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Prática evita o transporte de tora crua, que chama atenção, e de desmates capazes de serem detectados pelos satélites. Fiscais da Reserva de Gurupi, no MA, atuaram um infrator
Com o retorno dos fiscais ambientais em campo e satélites capazes de dedurar desmatamentos acima de 1 hectare, os infratores ambientais criam formas mais elaboradas para driblar os fiscais ambientais. Registrado na Reserva Biológica de Gurupi, um dos últimos remanescentes do bioma Amazônia no Maranhão e, portanto, um local com boa quantidade de árvores de valor comercial, o uso de serrarias móveis para a extração ilegal de madeira chamou atenção dos analistas do ICMBio.
A prática mais comum utilizada por madeireiros para extração de madeira é derrubar a árvore e transportar os troncos para uma serraria fora da floresta. Chegando nas serrarias, a madeira passa por um processo de beneficiamento. Ou seja, passa por etapas de tratamento e corte. Após ser beneficiada, a madeira é armazenada em galpões e depois transportada para o consumidor final, que geralmente são empresas do ramo da construção civil.
Entretanto, nas serrarias móveis esse processo é diferente. Ao invés de retirar os troncos da madeira e enviar para serrarias fora da floresta, os madeireiros constroem pequenas unidades de serrarias no coração da mata, onde dificilmente serão identificados. Nessas serrarias a madeira já é derrubada e beneficiada no próprio local, sendo cortadas em formato de ripas, estacas e blocos de madeira, saindo da floresta no formato ideal para serem transportadas direto para o comprador. Após fazer esse processo em uma parte da floresta, os madeireiros se deslocam, a fim de não serem localizados. Por isso essa prática é conhecida como serraria móvel, pois permite maior agilidade e mobilidade do processo.
“As serrarias móveis foram concebidas para resolver um problema ou para tentar desenvolver uma oportunidade para o manejo florestal comunitário. O manejo de pequena escala, não tem continuidade de maquinário, uma estrutura ou uma serraria que custa muito caro para montar. E aí no mundo da pesquisa e da indústria foi se desenvolvendo essas serrarias móveis, como uma possibilidade de manejo de pequena escala. Você não precisa fazer o transporte da tora até a serraria, mas você pode fazer o processamento ali dentro da floresta no menor impacto possível. […] Se a serraria móvel for bem utilizada, utilizada dentro de uma área com plano de manejo licenciado, com a permissão para fazer essa industrialização ali in loco, através da serraria móvel, não tem problema nenhum. […] ela é uma ferramenta muito positiva para estimular a agenda do manejo florestal. Agora é óbvio que ela acabou sendo utilizada em outras situações”, explica Leonardo Sobral, Engenheiro Florestal e Gerente de Cadeias Florestais do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora).
As serrarias, que a princípio eram uma solução para o pequeno produtor local, têm sido um grande problema para quem trabalha nas unidades de conservação. Chefe da Reserva Biológica (Rebio) do Gurupi, área localizada no estado do Maranhão, na região conhecida como Amazônia Oriental, o analista Ruhan Saldanha trabalha há mais de 10 anos na unidade e relata um pouco mais dessa prática que vem sendo constantemente presenciada por ele.
“É muito difícil identificar as ações dos madeireiros das serrarias, pois as pessoas que estão envolvidas são geralmente moradores da região, ou seja, conhecem muito bem a floresta. Outra coisa que dificulta é o acesso: por ficarem muito dentro da mata é difícil localizar e agir, já que o deslocamento é muito complicado em algumas regiões da unidade”
Ruhan foi um dos responsáveis pela última ação policial que desmontou uma unidade de serraria móvel na Reserva Biológica do Gurupi. Essa operação, intitulada como Amazônia Verde I e II, aconteceu entre os meses de agosto e outubro e foi uma ação integrada do IBAMA juntamente com os agentes da Rebio Gurupi.
Os agentes identificaram essa serraria através de sobrevoos na área e constataram que havia alguma ação de desmatamento perceptível na floresta. Nessa operação, foram detidas mais de 20 pessoas envolvidas no tráfico de madeira. Além de apreenderem mais de 100 metros cúbicos de madeira já beneficiadas, os agentes também apreenderam equipamentos utilizados pelo madeireiros, como caminhonetes, motosserras e até mesmo armas de fogo.
Ruhan também explica como funcionam as diferentes práticas adotadas pelos madeireiros nas serrarias móveis e como eles se organizam para implementar essa prática.
