A indústria brasileira voltada para construção civil encontra-se em estágio atualizado tecnologicamente, tanto no que diz respeito a técnicas construtivas como infra-estrutura de equipamentos, consequência do período anterior a crise mundial de 2008, onde grande parte das empresas nacionais modernizou seu parque fabril. Mesmo com parques industriais em condições de fornecer produtos adequados as demandas habitacionais, ainda é muito tímida a disseminação do uso de sistemas pré-fabricados em madeira no Brasil, fato atualmente decorrente mais de questões culturais e políticas do que por limitações tecnológicas.
Em países europeus e norte americano a disseminação do uso de pré-fabricados em madeira deu-se logo após a Segunda Grande Guerra, sob uma forte demanda habitacional e a necessidade de se racionalizar o processo construtivo. Os primeiros elementos pré-fabricados nesse período foram os componentes da cobertura. Deveu-se aos irmãos Carl e William Jureit, fundadores da Automatized Building Components Inc. em 1954, as primeiras produções em larga escala de sistemas treliçados em madeira para cobertura.
Já o Brasil, país com alta demanda por habitações, com parque industrial em estado razoável de desenvolvimento, possuidor de uma das maiores áreas de florestas do mundo, ainda limita-se a poucas experiências no que diz respeito à pré-fabricação em madeira na construção civil.
Com aproximadamente 550.688.000ha de florestas, o Brasil (ficando atrás somente da Rússia), possui um enorme potencial madeireiro, com 98,77% correspondente a florestas nativas, e 1,23% a florestas plantadas. Segundo a ABRAF 85% das madeiras nativas produzidas no Brasil são provenientes da Mata Amazônica, e segundo o manual do IPT 64% dessas madeiras são utilizadas aqui no país. Entre os estados, o maior consumidor é São Paulo, que corresponde a 15% do consumo nacional, mas, infelizmente, estima-se que de 43% a 80% seja de extrações ilegais.
Aliviando a pressão sobre as florestas nativas, há uma crescente demanda pelas florestas plantadas, principalmente com o cultivo dos gêneros Eucalipto e Pinus. No entanto, grande parte de sua produção é destinada à indústria de papel e celulose, e siderurgia. A madeira destinada à construção civil corresponde a uma porcentagem diluída entre a destinada à indústria madeireira, painéis reconstituídos, e outros. Informações mais apuradas e específicas sobre a madeira destinada à construção civil são uma lacuna do conhecimento do uso deste material. Sabe-se apenas que este setor é o que menos consome madeira proveniente das florestas plantadas.
Apesar do grande potencial florestal do Brasil, o uso da madeira na construção civil ainda é pequeno, limitando-se ao subsistema cobertura dos edifícios, solucionadas principalmente por sistemas estruturais pontaletados, treliçados (popularmente conhecido como tesoura) e o tesoura-caibro (normalmente empregado no sistema construtivo Wood frame), ficando qualquer outro uso do material, na vedação e em estruturas, como experiências isoladas, incapazes de construírem um quadro representativo nacionalmente.
O sistema de cobertura assume no Brasil o papel de principal empregador de madeira, e seu uso vem sendo tradicionalmente aplicado desde o período da colonização. Em segundo lugar está o uso da madeira para andaimes e formas para construção em concreto, também denominado de “usos temporários”, seguido por forros, pisos e esquadrias. Por fim, a madeira usada para a pré-fabricação de casas seria o menor uso.
Mesmo representando a maior aplicação da madeira na construção civil, o sistema de cobertura sofreu poucas inovações com relação a sua produção. Muitos erros ainda são visíveis no desenvolvimento de projetos de cobertura e execução de carpintaria, pelas seguintes causas: desconhecimento sobre as características físicas e mecânicas das espécies de madeira de florestas plantadas, suas limitações de uso e restrições ao ataque de fungos e insetos; dimensionamentos que desconsideram as características das peças de madeira com relação à heterogeneidade e incertezas de sua origem, podendo gerar deformações consequentes do subdimensionamento; ligações inadequadas entre os elementos estruturais; e, concepção estrutural inadequada.
