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Notícias
22
nov
2005
(GERAL)
Soja x floresta: entenda a polêmica do estudo do Ipea
O órgão do governo federal divulgou análise na qual afirma que a expansão da soja não provoca aumento dos desmatamentos no Cerrado e Amazônia. Ao contrário, garante que o plantio do grão contribue para a preservação ambiental. Mas um levantamento coordenado pelo ISA demonstra que a soja provoca sim - tanto direta como indiretamente - a derrubada de matas primárias.
A polêmica em torno do avanço do cultivo da soja sobre a floresta amazônica e o Cerrado brasileiro – e o impacto causado pela agroindústria no desmatamento de matas primárias - começou na semana passada com a divulgação de um texto produzido por três pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), fundação vinculada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão do governo federal. As conclusões do texto e a apresentação de contrapontos às teses nelas embutidas, por parte de organizações não-governamentais e especialistas no tema, ocuparam importantes espaços na imprensa brasileira e estrangeira nos últimos dias, revelando a importância da questão tratada.
O texto “Crescimento agrícola no período 1999-2004, explosão da área plantada com soja e meio ambiente no Brasil”, aborda em vinte e uma páginas a questão das variações cambiais sobre os preços agrícolas, traça uma perspectiva para o crescimento do setor agrícola neste ano e detalha os fatores macro-econômicos e o aumento de recursos tecnológicos por trás do crescimento das áreas cultivadas no País nos últimos anos.
O texto analisa o cenário agrícola nacional, mas fecha o foco na região centro-oeste, onde a área plantada com soja obteve um crescimento de mais de 66% entre 2001 e 2004. A polêmica do texto, contudo, subsiste em outros dois capítulos. No quinto – denominado “A conversão de pastagens como fonte principal de crescimento recente da área de soja no Brasil” - os autores do estudo defendem a hipótese de que a expansão nos últimos três anos das áreas cultivadas com soja, que cresce a uma média anual de 13,8%, não provocou o aumento do desmatamento da floresta amazônica nem do cerrado.
"Soja no lugar de gado"
O estudo do Ipea afirma que o cultivo do grão avançou principalmente sobre "pastagens degradadas" e não sobre "áreas virgens". Explica que há uma espécie de simbiose entre o setor sojicultor e o pecuarista, de modo que o último arrenda as terras para o primeiro em troca de sacas de grãos e o retorno das propriedades com melhora na qualidade do solo.
O principal argumento apresentado para justificar a tese da soja no lugar do boi é o de que não haveria tempo hábil, pela ausência de recursos tecnológicos, para converter floresta primária em área de cultivo. Os autores do texto garantem que é impossível que uma nova área desmatada seja convertida em plantação de soja em menos de três anos. O curioso é que os técnicos do Ipea, ao concluírem que as plantações de soja avançam sobre áreas de pastagem degradadas e não sobre floresta, não levam em conta a situação existente no norte do estado do Mato Grosso.
Epicentro do recente boom da soja na região centro-oeste, é nesse estado, de acordo com dados do próprio governo federal, que o desmatamento atingiu índices recordes nos últimos anos. O Instituto Socioambiental, por sinal, publicou em outubro de 2003 reportagem especial sobre os impactos do plantio do grão em larga escala sobre o Parque Indígena do Xingu, localizado na região central e norte do estado. O Ipea tampouco utiliza dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), uma das maiores referências no monitoramento por imagens de satélite do ritmo e rumo dos desmatamentos no Brasil.
Para o engenheiro Maurício Galinkin, que trabalhou por 18 anos no Ipea, o trabalho dos ex-colegas promove uma espécie de “santificação” da soja. “É importante ressaltar que o problema não é a soja em si, mas a forma ostensiva como ela está sendo cultivada na região centro-oeste. E, de fato, há plantações sobre pastagens, mas é uma tendência tímida que não vale como regra.” O especialista, que ministrará uma oficina sobre impactos socioambientais da soja na quinta edição do Fórum Social Mundial, na próxima semana em Porto Alegre, também aponta diversos equívocos no documento do Ipea, como a não distinção entre pasto natural e pasto plantado. “A maioria dos pastos no Mato Grosso é natural e precisa ser desmatada antes do cultivo da soja”, ressalva o presidente da Fundação Centro Brasileiro de Referência e Apoio Cultural (Cebrac).
Amizade suspeita
O outro capítulo controverso do texto do Ipea é o sexto, intitulado “A soja é amiga ou inimiga da floresta amazônica?”. Nele, o estudo diz que a soja não ameaça a floresta amazônica e defende ostensivamente o asfaltamento da BR-163 para escoar a produção de grãos das regiões norte e centro-oeste. Os técnicos do Ipea sustentam que a soja na região da floresta amazônica aumenta o custo da terra e afasta da região os agricultores, madeireiros e pecuaristas que, sem recursos tecnológicos e infra-estrutura, são os verdadeiros responsáveis pela derrubada da mata.
