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Construir uma casa costuma demandar tempo e paciência. Uma nova modalidade de construção busca reduzir o tempo de execução de obra, diminuir resíduos e economizar energia. Com a união de tecnologia e industrialização, a construção do tipo wood frame utiliza matéria-prima proveniente de reflorestamento - madeira de pinus -, para uma construção mais produtiva e rápida.
Consolidado em países como Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Suécia, Japão e Chile, o modelo aposta em vantagens como conforto térmico e acústico, aliadas ao preço competitivo, para deslanchar no Brasil.
Por aqui, o sistema convencional é a alvenaria, em que as estruturas são feitas a partir de blocos de cerâmica, concreto, pedras ou tijolos. Contudo, o modelo convencional exige mais tempo de execução de obra.
A divulgação da norma de edificações em wood frame, publicada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), no dia 7 de julho, gera expectativa no setor, como um passo importante para que esse sistema industrializado e sustentável seja mais disseminado no território brasileiro.
O sistema wood frame é um tipo de construção que utiliza madeira de reflorestamento para compor a estrutura. No caso, a madeira de pinus. Peças de madeira verticais e horizontais são usadas para formar a construção. Não é necessário pilar ou viga. Ao contrário de casas pré-fabricadas ou residências rústicas, a madeira não é aparente. Ou seja, a madeira é somente um material utilizado, não o único.
Nesse sistema, as paredes são revestidas por drywall ou por outro tipo de revestimento, que também pode ser madeira. No Brasil, construtores utilizam, com frequência, placas cimentícias. “Em wood frame, a madeira não aparece. Isso é uma vantagem em desempenho. A montagem é muito rápida”, explica o doutor em Engenharia de Estruturas e diretor-executivo da Stamade, Guilherme Stamato.
Especialistas afirmam que, junto com menor tempo de execução da obra e controle de orçamento mais assertivo, este pode ser um caminho para resolver o déficit habitacional.
“A madeira é o único bem renovável. Planta, cresce, aprisiona carbono, colhe a árvore e é plantado novamente no mesmo lugar (...) Muito tem se falado para casas populares, mas há o alto padrão e construções comerciais. Um mês a mais que o empreendimento começa a funcionar, melhora a viabilidade do negócio. Quanto mais rápida a obra, mais viável é o negócio”, destaca Leonardo Lenz, diretor da Immergrun, construtora paranaense que constrói em wood frame.
Norma contribui para padronizar formas de execução com a tecnologia
A publicação da norma técnica de edificações em light wood frame envolveu um amplo trabalho de associações, universidades, pesquisadores e empresas do setor industrial madeireiro. Há 15 anos, surgiu a criação da Comissão Casa Inteligente, iniciativa do Sistema da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Sistema Fiep), que reuniu diversos empresários e representantes do setor.
Com o tempo, o grupo cresceu e elencou os desafios da área. A Berneck foi uma das empresas que participou e fomentou a criação de uma norma técnica. Com a necessidade dessa padronização, a Associação Brasileira da Indústria da Madeira Processada Mecanicamente (Abimci), que tem sede na capital paranaense, atuou na organização da Comissão de Estudos para o desenvolvimento da norma, criada em 2016.
Segundo Paulo Pupo, superintendente da Abimci, a publicação da norma técnica do sistema wood frame é uma conquista importante para o setor industrial madeireiro e para a cadeia produtiva da construção civil. “O documento é um passo fundamental para a consolidação do uso do sistema construtivo wood frame no Brasil, proporcionando padronização técnica bem como as diretrizes sobre o uso sistema construtivo”, diz.
Com a norma publicada, é possível padronização do sistema, podendo ser inserido nas linhas de financiamento de crédito e gerando negócios no país. “Certamente são vários desafios que ainda precisam ser vencidos para que o sistema ganhe escala e serão necessárias ações coordenadas em toda a cadeira produtiva da construção do país reforçando a consolidação e uso desse sistema”, acrescenta Pupo.
Antes da norma técnica, os bancos estavam restritos a aceitarem o financiamento em construtoras que tivessem homologação própria. Era necessário que a empresa fizesse muitos testes e investimento para que o banco aceitasse. Porém, agora, os créditos de financiamento são mais acessíveis por ser uma construção que já está no mercado.
“O mercado imobiliário, uma das verticais é a disponibilidade de recursos para pessoas e construtoras. Com financiamento facilitado, será mais fácil. Há um atrativo para pequenos construtores também”, afirma o diretor da Immergrun.
“A grande vantagem da norma é padronizar todos os materiais e as formas de executar, com os benefícios, durabilidade, conforto térmico e acústico (...) as empresas se sentem seguras para fazer, os clientes mais seguros para comprar e os bancos para financiar. É mais fácil fiscalizar quando se tem uma norma. Nossa intenção com a norma é pulverizar e sair de poucas empresas”, complementa o diretor-executivo da Stamade.
Paraná pode ser potencial incentivador de construções em wood frame
A região Sul do país concentra grande parte do plantio de pinus. Paraná e Santa Catarina lideram em área plantada. De acordo com a Associação Paranaense de Empresas de Base Florestal (Apre), o estado possui 713 mil hectares de área plantada por pinus.
“Uma significativa parte da produção de madeira processada brasileira se concentra nesses dois estados, com seus parques industriais instalados em várias regiões, proporcionando uma boa capilaridade da produção e escoamento da produção tanto destinado ao consumo do mercado interno nacional com nas exportações”, destaca o superintendente da Abimci.
