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O movimento de arquitetura "sustentável", como o entendemos hoje, começou a ganhar forma no final do século XX em resposta às crescentes preocupações com a degradação ambiental, o consumo de energia e a escassez de recursos. Dentro desse diálogo global sobre sustentabilidade, a madeira tem sido exaltada como um símbolo de consciência ambiental e descarbonização. Sendo um dos materiais de construção mais versáteis, se tornou ainda mais procurada com a ascensão desse movimento. As árvores absorvem dióxido de carbono durante seu crescimento, que permanece na madeira quando esta é usada na construção — ou seja, menos CO2 na atmosfera.
Na realidade, a madeira tornou-se um elemento fundamental nos movimentos de design voltados para a redução de carbono. Isso ocorre em parte devido à sua extraordinária habilidade de capturar dióxido de carbono durante o seu crescimento, de absorver fibras de carbono e armazenar o carbono, em vez de liberá-lo após o uso. Além disso, a madeira é renovável, o que a diferencia de muitos outros materiais de construção. Práticas de manejo florestal sustentável asseguram o replantio de árvores para substituir aquelas que são colhidas.
A madeira também oferece vantagens significativas em termos de eficiência energética e flexibilidade arquitetônica. Como isolante natural, ela proporciona isolamento térmico às estruturas e reduz a necessidade de aquecimento e resfriamento. Essa eficiência energética natural beneficia muito a redução do consumo de energia operacional e as emissões associadas. Devido a essas diversas razões, somadas à sua significativa importância cultural e histórica tanto na Europa quanto nas Américas, é fácil compreender o atrativo da madeira e o seu papel no movimento sustentável.
Recentemente, a madeira tem sido amplamente utilizada em diversos projetos que influenciaram a evolução da indústria de design nos últimos anos. No Pavilhão Serpentine de Lina Ghotmeh, intitulado "À Table", a proposta consiste em uma estrutura de madeira esbelta apoiada por uma colunata composta por colunas finas laminadas em madeira. O principal objetivo dessa proposta é minimizar ao máximo a pegada de carbono do pavilhão, através do uso de madeira laminada, que possibilita uma estrutura mais esbelta em comparação com a madeira laminada cruzada amplamente utilizada (CLT). Além disso, a madeira tem sido recentemente empregada em uma nova era de experimentação, permitindo a construção de arranha-céus de madeira em todo o mundo. Estruturas como a Torre Mjøstårnet, na Noruega, ou a Farmhouse, projetada pela Precht Designs, que combina arranha-céus de madeira, casas modulares e agricultura vertical, emergiram como exemplos inovadores de arranha-céus construídos com madeira.
Entretanto, essa perspectiva predominante tem suas raízes em uma visão de mundo ocidental, onde a abundância de madeira e sua importância histórica são profundamente enraizadas. A narrativa toma um rumo diferente em regiões como o árido Oriente Médio, onde as paisagens desérticas predominam. Devido a diversos desafios, a madeira não pode ser utilizada como o material de construção principal. Nessas regiões áridas, a madeira não está facilmente disponível, e a arquitetura vernacular local é resultado de séculos de adaptação a climas severos e recursos limitados. Além disso, a abordagem convencional de utilizar a madeira como componente principal do design sustentável entra em conflito intrínseco com a realidade das regiões áridas.
A principal razão pela qual a solução baseada em madeira para combater a crise climática não é aplicável à região do Oriente Médio é simplesmente a escassez desse recurso na região. O Oriente Médio não é conhecido por possuir extensas florestas, e a quantidade total de terras florestadas é geralmente baixa em comparação com outras partes do mundo. Apesar de diversos esforços para promover alternativas locais, como a criação do Comitê Superior de Madeira (HCW) no Egito, que investiga soluções inovadoras, como a utilização de resíduos agrícolas na fabricação de painéis de fibras de média densidade (MDF), a demanda por madeira ainda não é suprida pela oferta na região do Oriente Médio. Na verdade, a maioria das necessidades de madeira no Oriente Médio ainda é atendida por meio de importações.