“A gente geralmente encontra dois tipos de serrarias: A serraria a partir de gerador, a diesel ou a gasolina, que funcionam em uma estrutura de ferro, com uma serras e equipamentos mais potentes, que possui uma estrutura mais moderna para conseguir cortar mais madeira. E o outro tipo é a Serraria Pica-pau, que funciona de forma arcaica e de forma manual, com uma serra manual. Eles (madeireiros) funcionam de forma organizada, cada um tem sua função. Tem a pessoa responsável pela alimentação, tem os madeireiros em si, a pessoa responsável pela segurança… todo mundo ali possui um papel específico dentro da unidade. Podem envolver mais de 10 pessoas em cada serraria dessas”, diz.
Nesse tipo de operação, o material apreendido é geralmente destruído no próprio local, como afirma Ruhan. Isso é uma medida adotada principalmente para a segurança de quem trabalha na unidade e para impedir que as ferramentas apreendidas voltem para as mãos dos criminosos.
“Os veículos e outros equipamentos são destruídos, para a segurança da equipe em situação de emboscada e tanto para a segurança veicular, porque todos esses veículos vêm todos avariados. As madeiras beneficiadas dentro das florestas também são destruídas, por conta da dificuldade do deslocamento. Essa prática é por conta da segurança da equipe, que sofrem emboscadas pelos madeireiros, que estão armados e tocam fogo na mata quando percebem que está acontecendo uma operação. Por isso nós fazemos de maneira rápida a destruição, para não ficarmos expostos na floresta“, diz.
Por ser um processo que facilita o escoamento dessa madeira e, por consequência, diminuir em vários níveis a cadeia de produção, as serrarias móveis apresentam um outro problema para a fiscalização: a identificação da origem da madeira.
Por não serem transportadas e armazenadas para galpões fora da floresta e com o deslocamento constante dos madeireiros, as serrarias móveis basicamente não deixam rastros visíveis para a fiscalização, que depende exclusivamente das ações realizadas dentro da floresta para identificar a origem da madeira.
Isso coloca em risco a produção da madeira legal no Brasil, já que a madeira cortada na serraria móvel apresenta poucos custos de produção e chega de forma mais rápida, e consequentemente mais barata, para o consumidor final. Consumidores estes que geralmente estão localizados no sul e no sudeste do Brasil e que não procuram identificar a origem legal da madeira.
Porém, graças ao trabalho de organizações ligadas ao desenvolvimento sustentável e o avanço de estudos recentes, já existem alternativas para identificar a origem da madeira a fim de conter os avanços do desmatamento e facilitando o manejo florestal legal na Amazônia.
De olho na madeira
Uma alternativa que auxilia no acesso à informação para o comércio de madeira no Brasil é a plataforma Timberflow, lançada em 2017. A ferramenta é uma iniciativa do Imaflora que busca, através dos portais de transparência do governo, analisar e divulgar dados relacionados a transações do comércio de madeira, produzindo informações qualificadas sobre o setor florestal e seus avanços.
Outra alternativa de monitoramento de exploração da madeira no Brasil é o Sistema de Monitoramento da Exploração Madeireira (Simex) que, através de análise de imagens de satélite, desenvolve um mapeamento da exploração madeireira, cruzando essas informações com licenças emitidas para a exploração de madeira legal. Com esse cruzamento de informações, a plataforma consegue identificar onde teve uma exploração licenciada ou não licenciada. O sistema Rede Simex é um sistema de monitoramento desenvolvido por Imazon, ICV, Imaflora e Idesam.
A Flourish chart
Essas alternativas de divulgação científica facilitam que a sociedade civil, bem como as instituições públicas, consigam enxergar de maneira mais clara quais são os impactos, os avanços e as ações que estão sendo produzidas para conter o avanço do desmatamento no Brasil. Entretanto, apesar dessas alternativas de rastreamento e monitoramento avançarem cada vez mais e estarem trazendo resultados bastante positivos, a forma mais eficaz de conter os avanços a produção de madeira ilegal no Brasil ainda é a fiscalização dentro das unidades de conservação. É o que afirma Leonardo Sobral, Gerente de Cadeias Florestais do Imaflora.
“A grande questão é que a gente precisa fortalecer o comando e controle dentro dessas reservas e dentro dessas unidades de conservação. E fiscalização mesmo. Fiscalização tanto através de imagens de satélite, mas também in loco. A presença do comando e controle é fundamental para combater a ilegalidade, para combater esse avanço predatório dentro das reservas”, diz.
Esta reportagem foi produzida com o apoio da Earth Journalism Network no âmbito do projeto Intercâmbio de Biomas: trocas de saberes entre jovens comunicadores da Amazônia e da Mata Atlântica.
Rudson Amorim
Estudante de Rádio e TV pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Comunicador Popular com produções voltadas principalmente para as pautas socioambientais e dos direitos humanos. →
Fonte: ((o))eco