Dentre as várias utilidades da madeira do eucalipto, uma das mais recentes é a utilização da mesma na produção do cogumelo shiitake, cientificamente conhecido como Lentinula edodes.
A produção mundial de cogumelos atualmente é de 4 milhões de t/ano com previsões de chegar a 16 a 18 milhões t/ano, até 2012, gerando cerca de US$ 40 a 50 bilhões/ano. O consumo per capta de cogumelos em alguns países da Europa e da Ásia variam de 3 a 3,5 kg/ano. No Brasil, o consumo per capta é estimado em 0,6 kg/ano e a produção ainda é incipiente. As exportações no ano de 2.000 foram de apenas 32 t.
O shiitake (Lentinus edodes) é o segundo cogumelo mais cultivado no mundo e apresenta, além de aroma e sabor agradáveis, alto valor nutricional e componentes que estimulam o sistema imune. Contém, em sua matéria seca, mais de 60% de carboidratos, 23% de proteínas, não é um alimento calórico, tem baixa concentração de gordura e é rico em ferro, fósforo, ácido ascórbico, biotina, tiamina (vitamina B1), riboflavina (vitamina B2) e ergoesterol (vitamina D). Contém quantidades consideráveis de ?-glucanas, componente funcional de grande relevância, além de fibras e minerais.
A técnica de cultivo deste cogumelo foi introduzida no Brasil por imigrantes japoneses e chineses. Sua produção é um exemplo de bioconversão da madeira e de outros materiais ligninocelulósicos, que constituem grande parte da biomassa renovável. Como o shiitake não é nativo do Brasil, foram necessárias algumas adaptações. Tradicionalmente, as madeiras utilizadas no cultivo do shiitake são os carvalhos e as castanheiras, mas no Brasil, os produtores estão substituindo-os por madeiras de eucaliptos, abacateiros e mangueiras. Os eucaliptos têm sido os mais recomendados, não só pelos melhores resultados obtidos, mas também pela facilidade de serem encontrados e também pelo baixo custo.
A escolha da madeira é em função de suas características físicas e químicas e também fatores econômicos e ambientais. A melhor época para o corte das toras é aquela em que as árvores contêm maior quantidade de carboidratos e ácidos orgânicos e que a casca não se solte facilmente. As espécies mais utilizadas são Eucalyptus grandis, E. saligna, E.urophilla e E.globulus, com quatro a cinco anos de idade, para garantir que seu cerne não esteja muito desenvolvido. As toras devem ter diâmetro médio entre 12 e 15 centímetros, por 80 a 100 centímetros de comprimento. Toras com diâmetro menor (5 a 8 cm) têm a vantagem de produzir rapidamente, pois possuem menos lignina, mas usa durabilidade é menor e com tendência de produzir cogumelos com chapéu pequeno e estipe fino. Já as toras com diâmetro superior a 15 cm possuem a durabilidade maior, no entanto tem a casca grossa e cerne grande o que dificulta não só o manejo, mas também há necessidade de maior tempo para a colonização da tora, aumentando a possibilidade de contaminação. Devem ser selecionadas madeiras eretas, sem ferimentos ou galhos. Logo após colhida essas madeiras devem ser transportadas com cuidado, para evitar ferimentos, e armazenadas em local limpo e sombreado. Essas toras podem ficar armazenadas por até uma semana nessas condições.
As toras são, então, perfuradas com broca de meia polegada (1,25 cm de diâmetro) a uma profundidade de dois centímetros de profundidade, mantendo-se a distância de 15 a 20 cm dentro da linha e de 8 a 10 cm entre as linhas, intercalando as posições dos furos. Essas perfurações podem ser feitas por diversos tipos de brocas, mas existem aquelas que foram desenvolvidas para perfurações em madeiras verdes, próprias para cultivo de shiitake. Todo cuidado deve ser tomado para manter a casca intacta, pois ela impede o ressecamento excessivo, além de evitar a contaminação por organismos indesejáveis.
Essas toras inoculadas são empilhadas, em forma de fogueira, em local sombreado, tentando-se manter a umidade do ar em 70 a 90%. Para garantir que as toras não se ressequem são recomendadas regas diárias. Essas pilhas devem ser reviradas em intervalos de 20 a 30 dias, para permitir um desenvolvimento uniforme do fungo em todas as toras, uma vez que as toras que ficam na parte externa e no topo tendem a ficar mais ressecadas, enquanto que as toras mais internas e da base mais úmida.
Após cerca de 150 a 180 dias, deverão aparecer os primórdios, indicando que os cogumelos estão prontos para frutificarem. Realiza-se, então, o choque mecânico e térmico para estimular o desenvolvimento dos cogumelos. As toras são batidas contra o chão (choque mecânico) e, posteriormente, mergulhadas em água fria (choque frio). Após 12 a 24 horas, as toras são retiradas da água e colocadas para formação dos cogumelos. Após 8 a 10 dias esses cogumelos podem ser colhidos.
Apesar do cultivo do shiitake no Brasil ser feito essencialmente, em toras de eucalipto, quase 70% do cultivo desse cogumelo na China é feito em substrato à base de serragem ou outros resíduos ligninocelulósico. A capacidade desse fungo em utilizar resíduos lignocelulósicos para o seu crescimento tem sido explorada com o objetivo de bioconverter materiais potencialmente poluentes em cogumelos comestíveis. Sendo assim os resíduos gerados pela indústria madeireira, que são normalmente desprezados, podem ser utilizados para o cultivo de cogumelos comestíveis, pois estudos atuais têm mostrado que a serragem, ou mesmo a casca de eucalipto, suplementada com farelo de cereais, tem se mostrado eficiente na produção de cogumelos podendo melhorar a renda de produtores rurais que trabalham em sistemas participativos.
Entretanto, o interesse pela produção de cogumelos por pequenos produtores, que buscam alternativas de renda para sua propriedade é crescente e precisa ser orientado de forma organizada e com suporte tecnológico.
Sendo assim, subentende-se que a madeira do gênero Eucalyptus poderá ser a principal matéria-prima para atender a diversos segmentos industriais, na produção de múltiplos produtos de madeira, carvão, celulose e também produção de cogumelos comestíveis. Brasil tem um grande potencial para atender a esse novo mercado, pois possui a maior área plantada de eucalipto do mundo, com aproximadamente 2.920.800 ha.
José de Castro Silva
Cristiane de Castro Santana*
UFV – Universidade Federal de Viçosa |