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Estudo da Embrapa mostrou um aumento de 433% de produtividade nas áreas com grande quantidade de vegetação nativa quando comparada às áreas degradadas
O açaí de terra firme ou plantado é aquele que atingiu um refinamento de características positivas e vantagens quando comparadas aos açaís nativos, gerando frutos com maior rendimento Divulgação/Embrapa
O agricultor Alberto Shibata, do município de Santa do Izabel do Pará (PA), cultiva açaí em terra firme desde 2006. Atualmente, ele tem 15 mil pés de açaizeiro, cuja produção é de cerca de 50 toneladas. O produtor aumenta o plantio a cada ano e, desde que inseriu em sua propriedade abelhas canudo, nativas da Amazônia, notou a alta do volume dos frutos.
Ele conta que as 15 caixas de abelha introduzidas no plantio ajudaram a polinização e ampliaram a produção de açaís por meio deste manejo que mantém algumas colônias no plantio. “Minha área é localizada em uma região mais urbanizada e tem pouca abelha silvestre, por isso a introdução da abelha manejada foi muito boa para o meu açaí”, relatou em comunicado divulgado pela Embrapa.
Nem só de abelha prospera o açaí plantado. Por isso, a conservação de floresta nativa passa a ser essencial para manter a produtividade em alta, seja por manter as abelhas polinizando ou por fazer sombreamento ao solo e aos frutos.Área de floresta é o que não falta na propriedade do produtor Fernando Miranda, localizada em Santa Bárbara, região metropolitana de Belém (PA). Ele, que se tornou um defensor das abelhas nativas, mantém uma área de 20 hectares de vegetação nativa e recuperada na propriedade.
“Tenho cinco caixas com abelhas canudo e outras colônias em troncos de madeira, em casas de cupins, em ocos de árvores e até na terra, que já habitavam naturalmente a área, e com as quais faço um cuidadoso trabalho de preservação”, conta o produtor.
Por ano, os 20 hectares de plantio de açaizeiro produzem cerca de 130 toneladas de frutos. O local também foi uma das áreas avaliadas por um grupo de cientistas da Embrapa Amazônia Oriental, Embrapa Meio Ambiente, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Mato Grosso (IFMT), Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Universidade Federal de Goiás (UFG).
Nove locais foram estudados durante cinco meses - que é o período de floração anual do açaizeiro, onde foram introduzidas cerca 15 colônias de abelha canudo.
O objetivo foi avaliar a introdução delas em áreas com plantios de açaizeiro em terra firme com diferentes gradientes de floresta, no entorno ou próximas aos plantios. O resultado aponta um aumento de 433%, mais de quatro vezes a produtividade. As novas moradoras contribuem para aumentar em 30% o número total de visitas de abelhas ao açaí.
Por outro lado, elas reduzem em 60%, em média, a abundância de abelhas silvestres que vêm das áreas de florestas para visitar as flores do açaí e em 50% a riqueza, ou diversidade, dessas espécies, como divulgou a Embrapa.
Na percepção de Fernando Miranda, a melhoria foi considerável em termos do aumento da quantidade e da qualidade dos frutos produzidos. “O aumento de produção foi de cerca de 30% com a introdução de colônias das abelhas canudo”, relata.
As abelhas nativas dependem de uma ampla diversidade de alimentos e abrigos naturais que somente essas florestas e matas naturais são capazes de oferecer. Quando bem preservadas e manejadas, o trabalho de polinização dessas abelhas aumenta consideravelmente a quantidade e a qualidade dos frutos de açaí. Assim, vejo como imprescindível a preservação e recuperação dessas áreas.
Biodiversidade
De acordo com a Embrapa, o trabalho avaliou que em um plantio sem o manejo de abelhas e com 40% de cobertura florestal ao redor, a abundância das espécies aos açaizeiros aumentou em 100%, em relação a uma área degradada com até 10% de floresta.
