima variando de 0 a 30ºC, com ocorrência de 20 a 60 geadas por ano. A região tem uma precipitação média anual de 1.000 a 1.750mm, com as máximas no verão, sendo a precipitação mensal sempre superior a 40mm e a estação seca no inverno não excede a três meses. Embora em pequena escala, no Brasil, os plantios de Eucalyptus dunnii estão localizados nos Estados de Santa Catarina e Paraná. A grande vantagem desta espécie de eucalipto é a maior resistência a geadas, além do rápido crescimento das árvores. A sua madeira já é utilizada pelas indústrias de Santa Catarina, principalmente na forma de serrados e algumas aplicações como laminados. Com relação às características tecnológicas da madeira de Eucalyptus dunnii, com idade em torno de 20 anos, alguns pesquisadores recomendam a sua aplicação para fins estruturais que requerem maiores resistências mecânicas, tais como assoalhos, parquetes, carrocerias, cabos de ferramentas, etc.
Eucalyptus saligna: é uma espécie natural da região sul de Queensland na Austrália e do litoral de New South Wales, com latitudes entre 28 a 35ºS, a altitudes variando do nível do mar até 1.000m. A precipitação pluviométrica anual varia de 800 a 1.200 mm com chuvas distribuídas durante todo o ano e mais concentradas no verão. A temperatura média máxima varia entre 28 a 30ºC e temperatura média mínima entre 3 a 4ºC. A sua madeira é muito similar à de E. grandis, sendo medianamente leve e fácil de ser trabalhada em operações de usinagem. A sua madeira é destinada principalmente para construção civil e fabricação de móveis. As árvores mais jovens são utilizadas na produção de celulose, chapas duras, aglomerados, carvão, etc.
Eucalyptus maculata: é uma espécie natural de regiões próximas do litoral de New South Wales e Queensland na Austrália, nas latitudes entre 25 a 37ºS e altitudes variando desde o nível do mar até 800m. A precipitação pluviométrica média anual varia de 625 a 1.250mm, com chuvas bem concentradas no verão. A temperatura média máxima varia entre 22 e 35ºC e a temperatura mínima média entre 2 e 5ºC. A madeira é levemente pesada, apresenta boa estabilidade dimensional e média permeabilidade. As principais utilizações são para serrarias, laminação, movelaria, construções, lenha e carvão.
Eucalyptus robusta: é uma espécie natural do litoral de New South Wales e no sul de Queensland, nas latitudes de 23 a 36ºS e altitudes próximas ao nível do mar. A precipitação pluviométrica média anual varia de 1.000 a 1.500mm, com chuvas concentradas no verão. A temperatura média máxima varia entre 30 a 32ºC. A sua madeira é considerada moderadamente leve e apresenta estabilidade dimensional e permeabilidade média. É muito utilizada na produção de lâminas, componentes estruturais para construção civil, além de caixotaria, postes, dormentes, lenha e carvão.
Eucalyptus cloeziana: é uma espécie natural das regiões norte e central de Queensland, na Austrália, em altitudes variando de 60 a 900m. A precipitação pluviométrica média anual varia de 1.000 a 1.600 mm, com chuvas concentradas no verão. A temperatura média máxima fica em torno de 29ºC e a temperatura média mínima varia de 9 e 12ºC. A sua madeira é levemente pesada e apresenta elevada estabilidade dimensional e média permeabilidade. É utilizada principalmente em serraria, caixotaria, dormentes, postes, lenha e carvão.
Eucalytpus citriodora: é uma espécie natural das regiões norte e central de Queensland, na Austrália, principalmente em latitudes de 15,5 a 25ºS e em altitudes variando de 80 a 800m. A precipitação pluviométrica média anual varia de 625 a 1.000 mm, A temperatura média máxima varia de 29 a 35ºC e a temperatura média mínima varia de 5 a 10ºC, onde praticamente não ocorrem geadas. A sua madeira é considerada pesada com elevadas resistências mecânicas. Apresenta elevada estabilidade dimensional e baixa permeabilidade. É muito utilizada em componentes estruturais para construção civil, caixotaria, dormentes, postes, lenha e carvão.
Eucalyptus viminalis: é uma espécie natural dos estados de New South Wales, Victoria e Tasmânia, nas latitudes entre 28 e 43,5ºS e altitudes variando desde o nível do mar até 1.500m. A precipitação pluviométrica média anual varia de 625 a 1.400 mm, com chuvas distribuídas por todo o ano. A temperatura média máxima não ultrapassa 21ºC e a temperatura média mínima varia de 1 a 4ºC. As geadas podem ocorrer com intensidade de 5 a 60 dias por ano. A sua madeira é considerada levemente pesada e apresenta baixa estabilidade dimensional e média permeabilidade. É utilizada principalmente para caixotaria, escoras, mourões e lenha.
