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Em testes, piso teve desempenho compatível ou superior aos convencionais, mostrando que pode ser alternativa para construção civil
Um novo tipo de piso, feito de madeira residual de reflorestamento e engenheirado com painel de partículas orientadas (Oriented Strand Board em inglês, OSB) pode ajudar a reduzir o desperdício. Aglomerado com resina à base de óleo de mamona e adição de micropartículas de óxido de alumínio (Al₂O₃), o produto foi desenvolvido a partir do doutorado de Romulo Henrique Batista Martins, na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP. Ele também investigou o material para entender o desempenho estrutural em comparação aos pisos engenheirados compensados comerciais. Ensaios mecânicos atestaram resultados similares ou até melhores nos pisos feitos com resíduos de Pinus spp.
Pisos engenheirados são produzidos tradicionalmente com madeira maciça, nobre, ou compensado, materiais de alto valor agregado que exige toras de grande diâmetro. “No entanto, com o advento de materiais engenheirados de madeira, surgiram alternativas como os painéis de madeira reconstituída. Esses painéis são produzidos com resina e pressão, utilizando menos madeira e oferecendo igual ou melhor rendimento que a madeira maciça”, explica o pesquisador. Além disso, a fabricação convencional gera um alto volume de resíduos ao longo da cadeia produtiva, desde o desdobro da madeira até a etapa final de acabamento.
Com a adição de micropartículas de Al₂O₃, apenas a abrasão teve resultados positivos de melhora do desempenho. Ainda, a resina à base de óleo de mamona não solucionou o problema mais comum aos painéis de madeira reconstituída: a alta afinidade por água. “A questão da umidade ainda é um problema que persiste. Embora existam algumas alternativas em desenvolvimento, é uma lacuna que ainda precisa ser preenchida”, explica Martins. Apesar disso, esses resultados negativos não afetam seus usos, já que “eles são mais utilizados em ambientes secos”, continua.
“Dar um novo destino ao que seria considerado lixo, um resíduo inerente ao processamento industrial de madeira, em vez de queimar ou descartar, é interessante para contribuir com o conceito de economia circular” – Romulo Martins
Pisos engenheirados e resistência
Pisos engenheirados, em inglês Engineered Wood Flooring (EWF), são pisos compostos usualmente de três camadas: a camada superficial (lamela), adesivo e uma camada de suporte. No piso desenvolvido por Martins, a camada de suporte foi feita utilizando OSB, um painel estruturado a partir de lascas (strands) de madeira prensadas e orientadas em camadas cruzadas. Em revisão sistemática da literatura nas bases de dados Web of Science e Engineering Village, o pesquisador identificou 26 trabalhos sobre o uso de painéis reconstituídos de madeira como alternativa ao uso de madeira maciça em pisos engenheirados. Depois, em revisão bibliométrica, uma análise quantitativa mostrou lacunas nas pesquisas com madeira residual.
Para que o material pudesse ser mais competitivo em relação aos pisos convencionais, foram exploradas melhorias em sua composição para aprimorar sua resistência à umidade e ao desgaste mecânico. Testaram a resina à base de óleo de mamona e o óxido de alumínio (Al₂O₃) para essas melhorias, respectivamente. Ensaios no laboratório avaliaram a resistência do novo piso engenheirado e do painel OSB sem ou com eles, separadamente, em diferentes porcentagens. No entanto, os resultados demonstraram que os efeitos dessas adições foram limitados.
O uso da resina à base de óleo de mamona não resultou em um ganho significativo na resistência à umidade, mantendo o problema de absorção hídrica característico dos painéis de madeira reconstituída. Testes de resistência à flexão e compressão mostraram que a presença das micropartículas de Al₂O₃ não alterou muito o desempenho estrutural do material, ou seja, não trouxe ganhos significativos às propriedades mecânicas do piso. Apenas a resistência à abrasão apresentou uma melhora quando comparada aos painéis sem tratamento, o que sugere um potencial benefício na durabilidade superficial.
Também comparou-se o desempenho do piso desenvolvido com produto comercial constituído de compensado de madeira Pinus spp., com ensaios testando a delaminação em água fria, resistência ao esforço rolante, abrasão, dureza, resistência ao cisalhamento e variação dimensional. “Alguns resultados até superam os resultados do piso comercial que é produzido industrialmente com rigoroso controle. Foi um resultado surpreendente. Eu não esperava um comportamento tão bom do ponto de vista mecânico”, afirma Martins.
Mercado e sustentabilidade
A produção em escala dos pisos desenvolvidos ainda precisa ser estudada para disponibilização da tecnologia no mercado, mas o pesquisador diz que serão necessárias apenas algumas adaptações. Quanto ao valor final, “apesar de não ter o estudo econômico, utilizar material de resíduo tem o custo de produção muito baixo. Se compararmos com o MDF, que é um material mais conhecido no Brasil, o nosso material tem uma qualidade melhor. Portanto, o valor de venda pode ser maior do que o do MDF”, especula.
Juliano Fiorelli, orientador da tese e professor do Departamento de Engenharia de Biossistemas da FZEA, destaca que, embora o projeto contribua para a economia circular ao reutilizar resíduos madeireiros, seu impacto ambiental ainda não foi avaliado. “A sustentabilidade na construção civil não se resume apenas ao uso de resíduos. O ciclo de vida do material, o consumo energético no processo produtivo e a durabilidade do produto final são fatores quantificados nesta equação”, afirma Fiorelli. Essa avaliação ainda está em desenvolvimento, conforme o professor.
“Mas acreditamos que o produto possa ter um ganho ambiental, principalmente na captura de CO2, implementando uma classificação ao produto que será disponibilizado no mercado”, destaca Fiorelli.
Ao ser questionado sobre as limitações de uso no Brasil, devido ao tradicional uso de alvenaria, ele argumenta que o produto tem um grande potencial para atender tanto a demandas internas quanto externas. Pisos de madeira em regiões que utilizam esses materiais nas construções civis, como na região Sul, e outros produtos imobiliários, abrem espaço mesmo no país em que o uso da alvenaria é um aspecto cultural. Além desses usos internos, ele ressalta as demandas externas em países europeus, EUA e Canadá, nos quais predomina a marcenaria nas casas e em outras construções.
Texto: Jean Silva*
Mais informações: romulohbm@usp.br, com Romulo Martins
*Estagiário com orientação de Tabita Said
**Estagiária com orientação de Moisés Dorado
Fonte: https://jornal.usp.br/
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