A Berneck é uma das empresas do Paraná que planta e beneficia o pinus no estado. A organização está entre as maiores exportadoras do Brasil, com volume de exportação de mais de 3500 TEUs/mês (twenty-foot equivalent unit) e relação comercial com mais de 60 países. A capacidade anual de produção de madeira serrada de pinus, 100% seca em estufas, é de mais de 1 milhão de m³. A Berneck tem três serrarias: Araucária (PR), Curitibanos (SC) e Lages (SC).
Com mais de 70 anos de experiência, a empresa tem se preparado para o potencial da construção em wood frame. “Em nossas três serrarias, investimos em scanners de última geração para fazer a classificação estrutural adequada das toras de pinus e entregar um produto adequado a quem for beneficiar. Estamos preparados para fornecer a matéria-prima de madeira serrada de pinus para ser cortada, fingada, colada e tratada pela indústria da construção”, conta a diretora comercial e co-presidente da Berneck, Graça Berneck Gnoatto.
Por ter concentração em produção de madeira pinus e empresas especializadas, o diretor da Immergrun acredita que o Paraná é um incentivador de construções dessa técnica. “Temos no Paraná um grupo de trabalho, capitaneado pela Fiep, para falar sobre [esse tipo de sistema]. O Paraná está bem engajado”.
Agora, os especialistas acreditam que é preciso fomentar políticas públicas para que a população consiga entender mais sobre a técnica. “O objetivo é ter políticas públicas para incentivar esse tipo de construção. O governo estadual já percebeu o potencial que pode ter, gerando economia para a população como um todo”, afirma.
"A normatização é um primeiro passo para permitir a industrialização dos produtos necessários para construção em wood frame. Com a industrialização dentro do Brasil, vem a escala e, consequentemente, redução de custo", acrescenta Graça Berneck Gnoatto.
Empresa paranaense constrói casas em wood frame
A construtora paranaense Immergrun atua com construções em wood frame desde 2019. “A madeira vem para mexer no sistema como um todo, com impacto social e sustentabilidade. Olhar para a casa feita em madeira é muito pouco. Tem que pensar no aspecto social, melhora de vida do morador e sustentabilidade”, enumera Lenz.
Para ele, o incentivo dessa construção também fomenta mão de obra qualificada. Quanto mais procura por casas feitas com madeiras, mais pessoas precisão se desenvolver na área. “A mão de obra é super eficaz, tem um aspecto social importante, a mão de obra é mais qualificada. E melhora de vida dos funcionários também”.
O diretor diz que essa técnica está sendo usada em 90% das construções de até quatro andares nos Estados Unidos. “O potencial é absurdo. É uma alternativa construtiva, com uma melhora de condições de trabalho para a pessoa que constrói e para o morador. É uma tecnologia que o Brasil ainda está para trás”.
E matéria-prima o país possui. A madeira pinus vem de fonte reflorestada. São áreas controladas com ambiente adequado. O material também é trabalhado após o corte para não ter fungos e cupins.
“O Brasil tem um diferencial que países mais frios não têm. Uma árvore de pinus em 20 anos está pronta para ser cortada. Em outros países, chega a 50 ou 60 anos. Brasil tem condições de clima favoráveis”, ressalta Lenz. A expansão desse sistema não deve gerar preocupação com outras linhas de construção. Mesmo com possível ampliação desse modelo, não será o fim da alvenaria, mas a expansão de tipos de tecnologia.
“O mercado é muito grande e não vai gerar problemas para construtoras tradicionais. Tem empreendimentos que vão disponibilizar wood frame e outros alvenaria. Isso não representa o fim de uma tecnologia. Mas irá auxiliar e contribuir”, acredita. “O Brasil tem um potencial e a construção civil acaba sendo arcaica, pois empilha tijolo em cima de tijolo. [Wood frame] é trazer tecnologia na construção por meio de sustentabilidade”, complementa.
Wood frame: sustentabilidade e alternativa para déficit habitacional
A sustentabilidade é um dos benefícios desse tipo de construção, segundo especialistas da área. “Além das questões de custo e agilidade, o fato é que este sistema construtivo é ambientalmente correto por ter a madeira como base”, explica a diretora comercial e co-presidente da Berneck.
“A utilização de madeiras de florestas plantadas proporciona benefícios em todas as etapas: durante a fase de crescimento e amadurecimento das plantas que, no caso do pinus, leva de 15 a 17 anos e nesse período faz o sequestro de carbono da atmosfera estocando grandes quantidades de CO2 por muito tempo”, afirma.
Após a construção, a madeira também pode ser utilizada para painéis reconstituídos. Além disso, mesmo depois desse aproveitamento, pode ser insumo para a cogeração de energia nas indústrias como insumo das caldeiras. “Assim, é o único insumo da construção que é renovável e biodegradável após o uso”, frisa a diretora comercial.
Embora o preço de custo ainda seja equivalente com casas de alvenaria, a expectativa é de baixa dos valores com maior demanda.
Nesse sentido, para projetos que visam diminuir o déficit habitacional, construções em wood frame são uma alternativa. “A solução para o déficit habitacional acaba sendo mais bem suprida, uma vez que dá subsídios de velocidade de construção, controle financeiro e menor quantidade de mão de obra”, destaca o diretor da Immergrun.
Gabriele Bonat
Fonte: Gazeta do Povo