Além dessas questões, existem problemas frequentes nas coberturas, como: deformações, torções, fendilhamento decorrentes à sobrecarga ou uso inadequado da espécie; putrefação ou ataque de insetos nas peças; estruturas deformadas, consequentes da falha de dimensionamento das ligações estruturais; peças fletidas que causam goteiras, permitindo a proliferação de fungos putrefantes. Em especial, nas habitações populares, são frequentes também as seguintes patologias: telhas quebradiças quando úmidas e com alto percentual de empeno; uso de madeiras verdes, muito úmidas, que ao secarem se deformam; madeiras com seção inadequada para sua função, com rachaduras, empenos, desquinamento e nós soltos; deformação dos beirais, decorrentes da execução inadequada ou uso de peças com defeitos; deformação das ripas, consequente da umidade das telhas de baixa qualidade; terças descontínuas ou fletidas; e, perda de estabilidade e contraventamento das tesouras. Todos esses fenômenos são comprometedores das funções da cobertura, essencial para as mínimas condições de habitabilidade e salubridade nas habitações.
O Brasil é um grande consumidor de madeira no sistema construtivo das coberturas, e ao associar essa demanda aos processos de pré-fabricação em madeira pode-se obter, além de preços mais adequados, um produto final com maior qualidade, submetido a um rigor no controle de seu processo de produção. Muitos dos problemas apresentados sobre a cobertura poderiam ser solucionados com a pré-fabricação em sistema aberto de seus componentes.
Enquanto os sistemas tradicionais são mais caros, lentos e difíceis de se conceber e implantar, além do desperdício considerável de materiais, o sistema pré-fabricado permite, através da racionalização do processo construtivo, a economia de recursos, aumento do padrão de qualidade do produto e facilidade de coleta de resíduos para reciclagem.
A pré-fabricação de estruturas em madeira para cobertura é passível de sucesso em sua implantação no país, dado o fato que o Brasil culturalmente já é um grande consumidor do material na construção de coberturas. No entanto, através do levantamento das empresas que trabalham com construção em madeira, pode-se constatar que os atores do processo estão trabalhando em todo o país, com maior incidência nas regiões Sul e Sudeste, mas ainda de forma desarticulada.
Poucas empresas trabalham em regime de pré-fabricação, apesar da capacidade tecnológica e técnica das indústrias para se produzirem pré-fabricados. Percebe-se que ainda são tímidas essas manifestações no mercado e quando existem são, na maioria das vezes, pré-fabricações com demanda específica, voltadas principalmente para sistemas de cobertura ou esquadrias.
Dentre os sistemas de cobertura produzidos, com algum nível de industrialização no Brasil, estão os treliçados, pontaletados e tesoura-caibro, na maioria das vezes, pré-fabricados parcialmente. Isto significa que apenas alguns componentes ou partes de um subsistema é pré-fabricado, ou seja, são poucas experiências de pré-fabricação de toda a estrutura da cobertura, do piso ou da parede.
O objetivo deste trabalho é apresentar um levantamento preliminar da indústria de pré-fabricados no setor madeireiro no Brasil, identificando os diferentes componentes e sistemas construtivos mais produzidos por essas indústrias e seus diferentes graus de industrialização, com atenção especial no subsistema de cobertura.
SISTEMAS CONSTRUTIVOS
Para esclarecer as variáveis consideradas com relação à pré-fabricação, níveis de industrialização e sistemas construtivos utilizados pelas empresas no Brasil, fazem-se necessária algumas definições .
Quando se fala em construção com madeira pode-se elencar alguns sistemas construtivos, compreendidos como a técnica aplicada aos materiais para sua aplicação em obra, resultado de um projeto arquitetônico, definindo métodos construtivos diferenciados e diferentes edificações.
Dentre os sistemas construtivos da cobertura, estão aqueles com algum grau de industrialização. Apesar da diversidade nas classificações, que variam conforme a bibliografia, é de consenso que o sistema industrializado abrange, em seu processo, a pré-fabricação, podendo ser total ou parcial. Quando a pré-fabricação é total significa que a sua produção é completamente independente do canteiro de obras, o tempo de montagem é pequeno, realizado com ajuda de máquinas, como gruas, e necessita de planejamento de todas as etapas da obra. A pré-fabricação parcial são aquelas que tratam apenas da produção de componentes, partes de um subsistema, e pré-fabricação parcial de um todo, como, por exemplo, a pré-fabricação da cobertura.