Eucalyptus tereticornis: é uma espécie natural de uma ampla faixa que compreende os estados de New South Wales, Queensland, Victória e até Papua Nova Guiné, entre as latitudes de 6 a 38ºS, com altitudes variando de nível do mar até 1.000m. A precipitação pluviométrica média anual varia de 500 a 1.500 mm. A temperatura média máxima varia de 22 a 32ºC e a temperatura média mínima varia de 2 e 12ºC. A sua madeira é considerada moderadamente pesada e apresenta relativa estabilidade dimensional e média permeabilidade. São utilizadas principalmente para laminação, serraria, componentes estruturais para construção civil, caixotaria, dormentes, postes, lenha e carvão.
Tensões de Crescimento
Uma das limitações do uso de espécies de Eucaluptus spp são as elevadas tensões internas de crescimento, principalmente em toras de menores diâmetros obtidas de árvores mais jovens. Estas tensões se manifestam após o abate da árvore e traçamento em toras, resultando em fendas a partir do topo e seu uso na forma de madeira sólida é muito prejudicado em função da alta instabilidade dimensional e baixo rendimento das toras. Para minimizar os efeitos da instabilidade dimensional das peças, uma das alternativas apontadas é a fabricação de produtos reconstituídos de madeira através do processo de colagem, como painéis colado lateralmente, compensados multilaminados, compensados sarrafeados, aglomerados, etc. A inclusão da ligação adesiva entre as peças de madeira atua como fator de restrição à sua instabilidade dimensional, além de contribuir para o aumento na gama de utilização da madeira de eucalipto em produtos de melhor qualidade e de maior valor agregado.
Estudos visando redução dos efeitos das tensões de crescimento em madeiras de eucalipto têm sido realizados amplamente, desde as operações de derrubada da árvore até o processamento industrial. Dentre os métodos para minimizar os efeitos das tensões de crescimento em eucalipto destacam-se o anelamento da árvore antes da derrubada e seccionamento do tronco em toras, aplicação de selantes no topo, armazenamento sob aspersão e imersão total das toras, vaporização das toras, uso de conectores tipo “gang nail” nos topos das toras, entre outros.
Três aspectos importantes devem ser considerados no uso da madeira de eucalipto:
aplicação de métodos para minimização dos efeitos das tensões de crescimento;
uso da tecnologia de colagem para reduzir os efeitos da instabilidade dimensional da madeira;
valorizar as características vantajosas da sua madeira como maior densidade, resistência e durabilidade.
Processo Produtivo
Os painéis compensados são classificados como multilaminados e sarrafeados. Os compensados multilaminados são produzidos através da colagem de lâminas sobrepostas de forma cruzada em número ímpar de camadas e consolidados através de prensagem a quente. Nos painéis sarrafeados o miolo é constituído por sarrafos e as faces superior e inferior compostas de uma lâmina cruzada e revestimento com capa e contracapa, normalmente de lâminas decorativas.
O processo de produção de painéis compensados multilaminados envolve as etapas de preparação de lâminas de miolos e capas, preparação e aplicação da cola, montagem do painel, prensagem a quente e acabamento. Para obtenção de painéis de boa qualidade é primordial o controle dos parâmetros em todas as etapas do processo produtivo. Os principais parâmetros de controle são:
teor de umidade das lâminas;
teor de sólidos, viscosidade e gramatura da batida de cola;
composição balanceada do painel em função da espécie e espessuras das lâminas;
tempo de carregamento, temperatura, pressão específica e tempo de prensagem;
espessura, largura e comprimento dos painéis.
Pesquisas Sobre Painéis
Resultados dos ensaios de flexão estática e cisalhamento da linha de cola de painéis compensados de Eucalyptus spp.
As diferenças nos valores das propriedades entre as fontes citadas podem ser atribuídas às pequenas variações nos parâmetros do processo de manufatura dos painéis a nível laboratorial. Essas variações se referem principalmente ao tipo, formulação e gramatura da batida de cola; temperatura e tempo de prensagem.
Encontram-se ilustrados anexos painéis compensados de algumas espécies de eucalipto produzidos em laboratório. Podem ser observadas as diferentes tonalidades de cores e de desenho do lenho como elementos atrativos para fins decorativos, além dos aspectos referentes à resistência mecânica e durabilidade.
Painéis experimentais de algumas espécies de eucalipto.
Setsuo Iwakiri
Engº Florestal, Doutor em Tecnologia de Produtos Florestais;
Professor titular – DETF/UFPR
José Guilherme Prata
Engº Florestal, Doutorando - PPGEF/UFPR
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