O que não está explicado é de que forma esta agricultura itinerante e de baixo nível tecnológico conseguiu, sozinha, desmatar 7 milhões de hectares de floresta amazônica no período analisado pelo documento. O estudo afirma também que o cultivo da soja é mais fácil de ser monitorado pelos órgãos públicos e que o setor sojicultor não oferece a oportunidade para o Estado brasileiro assumir atitude paternalista – ao contrário dos pequenos agricultores que, por serem pobres, inspiram nas autoridades complacência em relação a seus crimes ambientais. Nessa ginástica de argumentos, os pesquisadores esticam um paralelo entre a fiscalização ambiental na região amazônica com as leis que impedem a construção de casas de alto padrão nos morros do Rio de Janeiro. Para os autores do estudo, a lógica que dá origem às favelas cariocas é a mesma que permite o desmatamento da Amazônia e do Cerrado. A análise do Ipea vem à publico em um momento interessante, quando o Fórum Brasileiro de Organizações Não-Governamentais e Movimentos Sociais (FBOMS) finaliza outro trabalho sobre o mesmo tema. Este estudo, do qual o Instituto Socioambiental é coordenador, ainda não foi concluído.
Mas já apresenta dados diferentes das conclusões oferecidas pelo órgão do governo. Nele, os pesquisadores constataram em sobrevôos e imagens de satélite que há uma relação direta entre a produção de soja e desmatamento nas regiões do centro e do norte do Mato Grosso. A pesquisa revela que as áreas de Cerrado e de floresta de transição desmatadas nos últimos anos já estão sendo cultivadas com soja. Foram convertidas em tempo bem inferior (de um a dois anos) ao estipulado como limite pelos técnicos do Ipea.
O levantamento realizado pelas ONGs demonstra que, de fato, a soja ocupa áreas antes utilizadas como pasto. Ao fazê-lo, empurra o gado para novas fronteiras, ampliando as áreas desmatadas. Ou seja, a expansão da área cultivada com soja provoca o desmatamento de áreas de floresta amazônica e Cerrado tanto direta como indiretamente. O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues - principal defensor do agronegócio brasileiro no governo federal -, admitiu publicamente que esta relação existe e deve ser levada em conta na formulação de estratégias para o setor agrícola.
Diante destas constatações – e no modo generalista com que seus autores tratam a questão da soja na Amazônia, sem considerar os diferentes aspectos socioambientais de cada microrregião - , o estudo do Ipea, ainda que tenha seu valor ao apresentar nova abordagem sobre a questão e contribuir para a aprofundamento da discussão, se precipita ao cravar que a soja é amiga da floresta. “Seria interessante que o Ipea e o Ministério do Meio Ambiente sobrevoassem conosco alguns dos 65 maiores desmatamentos ilegais ocorridos 2003 no Mato Grosso, cuja lista é uma das bases utilizadas em nosso trabalho”, afirma o advogado André Lima, coordenador de Biodiversidade do ISA. O convite está feito.
Fonte: Amazônia.org.br – 24/01/2005
A polêmica em torno do avanço do cultivo da soja sobre a floresta amazônica e o Cerrado brasileiro – e o impacto causado pela agroindústria no desmatamento de matas primárias - começou na semana passada com a divulgação de um texto produzido por três pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), fundação vinculada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão do governo federal. As conclusões do texto e a apresentação de contrapontos às teses nelas embutidas, por parte de organizações não-governamentais e especialistas no tema, ocuparam importantes espaços na imprensa brasileira e estrangeira nos últimos dias, revelando a importância da questão tratada.
O texto “Crescimento agrícola no período 1999-2004, explosão da área plantada com soja e meio ambiente no Brasil”, aborda em vinte e uma páginas a questão das variações cambiais sobre os preços agrícolas, traça uma perspectiva para o crescimento do setor agrícola neste ano e detalha os fatores macro-econômicos e o aumento de recursos tecnológicos por trás do crescimento das áreas cultivadas no País nos últimos anos.
O texto analisa o cenário agrícola nacional, mas fecha o foco na região centro-oeste, onde a área plantada com soja obteve um crescimento de mais de 66% entre 2001 e 2004. A polêmica do texto, contudo, subsiste em outros dois capítulos. No quinto – denominado “A conversão de pastagens como fonte principal de crescimento recente da área de soja no Brasil” - os autores do estudo defendem a hipótese de que a expansão nos últimos três anos das áreas cultivadas com soja, que cresce a uma média anual de 13,8%, não provocou o aumento do desmatamento da floresta amazônica nem do cerrado.
"Soja no lugar de gado"
O estudo do Ipea afirma que o cultivo do grão avançou principalmente sobre "pastagens degradadas" e não sobre "áreas virgens". Explica que há uma espécie de simbiose entre o setor sojicultor e o pecuarista, de modo que o último arrenda as terras para o primeiro em troca de sacas de grãos e o retorno das propriedades com melhora na qualidade do solo.
O principal argumento apresentado para justificar a tese da soja no lugar do boi é o de que não haveria tempo hábil, pela ausência de recursos tecnológicos, para converter floresta primária em área de cultivo. Os autores do texto garantem que é impossível que uma nova área desmatada seja convertida em plantação de soja em menos de três anos. O curioso é que os técnicos do Ipea, ao concluírem que as plantações de soja avançam sobre áreas de pastagem degradadas e não sobre floresta, não levam em conta a situação existente no norte do estado do Mato Grosso.
