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REVISTA DA MADEIRA - EDIÇÃO N°108 - OUTUBRO DE 2007

Usinagem

Usinagem da madeira na indústria de móveis

Devido à baixa competitividade da indústria de móveis do Brasil muitos estudos estão sendo direcionados para a melhoria dos processos de usinagem da madeira como forma de promover melhorias no sistema produtivo, reduzindo desperdícios e melhorando a eficiência e a competitividade dos produtos.

A utilização de novas espécies para fabricação de móveis passa pelo conhecimento da melhor forma de utilizar a madeira. Para isso, a identificação dos fatores tecnológicos responsáveis pela má utilização desses recursos é fundamental para alcançar melhorias nos indicadores de qualidade e produtividade. O estudo do comportamento das diferentes espécies de madeira perante os processos de usinagem como serramento, fresamento e furação e as interações dos fatores inerentes às ferramentas e às condições de corte que contribuem mais intensamente para a melhoria desses processos são os motivos deste estudo.

A falta de competitividade na indústria de móveis brasileira, quando comparada aos grandes centros exportadores do setor, aponta para causas como ausência de design próprio, falta de certificação da madeira, organização industrial excessivamente verticalizada e baixa eficiência dos processos de transformação da madeira em peças e componentes. Esse quadro é mais evidente nos segmentos de móveis residenciais, confeccionados a partir da usinagem da madeira maciça.

A obtenção de dados sobre o desempenho dos processos de fabricação mostra que a atividade apresenta altos índices de rejeição e desperdício de matéria-prima, baixo valor agregado, baixa eficiência e se reflete na ausência de estratégias que busquem a melhoria desses indicadores. A causa deste cenário sombrio é a má gestão dos recursos produtivos, principalmente em empresas de pequeno e médio porte. Para reverter este quadro há necessidade de integração entre o projeto de produtos e um sistema eficaz de gestão do processo.

A melhoria da competitividade das indústrias de móveis no Brasil passa pelo conhecimento dos fatores de sucesso do produto. A pequena participação do Brasil no comércio mundial de móveis está relacionada a alguns fatores básicos como ausência de design próprio e mais atraente, organização industrial pouco desenvolvida, cultura industrial atrasada, ausência e certificação da madeira, ausência de estratégias comerciais competitivas e tecnologia de fabricação ineficiente, gerando maiores custos de produção e altos índices de perdas na produção, além do baixo nível da qualidade final dos produtos.

De acordo com pesquisas, o design é o resultado de um processo amplo e envolve etapas de concepção do produto em função da facilidade de produção, manutenção e uso, apelo mercadológico, funcionalidade, competitividade e custo de produção e venda. No processo de produção, o design é uma atividade importante na estratégia empresarial, que visa fixar a marca do produto no mercado e estreitar o relacionamento entre empresa e consumidor.

O conhecimento das propriedades das madeiras utilizadas na fabricação de móveis também é citado em vários estudos sobre a competitividade da indústria do mobiliário. A determinação dessas propriedades e de seu comportamento durante a usinagem é de fundamental importância para a sua correta utilização, assim como da melhor seleção de espécies e do bom dimensionamento de máquinas e ferramentas utilizadas na sua usinagem. Vários estudos sobre a qualidade da madeira e suas propriedades têm sido desenvolvidos ao longo dos anos. Nesses estudos são relacionadas várias propriedades físicas, mecânicas, anatômicas e organolépticas da madeira com o desempenho dos processos de usinagem e a qualidade das peças obtidas durantes estes processos.

Entretanto, para a melhoria dos indicadores de competitividade do setor, antes da introdução do design próprio e do conhecimento das propriedades da madeira é importante que as empresas avancem na capacidade de manufatura, de forma a conseguirem produtos de baixo custo, elevada qualidade e flexibilidade produtiva. Para isso, é importante conhecer o comportamento dos processos de usinagem, responsáveis pela transformação da madeira em peças e/ou componentes de móveis.

Processo produtivo

Muitos trabalhos de pesquisas são dedicados ao estudo dos processos de usinagem da madeira. Outros estudos relacionam a geometria e material da ferramenta, condições de corte e propriedades da madeira. Estes estudos fazem o levantamento de indicadores das áreas de atuação para obter-se a melhoria dos processos produtivos. Porém, não estabelecem valores de referência para que orientem a manutenção das variáveis envolvidas na usinagem da madeira dentro dos limites de controle do processo.