Depender da importação de madeira como material de construção crítico pode acarretar sérios impactos ambientais. Em primeiro lugar, o transporte de madeira por longas distâncias gera emissões significativas devido ao transporte. Na verdade, cerca de 34% das emissões de carbono em todo o mundo são atribuídas às distâncias percorridas entre a indústria madeireira e o consumidor. A importação de produtos resulta em um aumento no consumo de combustíveis, poluição do ar e emissões de gases de efeito estufa devido a navios, veículos e aviões. Além disso, os processos de fabricação intensivos em energia usados para criar produtos de madeira em alguns países exportadores podem aumentar a energia incorporada no material e as emissões de carbono. Por fim, o uso excessivo de recursos naturais nos países onde a madeira importada é produzida pode resultar em danos ao habitat, desmatamento e esgotamento geral dos recursos. Projetos de construção e economias locais estão particularmente vulneráveis devido à sensibilidade às perturbações na cadeia de suprimentos causadas por agitações geopolíticas, desastres naturais ou desafios no transporte.
Além dos desafios associados à localização e uso da madeira disponível nas regiões do Oriente Médio, existem questões relacionadas aos desafios de sua utilidade como material de construção. As regiões áridas são naturalmente muito secas, com baixos níveis anuais de chuva e disponibilidade limitada de água. Um dos principais desafios é a durabilidade da madeira, que em regiões áridas é altamente suscetível ao ressecamento e pode rachar, deformar ou até mesmo apodrecer. Em relação ao seu processamento, o tratamento da madeira pode requerer um consumo considerável de água, o que é problemático, já que as regiões áridas geralmente têm recursos hídricos limitados.
Embora a madeira tenha se consolidado como um símbolo de sustentabilidade e descarbonização na Europa e nas Américas, sua posição como modelo para iniciativas semelhantes no Oriente Médio parece inatingível devido aos recursos únicos e aos desafios ambientais da região. Materiais alternativos disponíveis localmente, em harmonia com o design tradicional e a consciência ambiental, ganham destaque nas áreas áridas do Oriente Médio, onde os recursos de madeira são escassos. Essas opções desempenham um papel crucial na criação de estruturas que se adaptem às condições climáticas e ao patrimônio cultural distintivo da região. Além disso, essas alternativas se tornam ainda mais essenciais e requerem uma abordagem inovadora para compreender profundamente como podem desempenhar um papel fundamental nas paisagens urbanas áridas durante a atual crise climática.
Uma alternativa viável é o uso de materiais à base de terra, como adobe e taipa. A arquitetura do Oriente Médio tem uma longa tradição no uso do adobe devido ao seu eficiente isolamento térmico e baixo impacto ambiental. A construção com taipa é outra opção sustentável e adequada ao clima, que envolve a compactação de camadas de terra dentro de uma estrutura para formar paredes de suporte. A pedra é uma escolha prática, especialmente em áreas com abundância de recursos rochosos nas proximidades. Estruturas de pedra são ideais para regiões áridas devido à sua alta capacidade de reter calor, o que auxilia no controle das temperaturas internas. Além disso, no Oriente Médio, folhas de palmeira e folhas de tamareira são frequentemente usadas para coberturas e estruturas de sombra, oferecendo isolamento natural e opções de materiais sustentáveis que se integram perfeitamente com a arquitetura regional tradicional.
Na 18ª Exposição Internacional de Arquitetura, La Biennale di Venezia, o Pavilhão Nacional dos Emirados Árabes Unidos abordou temas semelhantes. Intitulado "Aridly Abundant", foi um projeto de pesquisa com curadoria que explorou possibilidades arquitetônicas dentro, com e para paisagens áridas. Além disso, o pavilhão investigou como as práticas tecnológicas contemporâneas e futuras podem ser integradas no ambiente construído em paisagens como dunas, vales secos (wadis), planaltos desérticos e planícies costeiras.
Esses materiais de fácil acesso se tornam substitutos valiosos da madeira à medida que a urgência da crise climática aumenta. Eles também desempenham um papel fundamental na criação de ambientes urbanos resilientes e sustentáveis. Esses materiais podem capacitar arquitetos e construtores no Oriente Médio a criar estruturas ecologicamente conscientes que estejam em sintonia com a natureza, economizem recursos e preservem o patrimônio cultural, por meio de abordagens inovadoras em sua aplicação e uma compreensão profunda de suas características naturais. Na verdade, os materiais locais têm o potencial de se tornar os heróis ocultos da construção sustentável em áreas áridas, oferecendo soluções viáveis para os desafios apresentados pelas mudanças climáticas.
• Escrito por Nour Fakharany | Traduzido por Diogo Simões
Fonte: Archdaily