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Em Brumadinho (MG), espécies em extinção estão florescendo entre seis meses e um ano, graças ao plantio de mudas produzidas a partir do DNA de exemplares antigos
Uma técnica de combinação genética inédita, desenvolvida por pesquisadores brasileiros, tornou-se uma esperança de reflorestamento da Mata Atlântica em tempo recorde. Árvores de espécies em extinção, que levariam mais de oito anos para produzir as primeiras flores e frutos, estão iniciando esse processo entre seis meses e um ano, graças ao plantio de mudas produzidas a partir do DNA de exemplares antigos. A expectativa é que, a partir desses clones, o crescimento florestal em torno dessas árvores seja acelerado, já que eles produzem sementes de forma precoce.
Nomeada de “Resgate de DNA e indução de florescimento precoce em espécies florestais nativas”, a técnica já foi aplicada com árvores como a jequitibá-rosa, os ipês (amarelo, branco e roxo), açoita-cavalo, cucupira, pindaíba, entre outras predominantes na Mata Atlântica. Das 30 plantas incluídas no trabalho, 12 estão ameaçadas de extinção. Em Brumadinho, cidade mineira onde o estudo foi iniciado e que ainda sofre as consequências do rompimento da barragem da mineradora Vale, em 2019, espera-se que o verde volte a predominar dez anos antes do que o tempo de reflorestamentos convencionais.
— Estamos muito animados com os resultados. Resgatando o DNA de espécies das florestas da região, composta por Mata Atlântica e Cerrado, evitamos a perda da informação genética de cada uma — destaca o professor do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa (UFV) Gleison dos Santos. — E o melhor é que a técnica pode ser usada em diferentes biomas. Um legado importante para as próximas gerações.
O método foi desenvolvido por cientistas da UFV em parceria com a Vale, que firmou um termo de ajuste de conduta junto ao Ministério Público para recuperar a área depois da tragédia que matou 272 pessoas e despejou milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração na bacia do Rio Paraopeba. Em Brumadinho, dos 300 hectares impactados, quase 50% são de Mata Atlântica.
Hoje, restam apenas 12,4% de floresta original no bioma, de acordo com dados do “Atlas da Mata Atlântica.
Como é feito o resgate
O trabalho começa com um levantamento das espécies nativas e a identificação de árvores em risco de morte — no caso de Brumadinho, esse risco é gerado pela lama com rejeitos de minério. Depois, a equipe remove ramos das copas das árvores já maduras e os leva ao viveiro da UFV, onde os galhos são inseridos em parte da raiz ou no caule de outra árvore da mesma espécie ou família, produzindo, assim, uma cópia da árvore enxertada. Ou seja, um clone.
A planta é submetida, então, a hormônios reguladores de crescimento, preparados especificamente para cada família de árvores. Essas substâncias aceleram a transição da planta para o estágio adulto. Em seguida, o clone é introduzido na área do reflorestamento e, em pouco tempo, passa a produzir os frutos e flores cujas sementes e pólen serão disseminadas por macacos, pássaros, insetos e outros polinizadores.
— As árvores plantadas são de extrema importância por serem abrigo da fauna, dispersoras de pólen que auxiliam na cobertura vegetal da floresta, e algumas são usadas na extração de óleos e madeiras, por exemplo. Todas têm um papel que, além de ambiental, é social e econômico — explica Gleison dos Santos.
A técnica realizada em Brumadinho recolheu, inicialmente, material genético de dez plantas, de cinco espécies diferentes, incluindo algumas ameaçadas de extinção e protegidas por lei ambiental. Nos próximos três anos, a ideia é coletar material de 30 espécies e reintroduzir mais de seis mil mudas clonadas nas áreas a serem recuperadas.
— A intenção não é apenas substituir plantas que foram extintas, mas também aquelas que tiveram danos causados pelo rejeito — ressalta o analista ambiental Raul Firmino, da Vale. — A isso, vai se somar o retorno da biodiversidade local, com a polinização natural. É todo um ciclo da floresta que deve ocorrer de maneira antecipada graças a essa proposta de resgate
Mas o método tem limite de utilização. Para garantir a variedade genética da área restaurada, o ideal é que sejam aplicados apenas 50% de mudas clonadas por hectare. A outra metade do plantio deve ser feita com o uso de mudas tradicionais.
Área de reflorestamento
Até o momento, estão em processo de recuperação ambiental 42 hectares em Brumadinho, incluindo parte da área diretamente impactada e terras protegidas do entorno, com o plantio de aproximadamente 55 mil mudas de espécies nativas da região. Essa área equivale a 42 campos de futebol. Nesse processo de recuperação também está sendo feita a renaturalização de ambientes, incluindo a recuperação dos cursos d’água (ribeirões e córregos) e de áreas úmidas afetadas.
Por Pâmela Dias — Rio de Janeiro
Fonte: https://oglobo.globo.com/