Várias outras pesquisas direcionadas para os processos básicos de usinagem e seus avanços, incluindo estudos da interação entre material da ferramenta e material da peça, o desenvolvimento de máquinas utilizadas no processamento da madeira, os métodos de avaliação da qualidade da superfície usinada utilizando mecanismos ópticos, o monitoramento e controle dos processos utilizando indicadores como potência consumida, emissão acústica e, por fim, a avaliação do efeito das propriedades da madeira sobre o desgaste da ferramenta.

Dependendo das características da ferramenta vários resultados são afetados, tais como vida útil, produtividade e qualidade da peça usinada. Essas características são, basicamente, a geometria e o material da ferramenta. Além disso, irão influir decisivamente as condições de corte para cada espécie de madeira. No entanto, há carência de informações sobre os mecanismos de desgastes envolvidos nas diferentes combinações ferramenta-peça. A geração dessas informações facilita a produção de ferramentas adequadas a cada necessidade, ou seja, orientam o desenvolvimento de parâmetros ótimos no desenvolvimento e uso de cada ferramenta para usinagem de determinadas espécies de madeira.

Os principais ângulos para definição da geometria da ferramenta são o ângulo de saída (?o) e o ângulo de folga (?o). Essas pesquisas ressaltam que a geometria das ferramentas possui uma grande influência sobre o acabamento da superfície da peça usinada e sobre a vida útil da ferramenta. Por isso, a importância em desenvolver estudos com a finalidade de otimizar estas características.

Muitos fatores podem influir na usinabilidade da madeira. Entre eles variáveis dependentes da ferramenta, da peça e do processo. Para avaliar a usinabilidade são utilizados vários critérios. Entre os mais importantes para indústria madeireira a vida entre duas afiações sucessivas, expressa em unidade de tempo, e a qualidade da superfície da peça usinada. Os valores estabelecidos para cada critério dependem das combinações entre a espécie de madeira, o material da peça, geometria e material da ferramenta e as condições de corte. A determinação do ponto de troca da ferramenta é decisiva para a melhoria da produtividade, pois o número de setups depende deste fator além do mix de produtos.

Nas pesquisas sobre a usinabilidade da madeira Bonduelle consta que para obter ganhos de qualidade e produtividade na usinagem é necessário otimizar o compromisso da qualidade da superfície usinada versus o desgaste do gume. Por isso, é necessário conhecer as condições de corte e geometria das ferramentas para cada espécie de madeira que conduzam a esta solução de compromisso.

A análise da relação da qualidade da superfície da madeira usinada com as condições de corte é, também, muito importante para melhoria dos processos. Neste sentido, alguns métodos aplicados na usinagem de metais, podem ser aplicados na usinagem da madeira. A avaliação da qualidade da superfície usinada é um fator importante no monitoramento e controle dos processos de usinagem.

Tanto na usinagem de metais como na usinagem de madeiras, alguns estudos utilizaram para a quantificação da qualidade da superfície usinada parâmetros como a profundidade média de rugosidade (Rz), que representa os desvios medidos nos perfis da superfície. Para determinar os parâmetros de rugosidade foram utilizadas a varredura por apalpador (método com contato) e a triangulação por Laser (sem contato) para geração de imagens 3 D.

Outro método utilizado para avaliação da qualidade da superfície é a análise do cavaco formado durante a usinagem da madeira. Neste método, os tipos de falhas na formação do cavaco foram relacionados, por pesquisadores, às condições de corte, geometrias da ferramenta, potência de corte e propriedades da madeira.

No Brasil, apesar dessas tecnologias, a técnica utilizada para avaliação da qualidade da superfície em condições de laboratório, ainda é baseada na norma ASTM D1666, que é essencialmente subjetiva baseada na análise qualitativa e na experiência do analista da qualidade. No ambiente fabril, o controle da qualidade da superfície ainda é pior, baseado apenas na avaliação visual e no tato.

Processos de uninagem

As atividades de transformação da madeira nas fábricas de móveis se caracterizam por diversos tipos de processos de usinagem, como: serramento, fresamento e furação, diferenciando-se de acordo com a função que a peça ou componente exercerá na montagem dos móveis.