Já em um plantio nas mesmas condições com a introdução de abelhas manejadas, a alta na taxa de visitação às flores teve um acréscimo de 30% no total de visitantes florais. “No geral, verificamos que houve aumento no total de visitas, pois superlotamos a área com abelhas”, lembra a bióloga Márcia Maués, pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental.
Ela explica que pesquisas anteriores já mostravam a "mega diversidade" de visitantes florais, como abelhas, moscas, vespas, besouros e formigas. "Mas são as abelhas nativas da Amazônia os polinizadores mais eficientes dessa palmeira", acrescentou.
A abordagem da polinização integrada de cultivos envolve tanto o manejo de polinizadores quanto o manejo da paisagem e foi a primeira vez que essa metodologia foi utilizada para os plantios de açaizeiro.
“Existem duas estratégias principais para promover os serviços de polinização: manejo de polinizadores (introdução de caixas de abelha dentro dos plantios) ou melhorar as condições ambientais para aumentar a abundância e diversidade de polinizadores nativos no ambiente”, explica o biólogo Alistair Campbell, pesquisador colaborador da Embrapa Amazônia Oriental.
Porém, ao analisar somente o desempenho dos polinizadores silvestres, aqueles presentes na natureza, a introdução das caixas de abelhas canudo provocou uma redução de até 80% na taxa de visitação das abelhas silvestres às flores e 50% na riqueza de espécies. A média na taxa de visitação ficou em 60%.
Para o biólogo Cristiano Menezes, da Embrapa Meio Ambiente, isso não significa que se vá desistir do manejo das abelhas no caso do açaizeiro. Tem-se que pensar nas múltiplas possibilidades que o produtor tem para que o sistema de polinização seja bem-sucedido, como a diversidade maior de abelhas nativas, assim como ocorre na natureza, e melhorar a paisagem no entorno nos plantios.
"É preciso mudar o olhar sobre a área de mata. Ao invés de ser considerada uma área perdida, ela deve ser vista como um ativo importante que traz renda para o proprietário. A restauração passa a ser um investimento”, pontua o cientista.
Ele destaca, ainda, que ao invés de pensar o açaí como uma monocultura de larga escala, o produtor deve pensar no desenho da paisagem que favoreça a presença dos polinizadores na área, como corredores de mata entre os plantios.
O Código Florestal Brasileiro define que propriedades rurais em áreas de florestas na Amazônia Legal devem possuir 80% de Reserva Legal ou, no caso de terem sido desmatadas, devem restaurar pelo menos 50% dessas áreas, sendo assim, a pesquisadora alerta que nas propriedades em desacordo com a legislação “não basta somente introduzir as caixas de abelha; é preciso fundamentalmente realizar a recuperação de Áreas de Preservação Permanente (APP) e de Reserva Legal. É importante para o produtor e para a produção”, destaca o estudo.
Maior produtividade
Para avaliar o impacto econômico do aumento da taxa de visitação de abelhas às flores nos diferentes cenários e a produtividade das áreas, a equipe de socioeconomia, envolvida no trabalho, entrevistou mais de cem produtores e perguntou sobre o manejo da área, os custos da atividade e a produtividade dos plantios, em áreas com e sem a introdução das colônias.
Sem o manejo das abelhas, a produtividade no cenário de baixa cobertura florestal (10%) ficou em torno de 3.9 toneladas por hectare de frutos. Já no cenário de alta cobertura florestal (40%) saltou para 21.3 toneladas por hectare.
“Esse aumento de quase cinco vezes mais rendimento é semelhante nas áreas com a introdução das caixas de abelha, o que nos mostra que a presença da floresta é o fator principal para a produtividade do açaí” afirma o economista Felipe Deodato da Silva e Silva, do IFMT.
Ainda que pequeno, o lucro sem o manejo supera as áreas com o manejo da abelha, pois o produtor não tem o custo das caixas de abelhas. “Nos dois cenários, o produtor tem produtividade, então por que ter um custo para um serviço que já é oferecido de graça pela natureza?”, questiona o economista.
Fonte: Por Globo Rural — São Paulo