Epicentro do recente boom da soja na região centro-oeste, é nesse estado, de acordo com dados do próprio governo federal, que o desmatamento atingiu índices recordes nos últimos anos. O Instituto Socioambiental, por sinal, publicou em outubro de 2003 reportagem especial sobre os impactos do plantio do grão em larga escala sobre o Parque Indígena do Xingu, localizado na região central e norte do estado. O Ipea tampouco utiliza dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), uma das maiores referências no monitoramento por imagens de satélite do ritmo e rumo dos desmatamentos no Brasil.
Para o engenheiro Maurício Galinkin, que trabalhou por 18 anos no Ipea, o trabalho dos ex-colegas promove uma espécie de “santificação” da soja. “É importante ressaltar que o problema não é a soja em si, mas a forma ostensiva como ela está sendo cultivada na região centro-oeste. E, de fato, há plantações sobre pastagens, mas é uma tendência tímida que não vale como regra.” O especialista, que ministrará uma oficina sobre impactos socioambientais da soja na quinta edição do Fórum Social Mundial, na próxima semana em Porto Alegre, também aponta diversos equívocos no documento do Ipea, como a não distinção entre pasto natural e pasto plantado. “A maioria dos pastos no Mato Grosso é natural e precisa ser desmatada antes do cultivo da soja”, ressalva o presidente da Fundação Centro Brasileiro de Referência e Apoio Cultural (Cebrac).
Amizade suspeita
O outro capítulo controverso do texto do Ipea é o sexto, intitulado “A soja é amiga ou inimiga da floresta amazônica?”. Nele, o estudo diz que a soja não ameaça a floresta amazônica e defende ostensivamente o asfaltamento da BR-163 para escoar a produção de grãos das regiões norte e centro-oeste. Os técnicos do Ipea sustentam que a soja na região da floresta amazônica aumenta o custo da terra e afasta da região os agricultores, madeireiros e pecuaristas que, sem recursos tecnológicos e infra-estrutura, são os verdadeiros responsáveis pela derrubada da mata.
O que não está explicado é de que forma esta agricultura itinerante e de baixo nível tecnológico conseguiu, sozinha, desmatar 7 milhões de hectares de floresta amazônica no período analisado pelo documento. O estudo afirma também que o cultivo da soja é mais fácil de ser monitorado pelos órgãos públicos e que o setor sojicultor não oferece a oportunidade para o Estado brasileiro assumir atitude paternalista – ao contrário dos pequenos agricultores que, por serem pobres, inspiram nas autoridades complacência em relação a seus crimes ambientais. Nessa ginástica de argumentos, os pesquisadores esticam um paralelo entre a fiscalização ambiental na região amazônica com as leis que impedem a construção de casas de alto padrão nos morros do Rio de Janeiro. Para os autores do estudo, a lógica que dá origem às favelas cariocas é a mesma que permite o desmatamento da Amazônia e do Cerrado. A análise do Ipea vem à publico em um momento interessante, quando o Fórum Brasileiro de Organizações Não-Governamentais e Movimentos Sociais (FBOMS) finaliza outro trabalho sobre o mesmo tema. Este estudo, do qual o Instituto Socioambiental é coordenador, ainda não foi concluído.
Mas já apresenta dados diferentes das conclusões oferecidas pelo órgão do governo. Nele, os pesquisadores constataram em sobrevôos e imagens de satélite que há uma relação direta entre a produção de soja e desmatamento nas regiões do centro e do norte do Mato Grosso. A pesquisa revela que as áreas de Cerrado e de floresta de transição desmatadas nos últimos anos já estão sendo cultivadas com soja. Foram convertidas em tempo bem inferior (de um a dois anos) ao estipulado como limite pelos técnicos do Ipea.
O levantamento realizado pelas ONGs demonstra que, de fato, a soja ocupa áreas antes utilizadas como pasto. Ao fazê-lo, empurra o gado para novas fronteiras, ampliando as áreas desmatadas. Ou seja, a expansão da área cultivada com soja provoca o desmatamento de áreas de floresta amazônica e Cerrado tanto direta como indiretamente. O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues - principal defensor do agronegócio brasileiro no governo federal -, admitiu publicamente que esta relação existe e deve ser levada em conta na formulação de estratégias para o setor agrícola.
Diante destas constatações – e no modo generalista com que seus autores tratam a questão da soja na Amazônia, sem considerar os diferentes aspectos socioambientais de cada microrregião - , o estudo do Ipea, ainda que tenha seu valor ao apresentar nova abordagem sobre a questão e contribuir para a aprofundamento da discussão, se precipita ao cravar que a soja é amiga da floresta. “Seria interessante que o Ipea e o Ministério do Meio Ambiente sobrevoassem conosco alguns dos 65 maiores desmatamentos ilegais ocorridos 2003 no Mato Grosso, cuja lista é uma das bases utilizadas em nosso trabalho”, afirma o advogado André Lima, coordenador de Biodiversidade do ISA. O convite está feito.
Fonte: Amazônia.org.br – 24/01/2005
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