A seqüência de operações varia de acordo com a rotina de operações estabelecida para a produção de cada peça e não segue necessariamente a seqüência apresentada. O seqüenciamento das operações depende da estrutura do produto, do modelo de organização utilizado (layout) e da programação da produção dimensionada de acordo com as capacidades dos recursos produtivos.

Um dos principais problemas enfrentados pelos fabricantes de móveis é a baixa liquidez dos investimentos devido à elevada imobilização de capital em máquinas, equipamentos e estoques de matéria-prima e produtos semi-acabados ou em processo. Por isso, a redução dos tempos improdutivos devido a paradas por quebras de ferramentas ou para trocas muito freqüentes pode contribuir para redução do lead time produtivo, aumentando a velocidade de produção e reduzindo os estoques em processo.

Na análise dos resultados a densidade da madeira de várias espécies foi relacionada com as propriedades geométricas das ferramentas, com as condições de corte e com as variáveis de resposta dos processos (índice de rejeição e vida da ferramenta). Foram identificados também os principais problemas enfrentados durante a usinagem dessas espécies, buscando identificar os pontos de melhoria.

O tipo de defeito mais freqüente na usinagem da madeira é a presença de “ferpas” na superfície, conhecido também como “arrepiamento” da superfície. Para reduzir a freqüência deste tipo de defeito é necessário aumentar os ângulos de saída e verificar o grau de arredondamento do gume (raio do gume) evitando ultrapassar o limite de desgaste admissível para, deste modo, manter o “fio” de corte.

As operações que apresentaram a maior freqüência de avarias nas ferramentas foram o aplainamento, o corte longitudinal (serramento) e o fresamento de perfil.

A principal avaria nas operações de usinagem está relacionada à quebra ou lascamento do gume devido, principalmente, à utilização de geometrias e condições de corte impróprias para as diferentes espécies de madeira. A utilização de geometrias com gumes muito vivos propiciou um aumento da freqüência de avarias. As avarias aumentaram devido à baixa rigidez do gume, principalmente quando cortam madeiras duras com profundidades incompatíveis com a geometria do gume. O desgaste na face aparece em segundo lugar como a causa de paradas para troca de ferramentas. Em terceiro, foi citado o desgaste na face frontal do dente.

Na análise do fluxo de fabricação, foi possível constatar que, dentre as operações aqui estudadas, o fresamento foi considerado pelos fabricantes de móveis, como a operação que causa a maior limitação de capacidade, ou seja, esta operação é considerada o gargalo. Por isso, é importante dimensionar as propriedades de ferramentas e condições de corte para que sejam minimizados as paradas para a troca de ferramentas causadas por desgaste e quebra de ferramentas neste grupo de operações.

A velocidade de corte tem grande influência sobre o aumento ou redução do tempo de ciclo, uma vez que com o aumento da velocidade de corte, há uma diminuição do tempo de máquina e, conseqüentemente, o tempo necessário para usinar uma peça, ou seja, o tempo de ciclo.

Sobre o critério utilizado para determinação da vida útil das ferramentas, a maioria das empresas pesquisadas afirmou que utilizam a perda da qualidade e precisão de corte e o raio do gume como critério para definição do fim de vida da ferramenta nos processo de usinagem.

A decisão sobre a escolha das configurações das ferramentas e condições de corte envolve uma solução de compromisso, onde se busca conciliar a melhor qualidade do componente, ou seja, o menor índice de rejeição e de perdas com a máxima velocidade de produção, buscando obter ganhos de escala. A avaliação do ponto ótimo depende de uma análise econômica da operação de modo a obter a máxima produção com o menor desgaste da ferramenta, evitando assim, paradas muito freqüentes para troca da ferramenta.

De acordo com a análise da matriz de correlações, as variáveis relacionadas à geometria da ferramenta que têm maior influência sobre a vida da ferramenta são: o diâmetro da ferramenta (D), o ângulo de saída (?), o número de dentes da ferramenta (Z). A velocidade de corte (vc) também é importante para o controle do desgaste.

O índice de rejeição foi afetado, principalmente pela velocidade de avanço da peça (vf) e pelo ângulo de folga (?). Controlando estas variáveis e mantendo-as dentro dos limites de controle é possível obter melhorias na qualidade da superfície usinada.