Numa síntese sobre os graus de industrialização dos sistemas construtivos pode-se separá-los em três níveis: não industrializado (como sistemas construtivos vernaculares e habilitado); semi-industrializado (como sistemas pré-cortados); e industrializado (podendo este envolver pré-fabricação parcial ou total).
Empresas que trabalham com produtos como madeiras maciças serradas brutas ou roliças, sistema construtivo em pilar-viga roliço ou vernaculares, foram classificados como “não industrializado”. As que trabalham com sistemas construtivos pré-cortado, foram enquadrados no “semi-industrializado e apenas aquelas que utilizam sistemas de componentes pré-fabricados, painéis e sistemas volumétricos pré-fabricados foram consideradas com o grau “industrializado”.
Das empresas pesquisadas podem-se identificar os principais produtos com maior incidência de construções em grau semi-industrializado, utilizando, na maioria dos casos, o sistema pilar-viga com madeiras serradas; algumas poucas experiências em grau não-industrializados, como casas em madeira roliça; e com relação a sistemas construtivos industrializados os mais presentes são a pré-fabricação de componentes treliçados, as tesouras, para cobertura e vedações (paredes) em “macho-fêmea”, na maioria das vezes feita sob demanda específica; e menor incidência de empresas que trabalham com construções inteiramente pré-fabricadas.
Este levantamento preliminar das empresas envolvidas na construção em madeira permite uma primeira avaliação setorial da construção civil no Brasil, especificamente no setor madeireiro, demonstrando que o principal uso da madeira na construção civil ainda é no subsistema cobertura dos edifícios e os sistemas construtivos mais usados são respectivamente os pontaletados, treliçados e tesoura-caibro.
Das empresas pesquisadas, foram identificadas poucas que trabalham a pré-fabricação total em madeira, que dispõem de casas inteiramente pré-fabricadas em escala, compondo uma parcela irrisória de experiências isoladas.
A maioria das empresas que trabalham a pré-fabricação de sistemas construtivos e componentes em madeira para construção civil se dedica a produções com demandas específicas, feitas sob encomenda para o cliente. Na maioria das vezes esses pré-fabricados dizem respeito ao sistema de cobertura e, dentre os sistemas construtivos, o mais empregado, nesse caso, é o treliçado, pré-fabricado parcialmente em componentes. Ainda assim essas empresas compõem uma parcela muito pequena e pouco representativa na construção civil brasileira.
O sistema de cobertura convencional, que anteriormente eram as tesouras (treliças), atualmente é o pontaletado, implantado sem a presença de componentes pré-fabricados. O sistema treliçado também tem pouca presença da pré-fabricação no seu processo construtivo, mas dentre os sistemas de cobertura pré-fabricados no país, este é o mais comum, seguido do tesoura-caibro.
Apesar das empresas brasileiras apresentarem estágio razoável de atualização tecnológica, e o país possuir um dos maiores potenciais madeireiros do mundo, a indústria madeireira voltada para construção civil ainda está predominantemente em grau “semi-industrializado”, trabalhando com os sistemas mais convencionais de cobertura, o pontaletado e treliçado.
Constatou-se que dentre as poucas empresas que trabalham a pré-fabricação, o sistema mais empregado nesse processo é o da cobertura, feito sobre demanda específica, predominantemente em componentes pré-fabricados parcialmente;
E dentre os sistemas de cobertura pré-fabricados em madeira, o mais empregado são os treliçados;
O Brasil possui parque fabril em nível razoável de desenvolvimento tecnológico e detém um dos maiores potenciais madeireiros do mundo. No entanto, a madeira é pouco empregada na construção civil em processos de pré-fabricação.
Autores<br>Ivan M. R. do Valle, Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, UnB ; Akemi Ino, Professora do Instituto de Arquitetura e Urbanismo, USP, Rosana Rita Folz, Pesquisadora de Pós-Doutorado do Instituto de Arquitetura e Urbanismo, USP, e João Callil , Pesquisador do Grupo HABIS,