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Notícias

22
nov
2005
(GERAL)
Brasil pretende exportar US$ 800 milhões em móveis
Das raízes de árvores gigantescas, derrubadas para abrir caminho para pastos, ele fez mesas e bancadas; de canoas talhadas por índios pataxós, abandonadas por pescadores, ele fez bancos; dos gravetos recolhidos na devastada Mata Atlântica da Costa do Descobrimento, na Bahia, ele fez esculturas. É com esse trabalho ecologicamente correto e com um design brasileiríssimo que o engenheiro gaúcho Hugo França, de 49 anos, ajuda o Brasil a melhorar a imagem no mercado internacional, ávido por móveis de madeira.

No ano passado, o País exportou US$ 661,5 milhões em móveis. A previsão para este ano é chegar a US$ 800 milhões. Dormitório em madeira maciça são os móveis mais procurados por importadores, especialmente dos Estados Unidos, da França, Alemanha e do Reino Unido, principais mercados do País, mas há um nicho a ser explorado, de design, onde Hugo França é um dos expoentes.

A sua participação nesse fluxo é ínfima. Do total de 15 peças que produz por mês, apenas 5 seguem ao exterior, mas são essas vendas que ajudam o País a consolidar a imagem de produtor de móveis de design dentro de uma visão ecologicamente correta. Fruto do resgate de técnicas artesanais de produção que pareciam perdidas.

"Nosso papel é mostrar o Brasil que preserva as florestas e aproveita melhor a madeira". Para França, pode parecer um absurdo, mas das 4 mil espécies da Mata Atlântica, apenas 200 são usadas comercialmente e 30 são as mais usadas. "Há uma monocromia grande no uso da madeira e nosso tipo de design, eu diria escultural, quebra isso ao usar as árvores e raízes que foram devastadas e estavam sem uso".

O engenheiro que veio para São Paulo em 1979 para trabalhar na Cisco passou a dedicar à produção de móveis desde que comprou casa em Trancoso, no litoral Sul da Bahia, onde começou a produzir os próprios móveis, depois para amigos e depois para encomendas maiores do exterior. Hoje, ele mantém um ateliê na Bahia, onde está a madeira que recolhe, "como um garimpeiro das matas e fazendas da região", e outro em São Paulo onde as peças são finalizadas.

Feliz com a exposição de seus móveis no Museu da Casa Brasileira, na zona sul de São Paulo, realizada recentemente, França prepara o embarque de suas peças para exposição em Paris, em janeiro. No mês passado realizou uma exposição em Londres a designer Etel Carmona, mineira de Paraisópolis, que há 20 anos se dedica ao ofício de transformar madeira certificada, como a imbuia e a sucupira, em móveis cobiçados como os do Instituto Fernando Henrique Cardoso, do ex-presidente, cravado no centro da capital do Estado de São Paulo.

Etel, como a maioria dos mais famosos designers da madeira do País, começou por acaso no mercado. Mãe de três filhos, ela foi decorar uma casa de campo em Louveira, no interior, mas teve dificuldade de achar exatamente o que queria. Decidiu então comprar móveis antigos e recauchutá-los, se valendo de um galpão sem uso numa propriedade em Valinhos. Hoje, Etel conta com o apoio de 90 funcionários na produção de cerca de 1.500 peças por mês, além dos acessórios que compra com exclusividade de uma comunidade de Xapuri, no Estado do Acre.

Etel conta que, ao ampliar a produção dos móveis que pensava fazer apenas para casa, achou que precisaria de um mestre para ensinar o ofício a cinco órfãos de empregados da fazenda. Até hoje, Moacir Tozzo é seu sócio e fica com 10% do valor das vendas, com o compromisso de passar o ofício de mestre artesão da madeira aos novos. "Eu passei a desenhar com mais desenvoltura e a criar mais peças a partir do momento em que críticos de arte como Fúlvio Nani me garantiram que o que estava fazendo era realmente novo, com cara de Brasil".

No ateliê, onde está há 14 anos, na Rua Gabriel Monteiro da Silva, Etel também abriu as portas para o design de mobiliário de Claudia Moreira Salles e Isay Weinfeld, que, com ela, ajudam a fixar o nome do Brasil no exterior, onde têm representação em Nova York, Amsterdam, Londres, Lisboa e Zurich. E o qual o segredo do sucesso? Etel responde sem pestanejar: "Só uso madeira certificada e, como muitos móveis têm imbuia, comprei um trecho da Mata Atlântica para fins de reflorestamento. Ali, planto a imbuia que usamos, mantendo o ecossistema com outras espécies que também estudo o uso".

O fluminense de Macaé Maurício Azeredo, de 55 anos, há 30 anos se dedica a projetar móveis que levem em conta a policromia das madeiras. No seu ateliê na cidade goiana de Pirenópolis, ele desenvolve um mobiliário de forte conteúdo cultural, buscando levar para bancos e mesas o folclore brasileiro.

Assim como Etel e Hugo França, a trajetória de Azeredo começou do acaso. Arquiteto, ele foi dar aula na Universidade de Brasília, logo após a construção da capital, nos anos 60. No campus, acabou conhecendo o pessoal do então Instituto Brasileiro de Florestas (IBF), hoje Ibama. "Acabei tendo contato com outros tipos de madeira e comecei a projetar móveis, levando em conta a diversidade e só trabalhando com madeira certificada, que respeita o desenvolvimento sustentável". Desde então, a sua produção mensal gira em torno de 12 a 15 peças, que fazem sucesso no exterior, onde galerias de Los Angeles e Nova York expõem as suas peças e de onde surgem os compradores externos.

"É uma produção pequena, mas cria um conceito de Brasil lá fora, de que somos capazes mais do que de vender madeira em estado bruto como no passado recente, na forma de móveis, que respeitam e têm compromisso com a natureza". Azeredo está ciente de que designer como ele, Etel, Hugo França e Carlos Motta estão seguindo a trilha dos irmãos Fernando e Humberto Campana que, nos anos 70, abriram as portas do exterior para o mobiliário brasileiro. Hoje, num pequeno ateliê no bairro paulistano de Santa Cecília, eles aperfeiçoam as técnicas, mais do que da madeira do seu derivado, o papel ondulado, que transformam em cadeiras que podem ser vistas em museus como o MoMa em Nova York, mostrando que o Brasil sabe fazer móveis.

Fonte: Cruzeiro Net – 19/10/2004

Fonte:

ITTO Sindimadeira_rs