Quanto maior o ângulo de folga, menor o índice de rejeição. Porém, maior a probabilidade de quebra e maior o desgaste da ferramenta (menor a vida da ferramenta). Da mesma forma, quanto maior a velocidade de corte, melhor a qualidade, porém maior o desgaste. De modo inverso, quanto menor a velocidade de avanço, melhor a qualidade do corte, mas maior o desgaste da ferramenta.

A seleção da melhor velocidade de corte e melhor velocidade de avanço irá depender da melhor relação entre o desgaste e índice de rejeição para cada espécie de madeira, buscando, conciliar os aspectos da manutenção das variáveis de controle dentro dos limites aceitáveis de qualidade e produtividade estabelecidos por cada empresa. A Figura mostra uma relação aproximada a esta para a madeira de jequitibá, obtida no processo de corte transversal. Relações deste tipo também podem ser obtidas para as demais espécies de madeira e distintos processos de usinagem.

O conhecimento da influência da massa específica da madeira também é um fator importante para a melhoria do desempenho dos processos. A Figura mostra a relação da vida da ferramenta com a massa específica. Quanto maior a massa especifica, maior o desgaste, porém, somente até um ponto próximo a massa específica igual a 0,61 g/cm3 a partir do qual a vida da ferramenta praticamente não é afetada pelo aumento da massa específica. Isso pode ser justificado pela menor variação das dimensões dos elementos anatômicos constituintes do lenho de madeiras mais duras em relação a madeiras de menor densidade onde é grande a variação dimensional das células.

O desgaste das ferramentas nos processos de usinagem está intimamente relacionado ao diâmetro do cabeçote, profundidade de corte e o número total de gumes da ferramenta. Além disso, parâmetros da geometria, velocidade de corte, propriedades da madeira e classe do metal duro também tiveram influência sobre o desgaste e sobre a qualidade das peças.

Efeito do número de gumes: o número de gumes tem efeito sobre o avanço por dente, o qual tem grande influência na qualidade do corte. Por isso, o dimensionamento do número de gumes e a seleção da melhor velocidade de avanço de acordo com o número de gumes mostraram-se ser os fatores mais importante para a melhoria e o controle dos processos.

Efeito de profundidade de corte: O aumento da profundidade de corte resulta num desgaste maior da ferramenta. Os resultados indicaram um aumento exponencial do desgaste e perda da qualidade com o aumento da profundidade de corte apesar do aumento da produtividade.

Efeito da velocidade de corte: os resultados mostraram que o desgaste da ferramenta foi maior com o aumento da velocidade de corte, porém houve redução no índice de rejeição e maior velocidade de processamento.

Efeito do diâmetro do cabeçote: o desgaste da ferramenta aumentou com o aumento do diâmetro da ferramenta, numa razão próxima a raiz quadrada do curso usinado.

Efeito do material da peça: os efeitos de variações de estrutura e densidade da madeira são significantes. O desgaste da ferramenta para usinagem de madeiras de baixa densidade foi praticamente a metade do desgaste na usinagem de madeiras de alta e média densidade.

A ineficiência na usinagem de madeiras, principalmente quando são introduzidas novas espécies, é uma das causas da abaixa competitividade da indústria de móveis brasileira. Por isso, o presente estudo, contribui com a identificação de alguns parâmetros de usinagem, de modo a melhorar a eficiência produtiva na usinagem de madeiras ainda pouco utilizadas na fabricação de móveis.

Assim, com a identificação das causas do baixo desempenho e da compreensão das relações de causa e efeito entre os parâmetros de usinagem e as medidas de desempenho dos processos é possível ajustar estes parâmetros de modo a obter melhorias na eficiência produtiva e propiciar a introdução e o aproveitamento de novas espécies de madeira, até aqui pouco utilizadas devido o desconhecimento dessas relações, o que permite reduzir o número de avarias de ferramentas ou o aumento da vida da ferramenta e, deste modo reduzir o número de trocas de ferramentas e o tempo improdutivo.

Autores:

Prof. M.Sc. Fernando Cardoso Lucas Filho

Prof. Dr. Lourival Boehs

Contatos: lb@grucon.ufsc.br e fecarlu@pop.com.br

Fonte: Elaborada pela Equipe Jornalística da Revista da Madeira.